CTLF Corpus de textes linguistiques fondamentaux • IMPRIMER • RETOUR ÉCRAN
CTLF - Menu général - Textes

Argote, Jerónimo Contador de. Regras da lingua portugueza – T01

Regras
da lingua Portugueza
espelho
da lingua Latina,
ou
Disposiçaõ para facilitar o ensino da lingua
Latina pelas regras da Portugueza.

Primeyra parte.

Capitulo I.
Dos nomes, artigos, numeros, terminaçoens,
e casos.

Mestre. Em que terra nacestes?

D. Em Portugal.

M. Pois logo haveis de saber
a lingua Portugueza.

D. Sim Senhor.1

M. Dizeyme, e que cousa he lingua
Portugueza?

D. Lingua Portugueza saõ as palavras,
e modo de fallar, de que os Portuguezes
entre si usaõ na pratica,
ou conversaçaõ, ou quando escrevem.

M. E de que consta a pratica, ou conversaçaõ?

D. Consta de palavras, ou Oraçoens.

M. E que cousa he Oraçaõ?

D. Saõ as palavras, que hum homem diz
a alguem, ou lhe escreve.

M. Dizey exemplos.

D. Já estou saõ; Tenho sede; saõ Oraçoens.

M. E quantas castas de palavras tem a
lingua Portugueza, e as suas Oraçoens?

D. Oyto.

M. Quaes saõ?

D. Nome, Pronome, Verbo, Participio,
Adverbio, Preposiçaõ, Conjunçaõ,
e Interjeyçaõ.

M. E que cousa he Nome?

D. Nome he huma palavra, que significa
alguma cousa; tem numeros, e se
2declina por casos.

M. E que quer dizer significar algũa cousa?

D. Significar alguma cousa val o mesmo,
que representar, declarar, ou manifestar
alguma cousa.

M. Dizey exemplo.

D. Esta palavra Rosa significa a flor da
Rosa; porque ouvida esta palavra
Rosa, se me representa a flor da
Rosa.

M. Dissestes que o nome tinha numeros,
e que cousa he Numero?

D. Numero he a quantidade, assim como
hum, dous, tres.

M. E quantos numeros tem as palavras na
lingua Portugueza?

D. Dous.

M. Quaes saõ?

D. Numero Singular, e numero Plurar.

M. E quaes saõ as palavras do numero
Singular, e quaes as do Plurar?

D. As do Singular, saõ as que significaõ
huma só cousa, e as do Plurar as
que significaõ mais de huma só
cousa.

M. Dizey exemplo.

D. Rosa he palavra do singular; porque
3significa huma só Rosa. Rosas he
palavra do plurar; porque significa
mais de huma Rosa.

M. E como se conhece se o nome està no
singular, ou no plurar?

D. Conhece-se pelo artigo, como veremos
adiante, e conhece-se pela ultima
letra, em que o nome acaba.

M. De que sorte se conhece pela ultima
letra?

D. Se o nome acaba na letra S. està no
plurar, se em outra letra, està no
singular.

M. Dizey exemplo.

D. Rosa està no singular; porque naõ acaba
na letra S. Rosas està no plurar;
porque acaba na letra S.

M. E esta regra nunca falta?

D. Falta em alguns nomes, que no singular
acabaõ em S. assim como Deos;
mas saõ poucos os taes nomes.

M. Dissestes, menino, que o nome se declinava
por casos, & que cousa he
declinar o nome por casos?

D. He repetir o nome com o seu artigo,
e com as mudanças do artigo. Isto
he na lingua Portugueza, que na
4Latina naõ he assim.

M. E que cousa he artigo?

D. Artigo he huma palavrinha, ou particula,
que se poem antes do nome.

M. Dizey exemplos.

D. A virtude. A particula A posta antes
do nome Virtude he artigo. O amor
a particula O posta antes do nome
Amor he artigo.

M. E quantos artigos ha na lingua Portugueza?

D. Dous.

M. Quaes saõ?

D. Saõ O, & A.

M. E antes do nome sempre se poem artigo?

D. Sempre naõ.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro naõ està em casa, nesta Oraçaõ antes
do nome Pedro naõ està artigo.

M. E como se sabe, quando se hade antes
do nome pôr artigo, ou naõ o
pôr?

D. Sabe-se pelo uso.

M. E os artigos tem numeros, & declinaõ-se
por casos?

D. Sim.5

M. E que cousa he caso?

D. Caso he a postura, ou posiçaõ do
nome.

M. E que cousa he a postura do nome?

D. Isso aprende-se na Syntaxe.

M. E tendes entre tanto outro modo, porque
digais que cousa he caso?

D. Sim, mas naõ taõ proprio.

M. Dizey-o.

D. Caso he a mudança de letras, que faz
o artigo.

M. E o artigo muda de letras?

D. Sim, segundo os casos, como logo direy.

M. E quantos casos ha?

D. Seis em cada numero.

M. Quaes saõ?

D. Saõ estes, Nominativo, Genitivo,
Dativo, Accusativo, Vocativo,
Ablativo.

M. E os Artigos tem todos esses casos?

D. Tem todos, só naõ tem Vocativo.

M. Dizey como se declinaõ os artigos.

D. Declinaçaõ do artigo O.

Numero singular.

tableau nominativo o.6

tableau genitivo | do, ou de | dativo | ao, ou o, ou a | accusativo | ablativo | do, ou de.

Numero Plurar.

tableau nominativo | os | genitivo | dos, ou de | dativo | aos, ou os, ou a | accusativo | ablativo | dos, ou de.

Declinaçaõ do artigo A.

Numero Singular.

tableau nominativo | a. | genitivo | da, ou de | dativo | a | accusativo | ablativo

Numero Plurar.

tableau nominativo | as | genitivo | das, ou de7

tableau dativo | as | accusativo | ablativo | das, ou de.

M. E porque no mesmo caso de Genitivo
pondes duas mudanças do artigo,
dizendo do, ou de, e o mesmo fazeis
no Dativo, Accusativo, &c?

D. Porque humas vezes nos servimos do
artigo do, outras do artigo de para
o caso de Genitivo, e o mesmo fazemos
com o Dativo, &c.

M. Dizey exemplo.

D. O livro do Mestre. Nestas palavras o
Genitivo, Mestre, tem antes de si o
artigo, e Genitivo do. O livro de
Pedro
. Nestas palavras o Genitivo
Pedro tem antes de si o artigo, e
Genitivo de.

M. E como se sabe quando se ha de usar
do artigo do, ou do artigo de, ao,
ou o?

D. Sabe-se pelo uso.

M. E estes artigos em todos os casos saõ
puramente artigos?

D. No caso de Ablativo podemos dizer
que saõ proposiçoens, como direy
adiante.8

M. Tendes dito as declinaçoens dos artigos;
dizey agora quantas declinaçoens
tem os nomes?

D. Duas.

M. Quaes saõ?

D. A declinaçaõ dos nomes, que antes de
si tem no Nominativo o artigo O, e
as dos nomes, que no Nominativo
tem antes de si o artigo A.

M. E como se conhece quaes saõ os nomes,
que tem antes de si o artigo O,
e quaes os que tem o artigo A?

D. Conhece-se pelo uso.

M. Dizey as taes declinaçoens.

D. Declinaçaõ dos nomes que tem antes
de si o artigo O.

Numero Singular.

tableau nominativo | o louvor. | genitivo | do louvor. | dativo | ao louvor. | accusativo | vocativo | ò louvor. | ablativo9

Numero Plurar.

tableau nominativo | os louvores. | genitivo | dos louvores. | dativo | aos louvores. | accusativo | vocativo | ò louvores. | ablativo

Declinaçaõ dos nomes, que tem antes
de si o artigo A.

Numero Singular.

tableau nominativo | a rosa. | genitivo | da rosa. | dativo | accusativo | vocativo | ò rosa. | ablativo

Numero Plurar.

tableau nominativo | as rosas. | genitivo | das rosas. | dativo10

tableau accusativo | as rosas. | vocativo | ò rosas. | ablativo | das rosas.

M. Tendes dito a declinaçaõ dos nomes
substantivos, dizey agora a dos nomes
adjectivos, que tem duas terminaçoens.

D. Declinaçaõ dos nomes adjectivos
de duas terminaçoens.

Numero Singular.

tableau nominativo | o branco, e a branca. | genitivo | do branco, e da branca. | dativo | ao branco, e à branca. | accusativo | vocativo | ò branco, e ò branca. | ablativo

Numero Plurar.

tableau nominativo | os brancos, e as brancas. | genitivo | dos brancos, e das brancas. | dativo | aos brancos, e às brancas. | accusativo | vocativo | ò brancos, e ò brancas.11

tableau ablativo dos brancos, e das brancas.

M. E os nomes adjectivos, que tem só
huma terminaçaõ, como se declinaõ?

D. Se se lhe poem antes o artigo O, declinaõ-se
com o artigo O, se se lhe
poem o artigo A, declinaõ-se com
o artigo A.

M. Dizey exemplo.

D. Este adjectivo Verde, se se lhe poem
antes o artigo O, declina-se O verde,
do verde, &c. Se se lhe poem antes
o artigo A, declina-se A verde, da
verde
, &c.

M. E que he necessario na lingua Portugueza
para declinar hum nome?

D. Basta saberlhe o nominativo do Singular,
e o artigo que tem antes, e saber
o nominativo do Plurar.

M. E como se sabe o nominativo do Singular,
e o artigo que tem antes?

D. Sabe-se pelo uso, ou busca-se no Vocabulario.

M. E como se sabe o nominativo do Plurar?

D. Sabe-se pelo do Singular.

M. De que sorte?

D. Pela formaçaõ.12

M. E que cousa he formaçaõ?

D. He de huma palavra fazer outra palavra.

M. Dizey exemplo.

D. Da palavra Rosa fazer a palavra Rosas.

M. E quantas castas de formaçoens ha?

D. Tres.

M. Quaes saõ?

D. Formaçaõ por acrescentamento de letras,
por diminuiçaõ, e por mudança.

M. E qual he a formaçaõ por acrescentamento?

D. Formaçaõ por acrescentamento, he
quando se acrescenta a huma palavra
alguma letra, ou letras, e se faz
outra palavra.

M. Dizey exemplos.

D. Rosa acrescentandolhe a letra S, faz-se
a palavra Rosas. Rapaz acrescentandolhe
as letras inho faz-se a palavra
Rapazinho.

M. E qual he a formaçaõ por diminuiçaõ?

D. He quando tiro a alguma palavra huma
letra, e faço outra palavra.

M. Dizey exemplos.13

D. Laranjal tiro a esta palavra a letra L, e
faço a palavra Laranja; Grandemente,
tiro a esta palavra as letras mente,
e faço a palavra Grande.

M. E qual he a formaçaõ por mudança
de letras?

D. He quando mudo a alguma palavra
alguma, ou algumas letras, e faço
outra palavra.

M. Dizey exemplos.

D. Sol, mudo a esta palavra ol em es, e faço
a palavra Soes. Omenagem mudo
a esta palavra as letras em em ens, e
fica Omenagens.

M. E como se forma o Nominativo do
Plurar dos nomes pelo Nominativo
do Singular?

D. Forma-se, ou por acrescentamento,
ou por mudança de letras.

M. E como se conhece quando ha de formarse
por acrescentamento, e quando
por mudança?

D. Conhece-se pela terminaçaõ do Nominativo
do Singular.

M. Que cousa he terminaçaõ?

D. Terminaçaõ he a ultima letra, ou letras
de alguma palavra.14

M. E porque dizeis a ultima letra, ou letras?

D. porque as palavras ou acabaõ em letra
vogal, ou em dipthongo, ou em
letra consoante; se acabaõ em vogal,
a terminaçaõ he a ultima letra vogal,
assim como em Rosa a terminaçaõ
he A, se acabaõ em dipthongo, a
terminaçaõ he o dipthongo, assim
como em Pay a terminaçaõ he ay: se
acabaõ em letra consoante, a terminaçaõ
he a ultima letra vogal com
a consoante; assim como em Sol a
terminaçaõ he ol.

M. E quantas terminaçoens tem os nomes
da lingua Portugueza no Singular?

D. Os que acabaõ em vogal tem cinco
terminaçoens, a saber, a, e, i, o, u, assim
como Rosa, , Javali, , .
Os que acabaõ em dipthongo tem
cinco, a saber, ay, , ey, eu, oy, assim
como Pay, Paõ, Ley, Meu, Boy: as
que acabaõ na letra consoante L,
tem cinco, a saber, al, el, il, ol, ul, assim
como, Sal, Mel, Til, Sol, Sul. Os
que acabaõ na consoante M tem
cinco, a saber, am, em, im, om, um, assim
15como: Botam, Desdem, Coxim,
Dom, Commum. Os que acabaõ na
consoante S, naõ sendo nomes proprios,
saõ muyto poucos.

M. Pois naõ acabaõ em S, Contumás, Rapas,
Reves, Felis, Deos, e outros
muytos?

D. Naõ, porque esses nomes nos melhores
Authores se achaõ acabando em
Z. Contumaz, Rapaz, Revez, Feliz.
O nome Deos esse acaba em S. Os
nomes que acabaõ na consoante R,
tem tres terminaçoens, a saber, ar, er,
or, assim como Mar, Mulher, Amor.
Os acabados na consoante Z tem
cinco, a saber, az, ez, iz, oz, uz, assim
como Paz, Rez, Perdiz, Noz, Cruz.

M. E como por essas terminaçoens do
Nominativo do Singular se formaõ
os Nominativos do Plurar?

D. Desta sorte, se o nome no Singular
acaba na letra, vogal, acrescentase-lhe
a letra S, e fica formado o Nominativo
do Plurar: assim como Rosa
acrescẽtase-lhe a letra S, e fica Rosas,
que he Plurar, o que se vè bem nesta
taboa.16

tableau singular a e i o u. | plurar | as es is os us.

Se o nome no Singular acaba nos
dipthongos ay, ey, oy, acrescentase-lhe
a letra S, e fica formado o Plurar,
assim como Pay, acrescentase-lhe
a letra S, e fica Pays, que he o
seu Plurar; se acaba no dipthongo
aõ, ou se lhe acrescenta a letra S, ou
se muda o em oẽs, ou em aẽs, assim
como graõ, acrescentase-lhe hum S,
e fica grãos. Botaõ mudase-lhe a terminaçaõ
em oens, e fica Botoens.
Capellaõ mudase-lhe a terminaçaõ
em aẽs, e fica Capellaẽs.

M. E como se conhece qual dessas formaçoens
ha de ser?

D. Conhece-se pelo uso; tudo isto se vè
nesta taboa.

tableau singular ay aõ ey eu oy. | plurar | aes aõs oẽs aẽs eys eus ois.

Se o nome no Singular acabar em
al, ol, ul, muda-selhe o L em es,
assim como Pinhal, Pinhaes, Rol,
Roes, Azul, Azues. Se acaba em el,
mudase-lhe o L em is, assim como
Burel, Bureis. Se acaba em il, mudase-lhe
17o L em S, assim como Buril,
Buris. Se acaba em , forma-se da
mesma sorte, que se acabàra no dipthongo
em , e isso he o mais acertado.
Os nomes acabados em im
mudaõ o m em ns assim como Serafim,
Serafins. Os nomes acabados
em em mudaõ o m em ns; assim como
Homenagem, Homenagens. Os acabados
em om mudaõ o m em ns, assim,
como Som, Sons. Os acabados em
um mudaõ o m em ns assim como
Commum, Communs. Os acabados
em ar, er, or, acrescentase-lhe es, assim
como Mar, Mares, Mulher,
Mulheres, Amor, Amores. Os acabados
em az, ez, iz, oz, uz, acrescentase-lhe
es, assim como Paz, Pazes,
Rez, Rezes, Perdiz, Perdizes,
Noz, Nozes, Cruz, Cruzes. O que
se vè bem na seguinte taboa.

tableau singular al el il ol ul. | plurar | aes, eis, is, oes, ues. | singular am, em, im, om, um. | aõs, oẽs, aẽs, ens, ins, ons, uns. | singular ar, er, or. | ares eres, ores.18

tableau singular az, ez, iz, oz, uz. | plurar. | azes, ezes, izes, ozes, uzes.

M. E essas regras das formações, que
tendes dito, faltaõ algumas vezes?

D. Sim, assim como nome Mal, que naõ
muda o L no Plurar, mas forma-se
por acrescentamento, e se lhe acrescenta
es, e faz Males.

M. Pois como se ha de saber quando faltaõ
as taes regras?

D. Sabe-se pelo uso porque a lingua Portugueza
he muyto dilatada, e aqui
só dizemos o commum para o principiante
saber depois guiarse.

M. E porque naõ dissestes mais terminaçoens
dos nomes?

D. Porque na lingua Portugueza naõ me
lembro de mais terminaçoens, salvo
em nomes proprios, assim como
Tui, Madrid, e outros.

M. E na lingua Portugueza ha nomes,
que naõ tenhaõ numero Plurar?

D. Sim, assim como Cal, Tez.

M. E ha alguns, que naõ tenhaõ numero
Singular?

D. Sim, assim como Migas, Exequias.

M. E como se sabem esses nomes?19

D. Sabem-se pelo uso.

M. Tendes mais que dizer dos numeros,
e declinações dos nomes?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Capitulo II.
Das castas, e diversidades dos nomes.

Mestre. Quantas castas ha de nomes?

D. Muytas.

M. Dizey as principaes.

D. Ha nomes Proprios, Appellativos, e
Collectivos.

M. Quaes saõ os Proprios?

D. Nome Proprio he o que significa as
cousas proprias, e certas, assim como
Antonio, que significa tal homem
chamado Antonio.

M. E quaes saõ os Appellativos?

D. Saõ os que significaõ huma cousa,
mas incerta, ou esta, ou aquella, assim
como Homem, que significa hum
homem, mas incerto, este, ou aquelle.

M. Qual he o nome Collectivo?

D. Nome Collectivo he o que no singular
20significa muytas cousas por modo
de huma só, assim como Povo, que no
Singular significa muytos homens
juntos de modo, que fazem hum povo.

Tambem ha nomes Substantivos, e
nomes Adjectivos.

M. Quaes saõ os Substantivos?

D. Nome Substantivo he aquelle, que per
si só sem ajuda de outrem pode estar
na Oraçaõ.

M. Dizey exemplo.

D. Amor he Substantivo porque per si,
e sem ajuda de outrem pode estar
na Oraçaõ, como quando digo: O Amor
he suave
. O nome Amor està per
si, e sem necessitar de outro nome
para isso na Oraçaõ.

M. E quaes saõ os nomes Adjectivos?

D. Nome Adjectivo he aquelle, que naõ
pode estar na Oraçaõ sem outro
nome, ou clara, ou occultamente.

M. Dizey exemplo.

D. Pequeno he nome Adjectivo, porque
naõ pode estar na Oraçaõ sem outro
nome ou claro, ou occulto, o qual
21signifique a cousa, que he pequena,
como quando digo: Meu filho he pequeno,
o Adjectivo pequeno naõ póde
estar na Oraçaõ sem o nome filho;
porque se he pequeno, alguma cousa
he a que he pequena, e assim o
Adjectivo tem claro o Substantivo,
de quem depende, e necessita.

M. E quando he que tem occulto o nome,
de quem necessita para estar na Oraçaõ?

D. Quando na Oraçaõ só vem o Adjectivo,
e o seu nome Substantivo, de que necessita,
naõ vem, mas entende-se, assim
como quãdo digo: O meu pequeno
jà sabe ler
. Nesta Oraçaõ vem o Adjectivo
Pequeno sem o seu Substantivo
Filho, de quem depende, e necessita,
mas entende-selhe, e faz este sentido:
O meu filho pequeno jà sabe ler.

M. E ha outra regra mais facil para conhecer
quaes saõ os nomes Substantivos,
e Adjectivos?

D. Sim.

M. Dizeya.

D. Os nomes, a que se naõ póde accommodar
esta palavra cousa, saõSubstantivos,
22e os nomes a que se póde
accommodar, saõ Adjectivos.

M. Dizey exemplos.

D. Amor he nome Substantivo, porque naõ
se lhe póde accommodar a palavra
Cousa, porque naõ se diz Cousa Amor.
Este nome Amorozo he Adjectivo,
porque se lhe accommoda a palavra
Cousa, e se diz Cousa amorosa.

M. E essa regra falta algumas vezes?

D. Sim, principalmente nos nomes acabados
em Or, os quaes, posto que
Substãtivos, às vezes admittem a palavra
Cousa, mas advirta-se que entaõ
fica feyto Adjectivo, assim como
Vencedor, que he Substantivo, e admitte
a palavra Cousa, porque dizemos
Cousa vencedora.

M. E quantas terminaçoens tem os Adjectivos
a respeyto dos Substãtivos?

D. Huns tem huma, outros tem duas.

M. E quaes saõ os que tem duas?

D. Os que acabaõ em O, ou em M,
ou U.

M. Dizey exemplo.

D. Branco tem duas terminaçoens, huma
em O Branco, outra em A Branca.
23Bom tem duas terminações, hũa em
M. Bom, outra em A Boa.

M. E para que servem essas duas terminações?

D. Servem hũa para os Substantivos masculinos,
e outra para os femininos.

M. Dizey exemplo.

D. Panno Branco. A terminaçaõ em O, e
adjectivo Branco serve, e se accommoda
com o nome Panno, que he
masculino. Capa Branca. A terminaçaõ
em A, e Adjectivo Branca serve
ao nome Capa, que he feminino.

M. E quaes saõ os Adjectivos, que tem
huma só terminaçaõ?

D. Os que acabaõ em E, L, Z, e outros.

M. Dizey exemplos.

D. Amante, Leal, Contumaz.

M. E porque tem estes Adjectivos huma
só terminaçaõ?

D. Porque a mesma terminaçaõ serve para
os Substantivos masculinos, e
femininos.

M. Dizey exemplo.

D. Mulher amante, Homem amante, o Adjectivo
Amante serve ao nome Mulher,
que he feminino, e ao nome Homem,
24que he masculino.

M. E ha algum nome Adjectivo acabado
em A, que sirva para os Substantivos
masculinos, e femininos?

D. Sim.

M. Qual he?

D. O nome Cada, porque dizemos Cada
irmaõ
, e dizemos Cada irmãa.

M. E quaes saõ os nomes masculinos, e
quaes os femininos?

D. Masculinos saõ os que antes do Nominativo
tem o artigo O, assim como
O Homem; Femininos os que antes
do Nominativo tem o artigo A,
assim como A Mulher.

M. E o Adjectivo pòde às vezes servir de
Substantivo?

D. Sim.

M. Quando?

D. Quando se poem em lugar do Substantivo.

M. Dizey exemplo.

D. O azul logo desbota. Nesta Oraçaõ o
adjectivo Azul serve de Substantivo,
porque se poem em lugar do Substantivo
Cor, e faz este sentido. A
cor azul logo desbota
.25

M. Continuay as castas dos nomes?

D. Ha nomes Relativos, e Infinitos.

M. Quaes saõ os Relativos?

D. Relativo he o que traz à memoria o
nome antecedente.

M. Porque se chama Relativo?

D. Porque diz ordem ao seu antecedente.

M. E que cousa he nome antecedente?

D. He o nome, que vem na Oraçaõ antes
do outro nome.

M. Dizey exemplo.

D. Estimo aquelle Religiozo, o qual he mortificado.
Nesta Oraçaõ o nome Religiozo
he antecedente do Relativo
Qual, porque està posto antes do tal
Relativo.

M. E que cousa he trazer à memoria o nome
antecedente?

D. He tornallo a lembrar, e tornar a fazer
mençaõ delle.

M. Dizey exemplo.

D. Estimo aquelle Religiozo, o qual he mortificado.
Nesta Oraçaõ o Relativo
Qual torna a trazer à memoria o
nome Religiozo, porque faz este sentido.
Estimo aquelle Religiozo, o qual
Religiozo he mortificado
.26

M. E o nome Adjectivo pode servir de antecedente
ao nome Relativo?

D. As vezes sim.

M. Dizey exemplo.

D. Qual he o pay, tal he o filho. Nesta Oraçaõ
o adjectivo Qual serve de antecedente
ao Relativo Tal.

M. E quaes saõ os nomes Infinitos?

D. Nome Infinito he o que diz ordem a
alguma pessoa, porèm naõ a declara,
e se pòde accommodar a qualquer
pessoa, assim como Quem.

M. Continuay as castas de nomes?

D. Ha nomes Patrios, e nomes Nacionaes.

M. Quaes saõ? Emendou-se em vários lugares, mas não noutros; decidir e uniformizar critério]

D. Patrios saõ os que declaraõ a Patria,
assim como Lisbonense, Romano.
Nacionaes saõ os que declaraõ as naçoens,
assim como Italiano, Portuguez.

M. Continuy as castas de nomes.

D. Ha nomes Partitivos, e Numeraes.

M. Quaes saõ os Partitivos?

D. Partitivos saõ os que significaõ hum
de muytos, ou muytos, e cada hum
persi.27

M. Dizey Exemplos.

D. Algum significa hum de muytos. Todo
significa muytos, e cada hum persi.

M. Porque?

D. Porque quando digo Algum homem falla,
o nome Algum mostra que falla
hum homem, e que ha mais homens.
Quando digo Todo o homem
falla
, o nome Todo mostra que todos
os homens fallaõ, e que cada
hum falla.

M. E porque se chamaõ esses nomes nomes
Partitivos?

D. Porque significaõ por modo de quem
aparta, ou sepàra.

M. Dizey exemplos.

D. Quando digo Algum homem falla, parece
que aparto o tal homem dos
demais. E quando digo Todo o homem
falla
, parece que aparto o todo,
que he homem, do todo; que o naõ
he, nem falla, assim como da Pedra,
do Leaõ, &c.

M. E ha nomes, que naõ sendo Partitivos,
tenhaõ as vezes força de Partitivos?

D. Sim.28

M. Quaes saõ?

D. Saõ alguns Adjectivos, quando vem na
Oraçaõ de sorte, que parece apartaõ
humas cousas das outras.

M. Dizey exemplo.

D. As Lans negras naõ tomaõ outra cor. Nesta
Oraçaõ o Adjectivo Negras tem
força de Partitivo, porque parece
aparta humas lans de outras lans; as
negras das que o naõ saõ.

M. E quaes saõ os nomes Numeraes?

D. Saõ os que significaõ algum numero,
assim como Hum, Dous, Tres.

M. E quantas castas ha de nomes Numeraes?

D. As principaes saõ duas, Numeraes Cardinaes,
Numeraes Ordinaes.

M. Quaes saõ?

D. Numeraes Cardinaes saõ os que significaõ
absolutamente algum numero,
assim como Hum, Dous, Tres,
&c. Numeraes Ordinaes Saõ os
que significaõ algum numero, mas
com ordem, assim como Primeyro,
Segundo, Terceyro, &c.

M. Continuay as
castas de nomes.

D. Ha nomes Positivos, Comparativos,
29Superlativos.

M. Quaes saõ os Positivos?

D. Positivos saõ aquelles, que significaõ
a cousa absoluta, e simplesmente.

M. E que cousa he significar absoluta, e
simplesmente?

D. He significar a cousa meramente, sem
mayoria, nem excesso.

M. Dizey exemplo.

D. Alvo significa simplesmente; porque
significa que huma cousa he alva
sem dizer em que he mais alva que outra,
e sem dizer se he muyto mais
alva. Mais alvo naõ significa simplesmente,
porque significa que huma
cousa tem a alvura mayor. Alvissimo
naõ significa simplesmente;
porque naõ só significa que huma cousa
he alva, e tem alvura, mas que he
muyto alva, e tem alvura grande.

M. E quaes saõ os Comparativos?

D. Comparativos saõ os que servem para
comparar as cousas entresi, e acrescentaõ
a significaçaõ do seu Positivo,
assim como Mayor, Melhor.

M. Explicay isso.30

D. A Cidade de Lisboa he mayor que a do
Porto
. Nesta Oraçaõ o nome Mayor
serve de comparar a grandeza da Cidade
de Lisboa com a grandeza da
do Porto, e acrescenta a significaçaõ
do seu Positivo que he o nome Grande.

M. E na lingua Portugueza todos os nomes
Adjectivos Positivos tem Comparativo?

D. Só muyto poucos Positivos he que
tem Comparativo.

M. E quaes saõ?

D. Saõ estes. Bom faz no Comparativo
Melhor. Mào faz no Comparativo
Peor, Grande faz no Comparativo
Mayor, Pequeno faz Menor. Alèm
destes ha tambem o Comparativo
Superior, que tem por Positivo a
Preposiçaõ Sobre, Inferior, Anterior,
Posterior, Interior, e Exterior, que tambem
nascem de algumas Preposiçoens.

M. Pois se ha taõ poucos nomes Comparativos,
que se faz para comparar as
cousas?

D. Suppre-se a falta do Comparativo com
31a palavra Mais, e o Positivo.

M. E que cousa he supprir a falta de alguma
palavra?

D. He pôr alguma palavra, ou palavras,
que significaõ alguma cousa em lugar
de outra palavra, que significa
a mesma cousa.

M. Dizey exemplo.

D. Quero dizer Meu sogro he velho. Naõ
me lembra a palavra Sogro, suppro a
falta da tal palavra com outras, que
significaõ o mesmo, e digo. O Pay
de minha mulher he velho
, e fica supprida
a palavra Sogro, porque as palavras
Pay de minha mulher significaõ
o mesmo, que a palavra Sogro.

M. Dizey agora exemplo de como se suppre
o Comparativo com a palavra
Mais, e o Positivo.

D. Quero comparar a alvura da neve com
a do papel, e digo: A neve he mais
alva, que o papel
. Nesta Oraçaõ as
palavras Mais alva supprem a falta
do Comparativo do Positivo Alvo.

M. E ha Adjectivos, que naõ admittem
Comparativo, nem ainda supprido?32

D. Sim.

M. Quaes saõ?

D. Celeste, Nacido, Morto, Comprado,
Desterrado, e outros, porque naõ se
diz mais morto, mais nacido; &c.

M. E como se sabe quaes saõ esses adjectivos?

D. Sabe-se pelo uso.

M. Quaes saõ os nomes superlativos?

D. Superlativos saõ os nomes adjectivos
que significaõ a cousa com excesso,
assim como Alvissimo que significa
muyto alvo.

M. E donde nascem, e se formaõ os nomes
Superlativos?

D. Dos seus Positivos, assim como Alvissimo
nasce, e se forma do Positivo
Alvo.

M. E como se formaõ?

D. Formaõ-se segundo a terminaçaõ do
Positivo.

M. De que sorte?

D. Se o Positivo acaba em O, ou em E,
muda-selhe o O, ou E, em issimo, assim
como Bello, Bellissimo, ou Bellissima,
Amante, Amantissimo, ou Amantissima,
se acaba em L, acrescentaselhe
33ou issimo, ou issima, assim como,
Fertil, Fertilissimo, ou Fertilissima.
Se acabar em M, muda-selhe
o M, em nissimo, ou nissima, assim como
Bom, Bonissimo, ou Bonissima,
Commum, Commumnissimo, ou Commumnissima.
Se acaba em Z, mudaselhe
o Z, em cissimo, ou cissima, assim
como Capaz, Capacissimo, ou
Capacissima.

M. E porque dizeis issimo, ou issima?

D. Porque os Superlativos tem duas terminaçoens,
huma que serve para os
Substantivos masculinos, outra para
os femininos.

M. Dizey exemplos.

D. Homem alvissimo, Mulher alvissima.

M. E essas regras que destes para formar
os Superlativos faltaõ algumas vezes?

D. Sim faltaõ em alguns.

M. Dizeios.

D. Pessimo que he Superlativo do adjectivo
Mao. Novilissimo, que he Superlativo
do adjectivo Nobre, Fidellissimo,
de Fiel, Sacratissimo de Sagrado,
Frigidissimo, de Frio, Amicissimo,
34de Amigo e outros.

M. E ha alguns Adjectivos, que naõ formaõ
Superlativo?

D. Sim.

M. Dizey-os.

D. Leal, Enfermo, Ferido, e outros muytos,
que se sabem com o uso.

M. E quando queremos significar esses
Adjectivos com excesso, que se
faz?

D. Suppre-se a falta do Superlativo com
o Positivo, e a palavra Muito.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro està muyto enfermo. Nesta Oraçaõ
o Positivo Enfermo, e a palavra Muyto
supre a falta do Superlativo.

M. E pode-se usar isso tambem com os
Positivos que formaõ Superlativo?

D. Sim.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro he muyto alvo, ou Pedro he alvissimo.

M. E ha alguns Adjectivos, que de nenhum
modo admittaõ Superlativo?

D. Sim.

M. Dizeyos.

D. Celeste, Nascido, Morto, e Desterrado, e
35outros muytos, que se aprendem
com o uso; porque naõ dizemos
Muyto nacido &c.

M. Tendes mais que dizer dos nomes?

D. Mais ha que dizer mas isto basta.

Capitulo III.
Dos Pronomes.

Mestre. Qual he a segunda casta de
palavras de que consta a Oraçaõ?

D. Pronomes.

M. Que cousa he Pronome?

D. He huma palavra, que se poem em
lugar de Nome.

M. Dizey exemplo.

D. Elle he Pronome porque se poem em
lugar de Antonio, Pedro &c. e assim
quando quero dizer Antonio joga
digo Elle joga, e o Pronome Elle faz
as vezes do nome Antonio.

M. E quantas castas ha de Pronomes?

D. Muytas.

M. Dizey-as

D. Ha Pronomes Primitivos, ou Pessoaes.36

M. Quaes saõ.

D. Eu, Tu, Elle, ou Ella.

M. Porque dizeis Elle, ou Ella.

D. Porque o Pronome Elle tem duas terminações,
huma para servir aos nomes
Masculinos, outra aos Femininos.

M. E esses Pronomes declinaõ-se?

D. Sim.

M. Dizey as declinaçoens desses Pronomes.

D. Declinaçaõ do Pronome Eu.

Numero Singular.

tableau nominativo | eu. | genitivo | de mim. | dativo | me, ou a mim. | accusativo | ablativo

Numero Plurar.

tableau nominativo | nòs. | genitivo | de nòs. | dativo | a nòs. | accusativo37

tableau ablativo | de nòs.

M. Dizey exemplos desses casos.

D. Eu amo, o Pronome Eu està em Nominativo
do Singular. Coytado de mim,
o Pronome Mim està em Genitivo.
Deume dinheyro o Pronome me està
em Dativo. A mim o deve o Pronome
me està em Accusativo. Demim o
sabe
o Pronome mim està em Ablativo.

M. E porque razaõ està o Pronome nos
casos, que dissestes?

D. Isso aprende-se na Syntaxe.

M. E no Ablativo ha às vezes alguma differença?

D. Sim.

M. Quando?

D. Quando vem com a proposiçaõ Com,
porque entaõ no Singular disse Comigo,
e no Plurar Com nosco.

M. Dizey exemplos.

D. Pedro foy comigo, Pedro foy com nosco.

M. Dizey a declinaçaõ do Pronome Tu.

D. Declinaçaõ do Pronome Tu.38

Numero Singular.

tableau nominativo | tu. | genitivo | de ti. | dativo | te ou a ti. | accusativo | vocativo | ablativo

Numero Plurar.

tableau nominativo | vòs. | genitivo | de vós. | dativo | a vós. | accusativo | vocativo | ablativo | de vòs.

M. Dizey exemplos desses casos.

D. Tu amas o Pronome Tu està em Nominativo.
Coytado de ti o Pronome
Ti està em Genitivo, &c.

M. E no Ablativo ha differença quando
vem com a proposiçaõ Com.

D. Sim; porque se diz Comtigo no Singular,
e Com vosco no Plurar.

M. Dizey exemplos.39

D. Esta comtigo; Està Com vosco.

M. Dizey a declinaçaõ do Pronome Elle,
ou Ella.

D. Declinaçaõ do Pronome Elle, ou
Ella.

Numero Singular.

tableau nominativo | elle, ou ella. | genitivo | delle, ou della. | dativo | lhe, ou a elle, ou a ella. | accuzativo | a elle, ou a ella. | ablativo

Numero Plurar.

tableau nominativo | elles, ou ellas. | genitivo | delles, ou dellas. | dativo | lhes, ou a elles, ou a ellas. | accuzativo | a elles, ou a ellas. | ablativo

M. Dizey exemplos desses casos.

D. Elle ama. Elle està em Nominativo.
Coytado delle o Pronome delle està
em: Genitivo. Deulhe dinheyro o
Pronome lhe está em Dativo. A elle
40espero
. O Pronome A elle està em
Accusativo, Delle o sabe o Pronome
delle està em Ablativo.

M. E ha mais algum Pronome Pessoal
Primitivo?

D. Naõ; mas o Pronome Elle, ou Ella
quando he Reciproco tem diversa declinaçaõ
da que fica dita.

M. E que cousa he Reciproco.

D. Reciproco he aquella palavra que depois
da acçaõ, ou obra sahir da
pessoa, a faz entrar, ou tornar para a
mesma pessoa.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro rio-se, a particula, ou palavrinha
se he Reciproco; porque tendo a acçaõ
de ferir sahido de Pedro, que
foy o feridor, o Pronome Se a faz
tornar para o mesmo Pedro, e mostra,
que elle foy o ferido.

M. Dizey a declinaçaõ do Pronome Elle,
sendo Reciproco.

D. Declinaçaõ do Pronome Elle, ou
Ella quando passa a ser Reciproco.

Numero Singular, e Plurar.41

tableau genitivo | de si. | dativo | se, ou a si. | accusativo | ablativo

M. E porque naõ differençais o numero
Singular do Plurar?

D. Porque este Reciproco da mesma sorte
se declina no Singular, e Plurar.

M. E porque naõ dissestes o Nominativo?

D. Porque carece de Nominativo.

M. Dizey exemplos de mais casos.

D. He Senhor de si: O Reciproco Si està
em Genitivo A si o deve està em
Dativo. Accusou-se està em Accuzativo.
Falla de si, està em Ablativo.

M. E no Ablativo com a preposiçaõ Com
padece alguma mudança?

D. Sim, porque entaõ disse Comsigo.

M. Dizey exemplos.

D. Falla comsigo. Fallaõ comsigo.

M. E porque se chamaõ a estes nomes
Pessoaes?

D. Porque mostraõ as pessoas.

M. Dizey exemplo.

D. Eu mostra a primeyra pessoa do Singular.42

M. E porque se chamaõ Primitivos?

D. Porque delles nascem outros Pronomes
que se chamaõ Derivados, e
Possessivos.

M. Quaes saõ esses Pronomes?

D. Saõ estes Meu, ou Minha, que nasce
do Pronome Eu, Teu, ou Tua, que nasce
de Tu. Seu, ou Sua, que nasce
do Pronome, e Reciporco Si, Nosso,
ou Nossa, que nasce do Pronome
Nòs, Vosso, ou Vossa, que nasce do
Pronome Vòs.

M. E porque se chamaõ Possessivos esses
Pronomes?

D. Porque significaõ a posse, e ser senhor
de alguma cousa; e assim como
quando digo Isto he meu, Isto he teu.

M. E como se declinaõ esses Pronomes?

D. Declinaõ se como qualquer outro adjectivo
só tem de particular, que Teu,
ou Tua, Seu, ou Sua naõ tem Vocativo.

M. E ha mais castas de Pronomes?

D. Ha Pronomes, que saõ Demonstrativos,
e Relativos, e ha Pronomes,
que só saõ Relativos.

M. Quaes saõ os que saõ Demonstrativos,
43e Relativos?

D. Saõ os seguintes Este, ou Esta, Aquelle,
ou Aquella, Esse, ou Essa, Isto,
Isso, Aquillo.

M. E porque se chamaõ Demonstrativos
esses Pronomes?

D. Porque significaõ de sorte, que parece
estaõ mostrando a cousa que significaõ,
assim como quãdo digo Este homem
o Pronome Este parece està mostrando
ao Homem.

M. E esses pronomes sempre saõ Demonstrativos?

D. Sim.

M. E porque se chamaõ esses Pronomes
Relativos?

D. Porque trazem à memoria o seu antecedente.

M. Dizey exemplo.

D. Vi vosso filho este me pareceo esperto. Nesta
Oraçaõ o Pronome Este he Relativo,
porque traz à memoria o seu antecedente
Filho, e faz este sentido, Vi
vosso filho, este filho me pareceo esperto
.

M. E esses Pronomes saõ sempre Relativos?

D. Naõ.44

M. Quando he, que naõ saõ Relativos?

D. Quando naõ tem antecedente proprio
com quem concordem.

M. Dizey exemplo.

D. Esta caza he grande. Nesta Oraçaõ o
Pronome Esta naõ he Relativo, porque
naõ tem antecedente.

M. Como se declinão esses Pronomes?

D. Os Pronomes Este, ou esta Esse, ou
Essa, Aquelle, ou Aquella declinaõ-se
da mesma sorte, que o Pronome
Elle, ou Ella.
O Pronome Isto, Isso, Aquillo
tem declinaçaõ particular.

M. Dizey a declinaçaõ do Pronome Isto?

D. Declinaçaõ do Pronome Isto.

Numero Singular.

tableau nominativo | isto. | genitivo | disto. | dativo | a isto. | accusativo | ablativo

M. E porque naõ dizeis o Numero Plurar?45

D. Porque o naõ tem.

M. E como se declinaõ os Pronomes Isso,
e Aquillo.

D. Da mesma sorte, que o Pronome Isto.

M. E quaes saõ os Pronomes, que saõ
Relativos, e naõ saõ Demonstrativos?

D. Saõ os seguintes Mesmo, ou Mesma O,
ou A, Qual, ou Que.

M. E como se declina o Pronome Mesmo,
ou Mesma?

D. Declina se como qualquer outro Ad[jectivo].

M. Tem algua particularidade esse Pronome?

D. Tem de particular, que se ajunta a todos
os Pronomes, Primitivos, Possessivos,
e Demonstrativos.

M. Dizey exemplos.

D. Eu mesmo o vi, Tu mesmo o viste, Elles
mesmos o viraõ, Falla de si mesmo. Os
meus mesmos me perseguem
.

M. E como se declina o Pronome O, ou A.

D. Esse Pronome naõ se declina, porque
naõ tem mais caso, que o Accuzativo,
em ambos os numeros.

M. Dizey exemplo.46

D. Pedro vem, e eu o chamey. O Pronome
O, està em Accuzativo, Comi
peras
; e as colhi.

M. Não dissestes no Capitulo primeyro,
que O, e A, eraõ artigos, como
agora dizeys que saõ Relativos?

D. Humas vezes saõ artigos, outras Relativos.

M. E quando he que saõ Relativos?

D. Quando trazem à memoria o seu antecedente.

M. Dizey exemplo.

D. Comi peras, e as colhi. Nesta Oraçaõ a
palavra as traz a memoria o antecedente
Peras, e faz este sentido. Colhi
peras, e as peras comi
.

M. Dizey a declinaçaõ do Pronome Relativo
Qual, ou Que?

D. Declinaçaõ do Pronome Relativo
Qual, ou Que.

Numero Singular.

tableau nominativo | o qual, ou a qual, ou que. | genitivo | do qual, ou da qual, ou que. | dativo | ao qual, ou à qual, ou que.47

tableau accuzativo | ao qual, ou à qual, ou que. | ablativo | do qual, ou da qual, ou que.

Numero Plurar.

tableau nominat. | os quaes, ou as quaes, ou que. | genitivo | dos quaes, ou das quaes, ou que. | dativo | aos quaes, ou as quaes, ou que. | ablativo | dos quaes, das quaes, ou que.

M. Dizey exemplos.

D. Amey a Deos, o qual me premiou, ou
amey a Deos, que me premiou
. O Relativo
Qual, ou Que està em Nominativo.
O campo, do qual sou Senhor,
ou O campo, de que sou Senhor. O Relativo
do qual, ou do que està em Genitivo.
O argumento, ao qual respondestes,
ou a que respondestes. O Relativo
ao qual, e que està em Dativo.
O criado ao qual mandey, ou a que mandey.
O Relativo ao qual, ou que està
em Accuzativo. A pessoa, da qual o
o sey, ou de que o sey
o Relativo da
qual
, ou de que está em Ablativo.

M. E esta palavra Que sempre he Relativo?

D. Naõ muytas vezes he conjunçaõ.48

M. Quando?

D. Quando naõ traz à memoria nenhum
nome antecedente.

M. Dizey exemplo.

D. Naõ quero, que meu filho brinque. Nesta
Oraçaõ a palavra Que naõ he Relativo,
porque, naõ traz à memoria
antecedente algum.

M. Esta palavra Quem significa as vezes
o mesmo que o Relativo Que?

D. Sim.

M. Dizey exemplo.

D. Aqui esta Pedro a quem eu ensiney.

M. Tendes mais, que dizer dos Pronomes?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Capitulo IV.
Dos Verbos, e das suas pessoas, modos,
e tempos.

Mestre. Qual he a terceyra casta de
palavras, de que usa a Oraçaõ na
lingua Portugueza?

D. Os Verbos.49

M. Que cousa he Verbo?

D. Verbo he huma palavra significativa,
que tem pessoas, numeros, modos,
tempos, e naõ se declina por casos.

M. Dizeis que os Verbos tem pessoas, e
que couza he pessoa?

D. Pessoa he a palavra do Verbo, que tem
antes de si algum Pronome pessoal.

M. Dizey exemplo.

D. Amo he pessoa, porque tem antes de
si o Pronome pessoal Eu. Eu amo.

M. E quantas pessoas tem o Verbo?

D. Tres no Singular, e tres no Plurar.

M. Quaes saõ as do Singular?

D. Saõ as que tem antes de si aos Pronomes
pessoaes, Eu, Tu, Elle.

M. Dizey exemplo.

D. Amo, Amas, Ama, saõ pessoas do Singular,
porque tem antes de si os
Pronomes pessoaes. Eu amo, Tu amas,
Elle ama, ou pode ter os taes Pronomes.

M. E quaes saõ as do Plurar?

D. Saõ as que tem antes de si os Pronomes
Nós, Vós, Elles.

M. Dizey exemplos.

D. Amamos, amais, amaõ. Saõ pessoas
50do Plurar porque tem antes de si os
Pronomes pessoaes Nós, Vós, Elles.
Nós amamos, Vós amais, Elles amaõ.

M. E estes Pronomes sempre se poem antes
dessas pessoas?

D. Naõ, mas ou se poem, ou se entendem.

M. Dizey exemplo.

D. Amo a Pedro. Nesta Oraçaõ a pessoa
Amo, naõ tem antes de si Pronome,
mas entendese:lhe porque Amo val
o mesmo que Eu amo.

M. E entre essas pessoas ha primeyra, segunda,
e terceyra?

D. Sim.

M. Qual he a primeyra pessoa?

D. He a que falla, e tem antes de si o Pronome
Eu, ou Nos.

M. Dizey exemplo.

D. Amo Amamos saõ as primeyras pessoas,
porque saõ as que fallaõ, e tem antes
de si o Pronome Eu, ou Nòs Eu
amo
, Nòs amamos.

M. Qual he a segunda?

D. He a pessoa a quem se falla, e tem antes
de si o Pronome Tu, ou Vós.

M. Dizey exemplo.51

D. Amas, Amais. Saõ segunda pessoa,
porque saõ a pessoa a quem se falla, e
tem antes de si o Pronome Tu, ou
Vòs, Tu amas, Vòs amais.

M. Qual he terceyra.

D. he a pessoa de que se falla, e tem antes
de si o Pronome Elle, ou Elles.

M. Dizey exemplo.

D. Ama, Amaõ, saõ terceyra pessoa, porque
he de quem se falla, e tem antes
o Pronome Elle, ou Elles, Elle
ama
, Elles amaõ.

M. Dissestes que o Verbo tinha numeros
que numeros tem?

D. Singular, e Plurar.

M. Qual he o Singular?

D. Saõ as palavras, ou pessoas, que tem
antes de si os Pronomes, Eu, Tu,
Elle, Eu amo, Tu amas, Elle ama.

M. Qual he o Plurar?

D. Saõ as palavras, ou pessoas, que tem
antes de si os Pronomes, Nós, Vós,
Elles.

M. Dizey exemplo.

D. Amamos, Amais, Amaõ, saõ Plurar,
porque tem antes de si os Pronomes,
Nós, Vós, Elles, Nòs amamos, Vòs
52amais
, Elles amaõ.

M. Dissestes, que os Verbos tinhaõ modos,
e que cousa he Modo?

D. Modo he maneyra de significar do
Verbo.

M. E quantas maneyras de significar tem
os Verbos?

D. As que basta explicar, e declarar, saõ
quatro.

M. Quaes saõ?

D. A maneyra de Significar affirmando,
e mostrando.

M. Dizey exemplo.

D. Amo, Amaràs, Amey, &c. que significaõ
affirmando, e mostrando, que
amo, ou que amey.

M. E como se chama a essa maneyra de
significar?

D. Modo Indicativo.

M. E porque se chama Indicativo.

D. Porque Indicativo, quer dizer mostrador.

M. Qual he a segunda?

D. He a maneyra de significar mandando.

M. Dizey exemplos.

D. Ama tu, Lea elle que significaõ por
modo de quem mãda amar, e ler, &c.53

M. E como chamaõ a essa maneyra de
significar?

D. Modo Imperativo.

M. Porque?

D. Porque Imperativo quer dizer mandante.

M. Qual he a terceyra?

D. He a maneyra de significar debayxo
de alguma condiçaõ.

M. Dizey exemplos.

D. Ainda que eu ame, se eu amasse, que naõ
significaõ certamente, que amo,
nem que amey, mas significaõ debayxo
de condiçaõ que assim fosse.

M. E como se chama essa maneyra de significar?

D. Modo Subjunctivo.

M. Porque?

D. Porque Subjunctivo quer dizer cousa,
que està junta com outra, e este modo
significa pela condiçaõ, ou particula,
que se lhe ajunta.

M. Qual he a quarta?

D. He a maneyra de significar sem affirmar
nada.

M. Dizey exemplos.

D. Amar, Amando, que naõ affirmaõ
54nada.

M. E como se chama essa maneyra de significar?

D. Modo Infinito.

M. Porque?

D. Porque Infinito quer dizer cousa, que
naõ tem fim, nem termo, e as palavras,
que naõ affirmaõ nada significaõ
como se naõ tiveraõ fim.

M. E de que constaõ os modos do Verbo?

D. De Tempos.

M. E que cousa he Tempo?

D. Tempo geralmente fallando, saõ as
horas, os dias, os annos.

M. E quantas sortes ha de Tempos?

D. Tres.

M. Quaes saõ?

D. Presente, Passado, Futuro.

M. Qual he o Presente?

D. Saõ os instantes horas, e dias, que
agora vaõ passando.

M. Qual he o Passado.

D. Saõ os instantes, horas, dias, que jà
passáraõ.

M. Qual he Futuro?

D. Saõ os instantes, horas, dias, que ainda
haõ-de vir.55

M. Tendes dito, que cousa he Tempo geralmente
fallando: dizey agora,
que cousa he tempo do Verbo?

D. Tempo do Verbo saõ as palavras do
Verbo, que dizem ordem a algum
tempo.

M. E quantos tempos tem o Verbo?

D. Tres.

M. Quaes saõ?

D. Presente, Passado, Futuro.

M. Qual he o Presente.

D. Saõ as palavras do Verbo, que dizem
ordem ao tempo presente.

M. Dizey exemplo.

D. Amo, Leyo, Ouço. Saõ tempo presente,
porque significaõ que Amo, Leo,
Ouço, neste instante, nesta hora &c.

M. Qual he o tempo passado?

D. Saõ as palavras do Verbo, que dizem
ordem ao tempo, que passou.

M. Dizey exemplo.

D. Amey, Amava, Amàra. Saõ tempo
passado, porque significaõ, que tive
amor, em os instantes, horas, ou
dias &c. que jà passáraõ.

M. Que cousa he tempo Futuro.

D. Saõ as palavras do Verbo, que dizem
56ordem ao tempo, que ha de vir.

M. Dizey exemplo.

D. Amarey, Lerey. Saõ tempo Futuro,
porque significaõ que hey de Amar,
ou Ler nos instantes, horas, dias,
&c. que naõ saõ, mas haõ de vir.

M. E quantos tempos Presentes tem o
Verbo?

D. Hum em cada modo.

M. E quantos tempos Passados?

D. Tres no Indicativo, tres no Substantivo,
e hum no Infinitivo.

M. E porque tem tres tempos Passados?

D. Porque a mesma cousa se pòde considerar
Passada por tres sortes.

M. Quaes saõ.

D. Passada simplesmente a respeyto de si,
Passada a respeyto de si, e presente a
respeyto de outra, Passada a respeyto
de si, e a respeyto de outra.

M. E como se chama o tempo, que significa
a cousa assim simplesmente
passada?

D. Chama-se Preterito perfeyto.

M. Dizey exemplo desse tempo.

D. Amey he perterito perfeyto; porque
significa simplesmente, que a minha
57acção de amar, jà passou.

M. E como se chama o tempo, que demora
a cousa passada em si, e presente
a respeyto de outra?

D. Preterito imperfeyto.

M. Dizey exemplo desse tempo.

D. Ceava, he preterito imperfeyto, porque
mostra que a minha cea jà passou,
e mostra, que a minha cea foy
presente a outra cousa.

M. E como mostra, que a cea foy presente
a outra cousa?

D. Naõ o mostra, quando dizemos sómente
a palavra ceava, porem mostra
o quando usamos della na Oraçaõ.

M. Dizey exemplo.

D. Quando entraste, eu ceava. Nesta Oraçaõ
a palavra Ceava mostra, que a
minha cea jà passou a respeyto do
tempo, em que fallo, porèm mostra,
que foy presente respeyto da
tua entrada.

M. E como se chama o tempo, que significa
a causa passada a respeyto de si, e a respeyto de
outra?

D. Preterito plusquam perfeyto.58

M. Dizey exemplo desse tempo.

D. Eu ceàra, he preterito plusquam perfeyto,
porque mostra que a minha cea
jà passou a respeyto de mim, e mostra,
que tambem jà passou a respeyto
de outra cousa.

M. E quando o mostra?

D. Naõ o mostra, quando digo sómente
Eu ceàra, porèm mostra-o no uso
da Oraçaõ.

M. Dizey exemplo.

D. Quando tu entraste, eu ceara. Nesta
Oraçaõ, a palavra Ceara mostra, que
a minha cea jà passou, a respeyto
do tempo, em que fallo, e mostra,
que tambem jà tinha passado, quando
tu entraste.

M. E que quer dizer Preterito plusquam
perfeyto?

D. Quer dizer Preterito mais que perfeyto.

M. E porque chamaõ aos tempos Passados?

D. Porque Preterito quer dizer Passado.

M. E quantos Futuros tem os Verbos?

D. Dous no Indicativo; dous no Subjunctivo;
hum no Imperativo, e hum
59no Infinitivo.

M. E porque tem dous Futuros?

D. Porque a mesma cousa se pòde considerar,
ou futura simplesmente, ou
futura a respeyto de si, e Passada a
respeyto de outra cousa.

M. E como se chama o tempo, que denota
a cousa futura simplesmente?

D. Chama-se Futuro.

M. Dizey exemplo desse tempo.

D. Eu cearey, he futuro imperfeyto, ou
simples, porque significa simplesmente,
que a minha, Cea, ainda
hade vir.

M. E como se chama o futuro, que significa
a cousa futura a respeyto de
si, e passada a respeyto de outra.

D. Chama-se Futuro perfeyto, e cõposto.

M. Dizey exemplo desse tempo.

D. Eu terey ceado, he futuro perfeyto,
porque mostra, que a minha Cea
ainda ha de vir antes de outra cousa.

M. E quando he que o mostra?

D. Naõ o mostra, quando só digo estas
palavras Eu terey ceado, porem mostra
o quanto uso dellas na Oraçaõ.

M. Dizey exemplo.60

D. Terey ceado quando tu entrares. Nesta
Oraçaõ as palavras Terey ceado mostra,
que a minha cea ainda ha de
vir, e mostra, que quando tu entrares
a minha cea ha de ter Passado.

M. E alèm do que tendes dito, tem os
Verbos alguma cousa, de que se deva
tratar.

D. Sim.

M. Qual he?

D. Gerundios, e Participios.

M. E que cousa he Gerundio?

D. Gerundio he huma palavra do modo
Infinito, que por si só significa indeterminadamente,
mas tem hum
tal geyto de significar, que tira a
obrar o que se diz, assim como
Amando, Lendo, &c.

M. E que quer dizer Gerundio?

D. Gerundio quer dizer operativo; porque
se deriva do Verbo Latino Gero
que significa Obrar.

M. E que cousa he Participio?

D. Participio he huma palavra, que tem
casos, e tempos, assim como, Amado,
Lido, &c.

M. E Porque se chama Participio?61

D. Porque tem parte de Verbo; porque
tem tempos; e tem parte de nome,
porque tem casos. Porem isto dos
Participios só na Gramatica Latina
he que se percebe bem.

Capitulo V.
Das Conjugaçoens dos Verbos Auxiliares.

Mestre. Que cousa conjugaçaõ?

D. He repetir o Verbo por todos
os seus modos, tempos numeros,
e pessoas.

M. E antes de entrar a saber as conjugaçoens
commuas, he necessario saber
algumas particulares?

D. Sim.

M. Quaes?

D. As dos Verbos Auxiliares.

M. Que cousa he Verbo Auxiliar?

D. He o Verbo, que ajuda os demais a
formar os seus tempos.

M. Dizey exemplo.

D. Ser, he Verbo Auxiliar; porque ajuda
os Verbos activos a formar os seus
62tempos Passivos.

M. Dizey exemplo.

D. Eu sou amado. Nesta Oraçaõ o Verbo
Ser com o participio amado forma o
tempo presente do Verbo passivo do
activo Amo, como veremos adiante.

M. E quantos Verbos Auxiliares ha na
lingua Portugueza?

D. Dous.

M. Quaes saõ?

D. O Verbo Ser; o Verbo Ter, ou Haver.

M. Dizey a Conjugaçaõ do Verbo Ser.

D. Conjugaçaõ do Verbo Auxiliar Ser.

Modo Indicativo.

tableau n. s. | eu sou. | tu es. | elle he. | n. p. | nos somos. | vos sois. | elles saõ.

Preterito imperfeyto

tableau n. s. | eu era.63

tableau tu eras. | elle era. | nos eramos. | vós ereis. | elles eraõ.

Preterito perfeyto.

tableau n. s. | eu fuy. | tu foste. | elle foy. | n. p. | nós fomos. | vós fostes. | elles foraõ.

Preterito perfeyto Composto.

tableau n. s. | eu tenho sido. | tu tens sido. | elle tem sido. | n. p. | nòs temos sido. | vòs tendes sido. | elles tem sido.

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | eu fora. | tu foras. | elle fora. | n. p. | nos foramos. | vós foreis. | elles foraõ.64

Preterito plusquam perfeyto composto.

tableau n. s. | eu tinha sido. | tu tinhas sido. | elle tinha sido. | n. p. | nós tinhamos sido. | vòs tinheis sido. | elles tinhaõ sido.

Futuro.

tableau n. s. | eu serey. | tu serás. | elle será. | n. p. | nós seremos. | vós sereis. | elles seraõ.

Futuro composto.

tableau n. s. | eu terey sido. | tu terás sido. | elle terá sido. | n. p. | nòs teremos sido. | vòs tereis sido. | elles teraõ sido.65

Modo Imperativo.
Presente.

tableau n. s. | sè tu. | seja elle. | n. p. | sejamos nòs. | sede vòs. | sejaõ elles.

Futuro.

tableau n. s. | seràs tu. | serà elle. | n. p. | seremos nós. | sereis vós. | seraõ elles.

Modo Subjunctivo.
Presente.

tableau n. s. | posto que eu seja. | tu sejas. | elle seja. | n. p. | posto que nòs sejamos. | vós sejais. | elles sejaõ.66

Preterito imperfeyto.

tableau n. s. | posto que eu fora. | tu foras. | elle fora. | n. p. posto que nós foramos. | vós foreis. | elles foraõ.

Preterito imperfeyto segundo.

tableau n. s. | eu seria. | tu serias. | elle seria. | n. p. nos serìamos. | vós seríeis. | elles seriaõ.

Preterito perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu fosse. | tu fosses. | elle fosse. | n. p. | posto que nós fossemos. | vós fosseis. | elles fossem.67

Preterito perfeyto composto.

tableau n. s. | posto que eu | tenha sido. | tu tenhas sido. | elle tenha sido. | n. p. | posto que nós | tenhamos sido. | vós tenhais sido. | elles tenhaõ sido.

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu fora. | tu foras. | elle fora. | n. p. | posto que nós foramos. | vós foreis. | elles foraõ.

Preterito plusquam perfeyto composto.

tableau n. s. | posto que eu tivera | sido. | tu tiveras sido. | elle tivera sido. | n. p. | posto que nós tiveramos | vós tivereis sido. | elles tiveraõ sido.68

Futuro.

tableau n. s. | como eu for. | tu fores. | elle for. | n. p. | como nòs formos. | vós fordes. | elles forem.

Futuro Composto.

tableau n. s. | posto que eu haja | de ser. | tu hajas de ser. | elle haja de ser. | n. p. | posto que nós hajamos | vós hajais de ser. | elles hajaõ de ser.

Futuro composto.

tableau n. s. | como eu tiver sido. | tu tiveres sido. | elle tiver sido. | n. p. | como nós tivermos sido. | vòs tiverdes sido. | elles tiverem sido.

Modo Infinitivo.
Presente.
Ser.69

tableau preterito perfeyto | ter sido. | futuro | haver de ser. | gerundio, e participio | sendo.

Participio, que serve ao auxiliar Sido.

M. E a que Verbos serve de Auxiliar o
Verbo Ser?

D. Aos Verbos passivos com todos
os modos, tempos, numeros, e pessoas,
como logo diremos.

M. Dizey a Conjugaçaõ do Verbo Ter.

D. Conjugaçaõ do Verbo Auxiliar Ter.

Modo Indicativo.
Presente.

tableau n. s. | eu tenho, ou hey. | tu tens, ou has. | elle tem, ou ha. | n. p. | nòs temos, ou havemos. | vòs tendes, ou haveis. | elles tem, ou haõ.

Preterito imperfeyto.

tableau n. s. | eu tinha, ou havia. | tu tinhas, ou havias. | n. p. | nòs tinhamos, ou haviamos. | vòs tinheis, ou havieis.70

tableau elle tinha, ou havia. | elles tinhaõ, ou haviaõ.

Preterito Perfeyto.

tableau n. s. | eu tive, ou houve. | tu tiveste, ou houveste. | elle teve, ou | houve. | n. p. | nòs tivemos, ou houvemos. | vòs tivestes, ou | houvestes. | elles tiveraõ, ou houveraõ.

Preterito perfeyto composto.

tableau n. s. | eu tenho tido. | tu tens tido. | elle tem tido. | n. p. | nós temos tido. | vòs tendes tido. | elles tem tido.71

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | eu tivera, ou houvera. | tu tiveras, ou houveras. | elle tivera, ou houvera. | n. p. | nòs tiveramos, ou | houveramos. | vós tivereis, ou | houvereis. | elles tiveraõ, ou | houveraõ.

Preterito plusquam perfeyto composto.

tableau n. s. | eu tivera tido. | tu tiveras tido. | elle tivera tido. | n. p. | nós tiveramos tido. | vós tivereis tido. | elles tiveraõ tido.

Futuro.

tableau n. s. | eu terey, ou haverey. | tu teràs, ou72

tableau haverás. | elle terà, ou haverà. | n. p. | nós teremos, ou | haveremos. | vós tereis, ou havereis. | elles teraõ, ou | haveraõ.

Futuro composto.

tableau n. s. | eu hey de ter, ou | haver. | tu has de ter, ou | elle hade ter, ou | n. p. | nós havemos de | ter, ou haver. | vós haveis de ter, | ou haver. | elles haõ de ter,

Futuro composto.

tableau n. s. | eu terey tido. | tu teràs tido. | elle terà tido. | n. p. | nòs teremos tido. | vòs tereis tido. | elles teraõ tido.73

Modo Imperativo.
Presente.

tableau n. s. | tem tu. | tenha elle, ou haja | elle. | n. p. | tenhamos, ou hajamos nòs. | tende, ou havey | vos. | tenhaõ, ou hajaõ elles.

Futuro.

tableau n. s. | teràs, ou haveràs tu. | terà, ou haverà | elle. | n. p. | teremos, ou haveremos | nòs. | tereis, ou havereis | vos. | teraõ, ou haveraõ elles.

Modo Subjunctivo.
Presente.

tableau n. s. | posto que eu tenha,74

tableau ou haja. | tu tenhas, ou | hajas. | elle tenha, ou | haja. | n. p. | posto que nòs tenhamos | ou hajamos. | vòs tenhais, ou | hajaes. | elles tenhaõ, ou | hajaõ.

Preterito imperfeyto.

tableau n. s. | posto que eu tivera, ou | houvera. | tu tiveras, ou | houveras. | elle tivera, ou | n. p. | nós tiveramos, ou | houveramos. | vòs tivereis ou | houvereis. | elles tiveraõ ou | houveraõ.

Preterito imperfeyto segundo.

tableau n. s. | eu teria, ou haveria. | tu terias, ou haverias. | elle teria ou haveria. | n. p. | nòs teriamos, ou | haveriamos. | vòs terieis, ou haverieis. | elles teriaõ, ou haveriaõ.75

Preterito perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu tivesse, | ou houvesse. | tu tivesses, ou houvesses. | elle tivesse, ou houvesse. | n. p. | nós tivessemos, | ou houvessemos. | vós tivesseis, ou | houvesseis. | elles tivessem, ou | houvessem.

Preterito perfeyto composto.

tableau n. s. | posto que eu tenha | tido, ou havido. | tu tenhas tido, ou | havido. | elle tenha tido, | ou havido. | n. p. | nós tenhamos tido, | vós tenhais tido, | elles tenhaõ tido, ou76

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu tivera, ou houvera, &c. | preterito plusquam perfeyto composto. | posto que eu tivera, ou houvera tido, &c.

Futuro.

tableau n. s. | como eu tiver, ou | houver. | tu tiveres, ou | houveres. | elle tiver, ou | n. p. | como nós tivermos, ou | houvermos. | vós tiverdes, ou houverdes. | elles tiverem, ou houverem.77

Futuro composto.

tableau n. s. | posto que eu haja | de ter. | tu hajas de ter. | elle haja de ter. | n. p. | nós hajamos de | ter. | vós hajais de ter. | elles hajaõ de ter.

Futuro composto.

Numero Singular.

Como eu tiver tido, &c.

Modo Infinitivo.

tableau presente | ter. | preterito | ter tido. | gerundio | tendo. | participio | tido.

M. E a que Verbos serve de Auxiliar o
Verbo Ter.

D. A os activos, neutros, e Passivos.

M. Dizey exemplos.78

D. Eu tenho amado aqui serve de Auxiliar
ao Verbo activo Amo. Eu tenho gritado.
Aqui serve de Auxiliar ao
Verbo neutro Gritar. Eu tenho sido
amado
. Aqui serve de Auxiliar ao
Verbo Passivo, Sou amado.

M. E para que tempos, he que serve de Auxiliar?

D. Para o Preterito perfeyto, para o plusquam
perfeyto, para o Futuro, e
Gerundio.

M. Dizey exemplos.

D. Tenho amado he Preterito perfeyto.
Tinha amado he plusquam perfeyto.
Terey amado he Futuro. Tendo amado
he Gerundio.

M. E como se chamaõ a esses Preteritos,
e Futuros?

D. Chamaõ-se Preterito perfeyto composto,
Plusquam perfeyto composto,
Futuro composto, Gerundio cõposto.

M. E porque se chamaõ compostos?

D. Porque se compoem do Participio de
qualquer Verbo, e dos tempos do
Verbo Ter.

M. E de que Participio se compoem?

D. Do Participio Passivo.79

M. Dizey exemplo.

D. Tenho amado compoem-se do Participio
passivo do Verbo Amo.

M. E de que tempos do Verbo Auxiliar
se compoem?

D. De todos.

M. De que sorte?

D. Os Preteritos perfeytos compoem-se
de todos os tempos Presentes, e
Preteritos perfeytos do Verbo Ter.

M. Dizey exemplos.

D. Tenho amado he Preterito perfeyto do
Verbo Amo, e compoem-se do presente
Tenho do Verbo Ter. Tive
amado
he Preterito, e compoem-se
de Tive perfeyto do Verbo Ter. da
mesma sorte Tem tu amado, posto que
eu tenha amado
, saõ perfeytos do
Verbo Amo, compoem-se do Presente
do Verbo Ter.

M. E donde se compoem os plusquam
perfeytos?

D. Compoem-se dos Preteritos imperfeytos
do Verbo, e tambem dos Plusquam
perfeytos.

M. Dizey exemplos.

D. Eu tinha amado, he plusquam perfeyto
80do Verbo Amo, e compoem-se de
Tinha Preterito imperfeyto do Verbo
Ter. Eu tivera amado he plusquam
perfeyto do Verbo Ter.

M. E donde se compoem os Futuros
compostos?

D. Dos Futuros do Verbo Ter, e do presente
Hey Haja.

M. Dizey exemplos.

D. Terey amado; Posto que eu tivera amado
saõ Futuros compostos, e compoem-se
de Terey, e Tiver Futuros
do Verbo Ter. Hey de amar, Posto que
eu haja de amar
.

M. E o Verbo Ter serve tambem de Auxiliar
a si mesmo?

D. Sim.

M. Dizey exemplos.

D. Tenho tido, Tenha tido, Tive tido.

M. E esta Grammatica, e modo de fallar
pelos compostos do Participio, e
Verbo Auxiliar Ter he Latina, ou
naõ?

D. Naõ he Latina, he Barbara.

M. E de que lingua a tomou a Portugueza?

D. Dizem que da Tudesca.81

Capitulo VI.
Das Conjugaçoens dos Verbos Regulares.

Mestre. Qual he o Verbo Regular?

D. Verbo Regular he o que se conforma
com as regras das Conjugaçoens
commuas em tudo.

M. E quantas saõ as Conjugaçoens commuas?

D. Na lingua Portugueza quatro.

M. Quaes saõ?

D. A primeyra dos Verbos, que no Infinitivo
acabaõ em Ar, assim como,
Amar. A segunda dos acabados em
Er assim como Conhecer. A terceyra
dos acabados em Ir assim como,
Admittir. A quarta dos acabados em
Or assim como, Por.

M. E que he necessario para saber essas
Conjugaçoens?

D. Basta de cada huma saber a Conjugaçaõ
de algum Verbo Regular.

M. Porque?

D. Porque sabida a Conjugaçaõ de qualquer
Verbo Regular ficaõ sabidas as
82Conjugaçoens de todos os mais
Verbos Regulares daquella terminaçaõ.

M. Dizey exemplos.

D. Sabida a Conjugaçaõ do Verbo Amar
ficaõ sabidas todas as de mais Conjugaçoens
dos Verbos acabados no
Infinitivo em Ar assim como Estimar,
Louvar
, &c. Sabida a Conjugaçaõ
do Verbo Conhecer ficaõ sabidas
as demais dos Verbos Regulares acabadas
no Infinitivo em Er assim como
Colher, ler &c. Sabida a Conjugaçaõ
do Verbo Admittir ficaõ sabidas
as demais Conjugaçoens dos
Verbos Regulares acabados em Ir
assim como, Reprimir.

M. E de que sorte sabida a Conjugaçaõ
de hum Verbo ficaõ sabidas as demais
Conjugaçoens dos Verbos Regulares
daquella Conjugaçaõ?

D. Isso se dirà adiante, quando tratarmos
das formaçoens.

M. Dizey as Conjugaçoens dos Verbos
acabados no Infinitivo em Ar.

D. Conjugaçaõ dos Verbos em Ar, e primeyra
Conjugaçaõ de Verbo Amar.83

Modo Indicativo.
Presente.

tableau n. s. | eu amo. | tu amas. | elle ama. | n. p. | nós amamos. | vós amais. | elles amaõ.

Preterito imperfeyto.

tableau n. s. | eu amava. | tu amavas. | elle amava. | n. p. | nós amavamos. | vós amaveis. | elles amavaõ.

Preterito perfeyto.

tableau n. s. | eu amey. | tu amaste. | elle amou. | n. p. | nós amàmos. | vòs amastes. | elles amaraõ.84

Preterito perfeyto composto.

tableau n. s. | eu tenho amado. | tu tens amado. | elle tem amado. | n. p. | nòs temos amado. | vòs tendes amado. | elles tem amado.

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | eu amàra. | tu amàras. | elle amara. | n. p. | nòs amaramos. | vòs amàreis. | elles amàraõ.

Preterito plusquam perfeyto composto.

tableau n. s. | eu tinha amado. | tu tinhas amado. | elle tinha amado. | n. p. | nós tinhamos amado. | vós tinheis amado. | elles tinhaõ amado.85

Futuro.

tableau n. s. | eu amarey. | tu amaràs. | elle amará. | n. p. | nòs amaremos. | vós amareis. | elles amaraõ.

Futuro composto.

tableau n. s. | eu hey de amar. | tu has de amar. | elle ha de amar. | n. p. | nós havemos de amar. | vòs haveis de amar. | elles haõ de amar.

Futuro composto.

tableau n. s. | eu terey amado. | tu terás amado. | elle terá amado. | n. p. | nòs teremos amado. | vós tereis amado. | elles teraõ amado.86

M. Tendes dito o modo Indicativo, dizey
agora as propriedades, deste
modo.

D. Affirmar, e mostrar como acima disse,
e por isso he modo principal do
Verbo.

M. E porque só puzestes o Preterito
perfeyto composto: Eu tenho
amado
, e naõ puzestes tambem outro
composto, que he Eu tive amado?

D. Porque nesta Grammatica quer Um.
que eu responda ajustando a conformidade
do Portuguez com o Latim,
para assim se facilitarem os
meninos pelas regras da lingua Portugueza,
a aprenderem as regras, e
uso da lingua Latina, e estes Preteritos
compostos activos naõ os ha no
Latim, alèm de que os mais usados
no Portuguez saõ sòmente os que
tenho dito.

M. E porque nos Futuros dissestes dous
Futuros compostos?

D. Porque todo o Verbo tem dous Futuros
compostos, hum do Verbo Haver,
e do Infinitivo do Verbo conjugado
87com a preposiçaõ De, outro;
composto do Verbo Ter, e do participio
do Verbo conjugado.

M. Prosegui a conjugaçaõ do Verbo
Amar.

Modo Imperativo.

tableau presente. | n. s. | ama tu. | ame elle. | n. p. | amemos nós. | amay vòs. | amem elles.

Futuro.

tableau n. s. | amarás tu. | amará elle. | n. p. | amaremos nós. | amareis vós. | amaraõ elles.

M. Tendes dito o modo Imperativo, dizeyme
agora porque naõ dissestes
os preteritos deste modo?

D. Porque os naõ tem.

M. E porque naõ dissestes deste modo as
88primeyras pessoas do Singular?

D. Porque as naõ tem.

M. E qual he a razaõ?

D. A razaõ he: porque significa, comõ jà
disse, a maneyra de quem manda, e
ninguem se manda a si mesmo.

M. E porque naõ tem Preteritos?

D. Porque a propriedade deste modo he
significar a maneyra de quem manda,
e o Passado, ou Preterito jà se
naõ pode mandar.

M. E porque razaõ neste modo, e só neste,
pondes o Pronome depois do
Verbo?

D. Para mais claramente se ver o modo
de mandar, porque quando mandamos
alguem, ordinariamente se
poem o verbo primeyro, e depois o
pronome Ama tu, vay tu.

M. O Futuro, que dissestes no Indicativo,
saõ as mesmas palavras, que do
Imperativo, dizey pois como se
ha de conhecer que modo he o a
que pertencem?

D. Conhece-se pelo sentido, que tem na
oraçaõ; se o sentido he de affirmar,
e mostrar, pertencem ao Indicativo,
89se de mandar ao Imperativo.

M. Continuay, a conjugaçaõ do verbo
Amar.

Modo Subjunctivo.
Presente.

tableau n. s. | posto que eu ame. | tu ames. | elle ame. | n. p. | posto que nós amemos. | vós amais. | elles amem.

Preterito imperfeyto.

tableau n. s. | posto que eu amàra. | tu amàras. | elle amàra. | n. p. | posto que nós amaramos. | vòs amareis. | elles amàraõ.

Preterito imperfeyto segundo.

tableau n. s. | eu amaria. | tu amarias.90

tableau elle amaria. | n. p. | nós amariamos. | vós amarieis. | elles amariaõ.

Preterito prefeyto.

tableau n. s. | posto que eu amasse. | tu amasses. | elle amasse. | n. p. | posto que nós amassemos. | vós amasseis. | elles amassem.

Preterito perfeyto composto.

tableau n. s. | posto que eu tenha amado. | tu tenhas amado. | elle tenha amado. | n. p. | posto que nós tenhamos amado. | vós tenhais amado. | elles tenhaõ amado.

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu amára. | tu amáras. | elle amára. | n. p. | posto que nós amaramos. | vós amareis. | elles amàraõ.91

Preterito plusquam perfeyto composto.

tableau n. s. | posto que eu tivera | amado. | tu tiveras amado. | elle tivera amado. | n. p. | posto que nós tiveramos | vòs tivereis amado. | elles tiveraõ amado.

Futuro.

tableau n. s. | como eu amar. | tu amares. | elle amar. | n. p. | como nòs amarmos. | vós amardes. | elles amarem.

Futuro composto.

tableau n. s. | posto que eu haja | de amar. | tu hajas de amar. | elle haja de amar. | n. p. | posto que nòs hajamos | vòs hajais de amar. | elles hajaõ de amar.92

Futuro composto.

tableau n. s. | como eu tiver amado. | tu tiveres amado. | elle tiver amado. | n. p. | como nòs tivermos | amado. | vos tiverdes amado. | elles tiverem amado.

M. Tendes ditto o Subjunctivo. Dizey
agora as propriedades deste modo.

D. As propriedades deste modo saõ significar
com hum certo geyto de Futuro,
depender de outra palavra, e
ordinariamente he regido de algum
outro Verbo para fazer sentido perfeyto.

M. Dizey exemplo.

D. Eu ame he Subjunctivo, mas as taes
palavras naõ fazem sentido sem
se lhe ajuntar alguma outra palavra
do Verbo que o reja, assim como
Permitta Deos que eu ame.

M. Tem mais propriedades o modo Subjunctivo?

D. Tem tambem outra propriedade, que
93os seus tempos naõ tem firmeza,
porque a mesma palavra, que humas
vezes significa tempo Presente,
outras significa tempo Futuro segundo
as particulas, conjunçoens,
e Verbos de que he regido, e tambem
os Preteritos perfeytos, Imperfeytos,
e Plusquam perfeytos,
se confundem na Oraçaõ, e se poem
huns pelos outros.

M. Dizey exemplos.

D. Posto que eu trabalhe naõ estou cançado.
Nesta Oraçaõ a palavra Trabalhe,
està no presente, porque he rigida
do Verbo Estou, que està no presente.
Porem nestoutra Oraçaõ,
Posto que eu trabalhe, naõ hey de cançar.
A palavra Trabalhe està no
Futuro porque he regida do Futuro
hey de cançar.

M. E porque puzestes no Subjunctivo
dous preteritos imperfeytos?

D. Porquenas linguas vulgares os taes
Subjunctivos tem os taes Preteritos
imperfeytos, ainda que como jà
disse se confundem muytas vezes, e
servem huns pelos outros.94

M. E porque puzestes as mesmas palavras
no primeyro Imperfeyto, e no
Plusquam perfeyto?

D. Porque servem para hum, e para outro.

M. E porque em huns tempos puzestes a
conjunçaõ Posto que, em outros a conjunçaõ
Como.

D. Porque nem todos os tempos do Subjunctivo
se podem accomodar com
qualquer conjunçaõ.

M. E porque no segundo Imperfeyto naõ
puzestes conjunçaõ?

D. Porque ordinariamente na Oraçaõ a
leva depois, e para o sentido naõ
necessita della antes.

M. Dizey exemplo.

D. Eu ame: naõ faz sentido algum; nem
Eu ame a Pedro, posto que me aborrece.
Eu amaria Sim faz algum sentido,
ainda que sempre depende da
particula; e conjunçaõ, que lhe vay
diante. Eu amaria a Pedro, posto que
me aborrecesse
.

M. Continuay a Conjugaçaõ do Verbo
Amar.95

Modo Infinitivo.

tableau presente | amar. | preterito prefeyto | ter amado. | futuro | haver de amar. | gerundio | amando. | participio, que serve aos compostos | amado.

M. Que propriedades tem este modo?

D. Naõ, affirmar, nem declarar nada por
si, e ser sempre regido de outro
Verbo.

M. Dizey exemplo.

D. Amar. Esta palavra por si só, nem
affirma, nem declara alguma cousa,
e para affirmar, ou declarar alguma
cousa ha de ser regida de outro Verbo,
assim como Quero amar. Onde
a palavra Amar he regida do Verbo
Quero.

M. E porque naõ puzestes no Infinitivo
pessoas?

D. Porque as naõ tem. Como Verbo.

M. Dizey a Conjugaçaõ passiva do Verbo
Amar.

D. Conjugaçaõ passiva do Verbo Amar.96

Modo Indicativo.
Presente.

tableau n. s. | eu sou amado. | tu es amado. | elle he amado. | n. p. | nós somos amados. | vós sois amados. | elles saõ amados.

Preterito imperfeyto.

tableau n. s. | eu era amado. | tu eras amado. | elle era amado. | n. p. | nós eramos amados. | vós ereis amados. | elles eraõ amados.

Preterito perfeyto.

tableau n. s. | eu fuy amado. | tu foste amado. | elle foy amado. | n. p. | nós fomos amados. | vós fostes amados. | elles foraõ amados.97

Preterito perfeyto composto.

tableau n. s. | eu tenho sido amado. | tu tens sido amado. | elle tem sido amado. | n. p. | nós temos sido amados. | vós tendes sido amados. | elles tem sido amados.

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | eu fora amado. | tu foras amado. | elle fora amado. | n. p. | nós foramos amados. | vós foreis amados. | elles foraõ amados.

Preterito plusquam perfeyto composto.

tableau n. s. | eu tinha sido amado. | tu tinhas sido amado.98

tableau elle tinha sido amado. | n. p. | nós tinhamos sido amados. | vós tinheis sido amados. | elles tinhaõ sido amados.

Futuro.

tableau n. s. | eu serey amado. | tu seràs amado. | elle serà amado. | n. p. | nós seremos amados. | vós sereis amados. | elles seraõ amados.

Futuro composto.

tableau n. s. | eu hey de ser | amado. | tu has de ser | elle ha de ser | n. p. | nós havemos de ser | amados. | vós haveis de ser | elles haõ de ser

Futuro composto.

tableau n. s. | eu terey sido amado.99

tableau tu teràs sido amado. | elle terà sido amado. | n. p. | nòs teremos sido amados. | vòs tereis sido amados. | elles teraõ sido amados.

Modo Imperativo.
Presente.

tableau n. s. | se tu amado. | seja elle amado. | n. p. | sejamos nós amados. | sede vós amados. | sejaõ elles amados.

Futuro.

tableau n. s. | serás tu amado. | serà elle amado. | n. p. | seremos nòs amados. | sereis vòs amados. | seraõ elles amados.100

Modo Subjunctivo.
Presente.

tableau n. s. | posto que eu seja amado. | tu sejas amado. | elle seja amado. | n. p. | posto que nòs sejamos amados. | vós sejais amados. | elles sejaõ amados.

Preterito imperfeyto.

tableau n. s. | posto que eu fora amado. | tu foras amado. | elle fora amado. | n. p. | posto que nòs foramos amados. | vós foreis amados. | elles foraõ amados.

Preterito imperfeyto.

tableau n. s. | eu seria amado. | tu serias amado. | elle seria amado. | n. p. | nós seriamos amados. | vós serieis amados. | elles seriaõ amados.101

Preterito perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu fosse amado. | tu fosses amado. | elle fosse amado. | n. p. | posto que nós fossemos amados. | vòs fosseis amados. | Elles fossem amados.

Preterito perfeyto composto.

tableau n. s. | posto que eu tenha sido amado. | tu tenhas sido amado. | elle tenha sido amado. | n. p. | posto que nós tenhamos sido amados. | vós tenhais sido amados. | elles tenhaõ sido amados.

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu fora amado. | n. p. | posto que nós foramos amados.102

tableau tu foras amado. | vós foress amados. | elle fora amado. | elles foraõ amados.

Preterito plusquam perfeyto composto.

tableau n. s. | posto que eu tivera sido amado. | tu tiveras sido amado. | elle tivera sido amado. | n. p. | posto que nòs tiveramos sido amados. | vòs tivéreis sido amados. | elles tiveraõ sido amados.

Futuro.

tableau n. s. | como eu for amado. | tu fores amado. | elle for amado. | n. p. | como nós formos amados. | vòs fordes amados. | elles forem amados.103

Futuro composto.

tableau n. s. | posto que eu haja de ser amado. | tu hajas de ser amado. | elle haja de ser amado. | n. p. | posto que nòs hajamos de ser amados. | vòs hajais de ser amados. | elles hajaõ de ser amados.

Futuro composto.

tableau n. s. | como eu tiver sido amado. | tu tiveres sido amado. | elle tiver sido amado. | n. p. | como nós tivermos sido amados. | vós tiverdes sido amados. | elles tiverem sido amados.

Modo Infinitivo.

tableau presente | ser amado. | preterito | ter sido amado.104

tableau futuro | haver de ser amado. | gerundio | sendo amado. | participio. | amado.

M. Tendes dito a Conjugaçaõ Passiva do
Verbo Amar, dizey agora os tempos
da tal Conjugaçaõ saõ simplices,
ou compostos?

D. Todos saõ compostos. Huns saõ compostos
sómente do Verbo Ser, e do
Passivo do Verbo conjugado, assim
como, Sou amado. Era amado, &c.
outros saõ compostos do Verbo Ter
e do Participio do Verbo Ser, e do
Participio do Verbo conjugado; assim
como, Tenho sido amado &c. a estes
he que na Conjugaçaõ Passiva chamamos
compostos.

M. Dizey a Conjugaçaõ dos Verbos, que
no Infinitivo acabaõ em Er.

D. Conjugaçaõ dos Verbos em Er, e segunda
conjugaçaõ.

Conjugaçaõ do Verbo Receber.

Modo Indicativo.
Presente.

tableau n. s. | eu recebo. | nòs recebemos.105

tableau tu recebes. | elle recebe. | n. p. | vós recebeis. | elles recebem.

Preterito imperfeyto.

tableau n. s. | eu recebia. | tu recebias. | elle recebia. | n. p. | nòs recebiamos. | vós recebieis. | elles recebiaõ.

Preterito perfeyto.

tableau n. s. | eu recebi. | tu recebeste. | elle recebeo. | n. p. | nós recebemos. | vòs recebestes. | elles receberaõ.

Preterito perfeyto composto.

tableau n. s. | eu tenho recebido, &c.106

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | eu recebera. | tu receberas. | elle recebera. | n. p. | nòs receberamos. | vòs recebereis. | elles receberaõ.

Preterito plusquam perfeyto composto.

tableau n. s. | eu tinha recebido, &c.

Futuro.

tableau n. s. | eu receberey. | tu receberás. | elle receberá. | n. p. | nós receberemos. | vòs recebereis. | elles receberaõ.107

Futuro composto.

tableau n. s. | eu hey de receber, &c.

Futuro composto.

tableau n. s. | eu terey recebido, &c.

Modo Imperativo.
Presente.

tableau n. s. | recebe tu. | receba elle. | n. p. | recebamos nòs. | recebey vòs. | recebaõ elles.

Futuro.

tableau n. s. | receberàs tu.108

tableau receberà elle. | n. p. | receberemos nòs. | recebereis vòs. | receberaõ elles.

Modo Subjunctivo.
Presente.

tableau n. s. | posto que eu receba. | tu recebas. | elle receba. | n. p. | posto que nòs recebamos. | vòs recebais. | elles recebaõ.

Preterito imperfeyto.

tableau n. s. | posto que eu recebera. | tu recebèras. | elle recebèra. | n. p. | posto que nòs receberamos. | vòs recebereis. | elles recebèraõ.

Preterito imperfeyto segundo.

tableau n. s. | n. p. | eu receberia. | nòs receberiamos. | tu receberias. | vòs receberieis.109

tableau elle receberia. | elles receberiaõ.

Preterito perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu recebesse. | tu recebesses. | elle recebesse. | n. p. | posto que nós recebessemos. | vòs recebesseis. | elles recebessem.

Preterito perfeyto composto.

tableau n. s. | posto que eu tenha recebido.

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu recebera. | tu receberas. | elle recebera. | n. p. | posto que nòs receberamos. | vòs recebereis. | elles receberaõ.110

Preterito plusquam perfeyto composto.

tableau n. s. | posto que eu tivera recebido, &c.

Futuro.

tableau n. s. | como eu receber. | tu receberes. | elle receber. | n. p. | como nòs recebermos. | vós receberdes. | elles receberem.

Futuro composto.

tableau n. s. | posto que eu haja de receber.

Futuro composto.

tableau n. s. | como eu tiver recebido.111

Modo Infinitivo.

tableau presente | receber. | preterito | ter recebido. | futuro | haver de receber. | gerundio | recebendo. | participio para os compostos | recebido.

Conjugaçaõ passiva do Verbo Receber.

Presente.

tableau eu sou recebido, &c. | preterito imperfeyto | eu era recebido, &c. | preterito perfeyto | eu fuy recebido, &c. | prefeyto composto | eu tenho sido recebido. | preterito plusquam perfeyto | eu fora recebido, &c. | plusquam perfeyto composto | eu tinha sido recebido, &c. | futuro | eu serey recebido, &c. | futuro cõposto | eu hey de ser recebido, &c. | eu terey sido recebido, &c.

Modo Imperativo.

tableau presente | se tu recebido, &c. | futuro | seràs tu recebido, &c.112

Modo Subjunctivo.

tableau presente | posto que eu seja recebido, &c. | pret. imperfeyto | posto que eu fora recebido, &c. | preterito imperfeyto seg. | eu receberia, &c. | preterito perfeyto | posto que eu fosse recebido. | perfeyto composto | posto que eu tenha sido recebido, &c. | preterito plusquam perfeyto | plusquam perfeyto composto | posto que eu tivera sido recebido, &c. | futuro | como eu for recebido, &c. | futuro composto | posto que eu haja de ser recebido, &c. | como eu tiver sido recebido, &c.

Modo Infinitivo.

tableau presente | ser recebido. | preterito perfeyto | ter sido recebido. | futuro | haver de ser recebido. | gerundio | sendo recebido. | participio | recebido.

M. Dizey a Conjugaçaõ dos Verbos acabados
113no Infinitivo em Ir.

D. Conjugaçaõ terceyra dos Verbos em
Ir.

Conjugaçaõ do Verbo Admittir.

Modo Indicativo.
Presente.

tableau n. s. | eu admitto. | tu admittes. | elle admitte. | n. p. | nòs admittimos. | vòs admittis. | elles admittem.

Preterito imperfeyto.

tableau n. s. | eu admittia. | tu admittias. | elle admittia. | n. p. | nòs admittiamos. | vòs admittieis. | elles admittiaõ.

Preterito perfeyto.

tableau n. s. | eu admitti.114

tableau tu admittiste. | elle admittio. | n. p. | nòs admittimos. | vòs admittistes. | elles admittiraõ.

Preterito perfeyto composto.

tableau n. s. | eu tenho admittido, &c.

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | eu admittira. | tu admittiras. | elle admittira. | n. p. | nòs admittiramos. | vòs admittireis. | elles admittiraõ.

Plusquam perfeyto composto.

tableau eu tinha admittido, &c.115

Futuro.

tableau n. s. | eu admittirey. | tu admittiràs. | elle admittirà. | n. p. | nós admittiremos. | vòs admittireis. | elles admittiraõ.

Futuro composto.

tableau n. s. | eu hey de admittir, &c.

Futuro composto.

tableau n. s. | eu terey admittido, &c.

Modo Imperativo.
Presente.

tableau n. s. | admitte tu.116

tableau admitta elle. | n. p. | admittamos nòs. | admitti vòs. | admittaõ elles.

Futuro.

tableau n. s. | admittiràs tu. | admittirà elle. | n. p. | admittiremos nòs. | admittireis vòs. | admittiraõ elles.

Modo Subjunctivo.
Presente.

tableau n. s. | posto que eu admitta. | tu admittas. | elle admitta. | n. p. | posto que nòs admittamos. | vòs admittais. | elles admittaõ.

Preterito imperfeyto.

tableau n. s. | posto que eu admittira. | n. p. | posto que nòs admittiramos.117

tableau tu admittiras. | elle admittira. | n. p. | vòs admittireis. | elles admittiraõ.

Preterito imperfeyto segundo.

tableau n. s. | eu admittiria. | tu admittirias. | elle admittiria. | n. p. | nós admittiriamos. | vós admittirieis. | elles admittiriaõ.

Preterito perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu admittisse. | tu admitisses. | elle admitisse. | n. p. | posto nòs que admittissemos. | vòs admittisseis. | elles admittissem.

Preterito perfeyto composto.

tableau n. s. | posto eu tenha admittido, &c.118

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu admittira. | tu admittiras. | elle admittira. | n. p. | posto que nós admittiramos. | vòs admittireis. | elles admittiraõ.

Preterito plusquam perfeyto composto.

tableau n. s. | posto que eu tivera admittido, &c.

Futuro.

tableau n. s. | como eu admittir. | tu admittires. | elle admittir. | n. p. | como nòs admittirmos. | vós admittirdes. | elles admittirem.119

Futuro composto.

tableau n. s. | posto que eu haja de admittir, &c.

Futuro composto.

tableau n. s. | como eu tiver admittido, &c.

Infinitivo.

tableau presente | admittir. | preterito perfeyto | ter admittido. | futuro | haver de admittir. | gerundio | admittindo.

Participio, que serve aos cõpostos Admittido.

Conjugaçaõ passiva do Verbo Admittir.

Modo Indicativo.

tableau presente | eu sou admittido, &c. | preterito imperfeyto | eu era admittido, &c.120

tableau preterito perfeyto | eu fuy admittido, &c. | preterito perfeyto composto | eu tenho sido admittido, &c. | preterito plusquam perfeyto | eu fora admittido, &c. | preterito plusquam perfeyto composto | eu tivera sido admittido, &c. | futuro | eu serey admittido, &c. | futuro cõposto | eu hey de ser admittido. | eu terey sido admittido, &c.

Modo Imperativo.

tableau presente | se tu admittido, &c. | futuro | seras tu admittido, &c.

Modo Subjunctivo.

tableau presente | posto que eu seja admittido, &c. | preterito imperfeyto | eu seria admittido. | preterito imperfeyto seg. posto que eu fora admittido, &c. | pret. perfeyto. | posto que eu fosse admittido, &c. | preterito perfeyto composto. | posto que eu tenha sido admittido, &c. | preterito plusquam perfeyto | posto que eu fora admittido, &c.121

tableau preterito plusquam perfeyto composto | posto que eu tivera sido admittido, &c. | futuro | como eu for admittido, &c. | futuro composto | posto que eu haja de ser admittido, &c. | como eu tiver sido admittido, &c.

Modo Infinitivo.

tableau presente | ser admittido. | preterito perfeyto | ter sido admittido. | futuro | haver de ser admittido. | gerundio | sendo admittido. | participio | admittido.

Conjugaçaõ dos Verbos em Or.
Conjugaçaõ do Verbo Por.

Modo Indicativo.
Presente.

tableau n. s. | eu ponho. | tu poens. | elle poem. | n. p. | nós pomos. | vós pondes. | elles poem.122

Preterito imperfeyto.

tableau n. s. | eu punha. | tu punhas. | elle punha. | n. p. | nós punhamos. | vòs punheis. | elles punhaõ.

Preterito perfeyto.

tableau n. s. | eu puz. | puzeste. | poz. | n. p. | nòs puzemos. | puzestes. | puzeraõ.

Preterito perfeyto composto.

tableau n. s. | eu tenho posto, &c.123

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | eu puzera. | puzeras. | puzera. | n. p. | puzeramos. | puzereis. | puzeraõ.

Preterito plusquam perfeyto composto.

tableau n. s. | eu tinha posto, &c.

Futuro.

tableau n. s. | eu porey. | poràs. | porà. | n. p. | poremos. | poreis. | poraõ.

tableau futuro composto | eu hey de pòr, &c. | eu terey posto, &c.124

Modo Imperativo.
Presente.

tableau n. s. | poem tu. | ponha elle. | n. p. | ponhamos nòs. | ponde vòs. | ponhaõ elles.

Futuro.

tableau n. s. | poràs tu. | porà elle. | n. p. | poremos nòs. | poreis vòs. | poraõ elles.

Modo Subjunctivo.
Presente.

tableau n. s. | posto que eu ponha. | tu ponhas. | elle ponha. | n. p. | posto que nos ponhamos. | vós ponhais. | elles ponhaõ.125

Imperfeyto primeyro.

tableau n. s. | posto que eu puzera. | tu puzeras. | elle puzera. | n. p. | posto que nòs puzeramos. | vòs puzereis. | elles puzeraõ.

Preterito imperfeyto segundo.

tableau n. s. | eu poria. | tu porias. | elle poria. | n. p. | nòs poriamos. | vòs porieis. | elles poriaõ.

Preterito perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu puzesse. | tu puzesses. | elle puzesse. | n. p. | posto que nós puzessemos. | vòs puzesseis. | elles puzessem.126

Preterito perfeyto composto.

tableau n. s. | posto que eu tenha posto, &c.

Preterito plusquam perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu puzera. | tu puzeras. | elle puzera. | n. p. | posto que nòs puzeramos. | vòs puzereis. | elles puzeraõ.

Preterito plusquam perfeyto composto.

tableau n. s. | posto que eu tivera posto, &c.127

Futuro

tableau n. s. | como eu puzer. | tu puzeres. | elle puzer. | n. p. | como nòs puzermos. | vòs puzerdes. | elles puzerem.

Futuro composto.

tableau n. s. | posto que eu haja de por, &c.

Futuro composto.

tableau n. s. | como eu tiver posto, &c.

Modo Infinitivo.

tableau presente | por. | preterito perfeyto | ter posto. | futuro | haver de pòr. | gerundio | pondo.128

tableau participio | posto.

Conjugaçaõ passiva do Verbo Por.

Modo Indicativo.

tableau presente | eu sou posto. | preterito imperfeyto | eu era posto. | preterito perfeyto | eu fuy posto. | preterito perfeyto composto | eu tenho sido posto. | preterito plusquam perfeyto | eu fora posto. | preterito plusquam perfeyto cõposto | eu tivera sido posto. | futuro | eu serey posto. | futuro composto | eu hey de ser posto. | eu terey sido posto.

Modo Imperativo.

tableau presente | se tu posto, &c. | futuro | seras tu posto, &c.

Modo Subjunctivo.

tableau presente | posto que eu seja posto, &c. | preterito imperfeyto | eu seria posto, &c.129

tableau preterito imperfeyto | eu fora posto, &c. | preterito perfeyto | posto que eu fosse posto, &c. | preterito perfeyto composto | posto que eu tenha sido posto, &c. | preterito plusquam perfeyto | posto que eu fora posto, &c. | preterito plusquam perfeyto composto | posto que eu tivera sido posto, &c. | futuro | como eu for posto, &c. | futuro composto | posto que eu haja de ser posto, &c. | como eu tiver sido posto, &c.

Modo Infinitivo.

tableau presente | ser posto. | preterito imperfeyto | ter sido posto. | futuro | haver de ser posto. | gerundio | sendo posto. | participio | posto.130

Capitulo VII
Das formaçoens dos Verbos Regulares.

Mestre. Que cousa he formaçaõ?

D. Formaçaõ he por huma palavra
fazer outra palavra.

M. Dizey exemplo.

D. Quero formar o tempo presente do
Indicativo do Verbo Estimar, busco
o tempo presente do Verbo Amar,
e por elle vou formando as palavras
do Verbo Estimar, Amo, Estimo, Amas,
Estimas, &c.

M. E quantas castas ha de formaçoens?

D. Duas.

M. Quaes saõ?

D. Formaçaõ por semelhança, e formaçaõ
por participaçaõ.

M. Que cousa he nas palavras participaçaõ?

D. He ter huma palavra parte de outra
palavra.

M. E que cousa he formaçaõ por semelhança?

D. He quando faço a formaçaõ de hum
131Verbo, ou nome à semelhança da
formaçaõ de outro Verbo, ou nome.

M. Dizey exemplo.

D. Quero formar o presente do Verbo
Andar, e vejo como se forma o presente
do Verbo Amar, e segundo
este se forma, assim vou eu fomando
o presente do Verbo Andar.

M. E que cousa he formaçaõ por participaçaõ?

D. He quando da palavra, ou pessoa de
hum Verbo formo outra do mesmo
Verbo.

M. Dizey exemplo.

D. Quando formo v. g. a segunda pessoa
do Preterito perfeyto do Verbo
Ando da primeyra do mesmo Preterito,
dizendo que a segunda pessoa
Andaste se fórma da primeyra Andey,
mudando o ey em aste.

Capitulo VIII.
Das formaçoens dos Verbos.

Mestre. Como se formaõ as palavras
do Verbo?132

D. Por mudança de letras da raiz do Verbo.

M. Qual he a raiz do Verbo?

D. He o Infinitivo.

M. Dizey exemplo.

D. Amar he raiz do Verbo Amo, Conhecer
do Verbo Conheço.

M. Porque he o Infinitivo raiz do Verbo?

D. Porque delle nascem os tempos, e as
pessoas do Verbo.

M. Dizey exemplo.

D. Do Infinitivo Amar nasce o presente
Amo, o Imperfeyto Amava, o perfeyto
Amey, &c.

M. E de que letras consta, e se compoem
a raiz do Verbo?

D. De letra terminativa, de letra figurativa,
de letras iniciaes.

M. Quaes saõ as letras iniciaes?

D. Saõ as letras, porque principia a raiz,
e estaõ antes da letra figurativa.

M. Dizey exemplos.

D. As letras iniciaes da raiz Escrever saõ
Escre, porque por ellas principia a
raiz Escrever, e estaõ antes da figurativa.

M. Porque se chamaõ Iniciaes?133

D. Porque Inicial quer dizer cousa, que
principia.

M. E nas formaçoens das palavras do
Verbo mudaõ-se as letras iniciaes?

D. Naõ.

M. Dizey exemplo.

D. Da raiz Escrever forma-se o presente
Escrevo, e naõ se mudaõ as letras
iniciaes Escre.

M. Porque?

D. Porque o officio das letras iniciaes he
correrem por todos os modos, tempos,
e pessoas do Verbo.

M. Dizey exemplo.

D. As letras iniciaes da raiz Escrever saõ
Escre, estas correm todos os modos,
tempos, e pessoas do Verbo. Escrevo,
Escrevia, Escreveste, &c.

M. E qual he a letra figurativa da raiz do
Verbo?

D. He a letra, que està antes da terminaçaõ.

M. Dizey exemplos.

D. A letra figurativa da raiz Amar he a
letra m, porque està antes da terminaçaõ
ar; a figurativa da raiz Conhecer
he c porque està antes da terminaçaõ
er.134

M. E a letra figurativa muda-se nas formaçoens?

D. Naõ.

M. Dizey exemplos.

D. Da raiz Escrever forma-se o presente
Escrevo, e naõ se muda a figurativa
V. Da raiz Amar forma-se o presente
Amo, e naõ se muda a figurativa
m.

M. Porque?

D. Porque o officio da figurativa he correr
todos os modos, tempos, e pessoas
dos Verbos, e ajuntar as letras
iniciaes com as terminaçoens.

M. Dizey exemplo.

D. Da raiz Amar a figurativa he m, e
esta he figurativa em todas as demais
palavras do Verbo, assim como
Amo, Amavas, Amando, &c.

M. E quando a raiz do Verbo tem só tres
letras, qual he então a figurativa, e
quaes as iniciaes?

D. Entaõ a figurativa serve tambem de
inicial, assim como na raiz Ler.

M. E qual he a terminaçaõ, ou letras terminativas
da raiz?

D. He a ultima syllaba, ou duas ultimas
135letras da raiz.

M. Dizey exemplo.

D. Amar. A syllaba, e letras ar he terminaçaõ,
e letras terminativas. Conhecer.
A syllaba er he terminaçaõ.

M. E porque se chamaõ estas letras terminativas?

D. Porque Terminativa quer dizer cousa,
que poem fim, e as taes letras saõ as
que fazem o fim da raiz.

M. E a terminaçaõ da raiz muda-se nas
formaçoens?

D. Sim.

M. Dizey exemplo.

D. Da raiz Amar formo o presente Amo,
e mudo a syllaba ar na letra o.

M. E porque se muda a terminaçaõ nas
formaçoens?

D. Porque o officio da terminaçaõ he
differençar, e fazer entre si diversas
as pessoas, numeros, tempos, e modos
do Verbo.

M. Dizey exemplo.

D. Amar. Esta palavra se differença pela
terminaçaõ ar de todas as demais
palavras do Verbo, assim como Amo,
Amavas, Amando.136

M. Acima dissestes, que a figurativa era a
que differençava entre si os Verbos,
como dizeis agora que he a terminaçaõ?

D. A figurativa differença entre si hum
Verbo do outro Verbo, a terminaçaõ
differença entre si as palavras
do mesmo Verbo.

M. Dizey exemplo.

D. O Verbo Amar differença-se do Verbo
Arar pela figurativa m, porem a
raiz Amar differença-se das mais
palavras do seu Verbo pela terminaçaõ
ar, assim como Amo, Amas, Amava,
&c.

M. E como se fazem as formaçoens
dos tempos, e pessoas?

D. Fazem-se mudando-se a terminaçaõ
da raiz na terminaçaõ do tempo,
ou pessoa, que quero formar.

M. Dizey exemplo.

D. Quero formar o preterito perfeyto do
Indicativo do Verbo Estimar, mudo
a terminaçaõ ar na terminaçaõ
ey, e formo o preterito perfeyto do
Indicativo Estimey.

M. E como se sabe qual he o tempo, ou
137pessoa, que quero formar?

D. Sabe-se por dous modos, ou pelas terminaçoens
do Verbo exemplar,
ou pelas taboas das terminaçoens.

M. E como se sabe pelas terminaçoens do
Verbo exemplar?

D. Sabe-se, procurando no Verbo exemplar
a pessoa, o tempo, e o modo,
que se intenta formar, vendo qual
he a sua terminaçaõ.

M. Dizey exemplos.

D. Quero formar o Preterito perfeyto do
Indicativo do Verbo Estimar, vou
buscar o exemplar da terminaçaõ, ou
conjugaçaõ ar, que he o Verbo Amar,
e neste Verbo busco o Preterito perfeyto
do Indicativo, e vejo que a sua
terminaçaõ he ey, aste, ou, &c. Am-ey,
Am-aste, Am-ou; e mudo a terminaçaõ
da raiz Estimar em ey, aste, ou.
Estim-ei, Estim-aste, Estim-ou.

M. E como se sabe nos tempos do Verbo
exemplar qual he a sua terminaçaõ?

D. Sabe-se pela letra figurativa do Verbo.

M. De que sorte?

D. Todas as letras, ou syllabas, que estaõ
138depois da figurativa do Verbo, saõ terminaçaõ.

M. Dizey exemplo.

D. O Preterito imperfeyto do Indicativo
Am-ava, Am-avas, Am-ava, &c. As
terminaçoens saõ ava, avas, ava,
porque estaõ depois da figurativa m.

M. Dissestes acima que a figurativa se
conhecia pela terminaçaõ, como
agora dizeis que as terminaçoens
se conhecem pela figurativa?

D. A figurativa do Verbo conhece-se pela
terminação da raiz, porém as demais
terminaçoes conhecem-se pela
figurativa.

M. Porque?

D. Porque as terminaçoens mudaõ-se em
todos os tempos, e pessoas do Verbo,
e a figurativa sempre he a mesma.

M. Dizey exemplo.

D. Na raiz Amar conhece-se que a figurativa
do Verbo Amar he m, porque
he a letra, que està antes da terminaçaõ,
ou ultima syllaba da raiz, e nos
demais tempos, e pessoas, como
Amey, Amamos, Amareis, conhece-se
139que a terminaçaõ he ey, amos, areis,
porque saõ as syllabas, ou letras, que
estaõ depois da figurativa do Verbo,
que he m.

M. Que cousa he taboa das terminaçoens
do Verbo?

D. Taboa das terminaçoens he lista de
todas as pessoas, numeros, tempos,
e modos do Verbo.

M. E quantas taboas ha de terminaçoens
do Verbo?

D. Na lingua Portugueza ha tres.

M. Quaes saõ?

D. A das terminaçoens do Verbo acabado
no Infinitivo em ar, dos acabados
em er, a dos acabados em ir.

M. E como se formaõ os Verbos por essas
taboas?

D. Com muyta facilidade. Quero formar
a primeyra pessoa do futuro Indicativo
do Verbo Estimar, busco na
primeyra taboa a terminaçaõ do tal
futuro, e pessoa, acho que he arey,
ajunto esta terminaçaõ com as letras
iniciaes, e figurativa do Verbo Estimar,
que saõ Estim, e faço Estimarey.140

M. Componde essas tres taboas.

D. Taboa das terminaçoens dos Verbos
em ar.

Singular. Pessoas. | Tempos. Presente. | Plurar. Pessoas.

tableau 1 o | 2 as | 3 a | 1 amos | 2 ais | 3 aõ

Imperfeyto.

tableau ava | avas | avamos | aveis | avaõ

Perfeyto.

tableau ey | aste | ou | amos | astes | araõ

Plusquam.

tableau ara | aras | aramos | areis | araõ

Futuro.

tableau arey | aras | ara | aremos | areis | araõ

Imperativo presente

tableau a | e | emos | ay | em | araõ arà | aremos areis arão

Subjunctivo presente.

tableau e | es | emos | eis | em

Imperfeyto primeyro.

tableau ara | aras | arámos | areis | araõ

Imperfeyto segundo.

tableau aria | arias | ariamos | arieis | ariaõ

Perfeyto.

tableau asse | asses | assemos | asseis | assem141

Plusquam.

tableau ara | aras | aramos | areis | araõ

Futuro.

tableau ar | ares | armos | ardes | arem

Infinito presente.

tableau ar.

Gerundio.

tableau ando.

Participio.

tableau ado.

Taboa das terminaçõess dos Verbos em er.

Singular. Pessoas. | Plurar. Pessoas.

tableau 1 | 2 | 3

Indicativo presente

tableau o | es | e | emos | eis | em

Imperfeyto.

tableau ia | ias | iamos | ieis | iaõ

Perfeyto.

tableau i | este | eo | emos | estes | eraõ

Plusquam.

tableau era | eras | eramos | ereis | eraõ

Futuro.

tableau erèy | eràs | erà | eremos | erèis | eraõ

Imperativo presente.

tableau e | a | amos | ey | aõ

Futuro.

tableau eràs | erà | erèmos | erèis | eràõ142

Subjunctivo presente.

tableau a | as | amos | ais | aõ

Imperfeyto primeyro.

tableau era | eras | eramos | ereis | eraõ

Imperfeyto segundo.

tableau eria | erias | eriamos | erieis | eriaõ

Perfeyto.

tableau esse | esses | essemos | esseis | essem

Plusquam.

tableau era | eras | eramos | ereis | eraõ

Futuro.

tableau er | eres | ermos | erdes | erem

Infinitivo presente.

tableau er.

Gerundio.

tableau endo.

Participio.

tableau ido.

Taboa das terminações dos Verbos em ir.

Indicativo presente.

tableau o | es | e | imos | is | em

Imperfeyto.

tableau ia | ias | iamos | ieis | iaõ

Perfeyto.

tableau i | iste | io | imos | istes | iraõ143

Plusquam.

tableau ira | iras | iramos | ireis | iraõ

Futuro

tableau irey | iràs | irà | irèmos | irèis | iraõ

Imperativo presente.

tableau e | a | amos | i | aõ

Futuro.

tableau iràs | irà | iremos | ireis | iraõ

Subjunctivo presente.

tableau o | as | a | amos | ais | aõ

Imperfeyto primeyro.

tableau ira | iras | iramos | ieis | iraõ

Imperfeyto segundo.

tableau iria | irias | iriamos | irieis | iriaõ

Perfeyto.

tableau isse | isses | issemos | isseis | issem

Plusquam.

tableau ira | iras | iramos | ireis | iraõ

Futuro.

tableau ir | ires | irmos | irdes | irem

Infinitivo presente.

tableau

Gerundio.

tableau indo.

Participio.

tableau ido.

M. E porque naõ ha taboa nas terminaçoens
dos Verbos acabados em or, que
disssestes fazem a quarta cõjugaçaõ?144

D. Porque verdadeyramente na lingua
Portugueza só ha tres conjugações,
porque em or só acaba o Verbo Por,
e os seus compostos compor, dispor,
&c. e assim propriamente naõ formaõ
conjugaçaõ diversa, mas saõ
Verbos irregulares; porem como o
Verbo Por tem muytos compostos,
e na lingua Latina ha quatro conjugaçoens,
por isso disse acima haver
tambem quatro na Portugueza,
para observar o mais que posso semelhança
entre a lingua Latina, e
Portugueza; e advirta-se que os
compostos do Verbo Por todos se
cõjugaõ como o Verbo Por, de quem
se compoem.

M. As formaçoens, que tendes dito, servem
para todos os tempos, ou só
para alguns?

D. Servem sómente para todos os tempos
simplices.

M. E donde se formaõ os tempos compostos?

D. Formaõ-se dos Verbos auxiliares, e
do Participio do Verbo principal, ou
do Infinitivo, e da preposiçaõ De.145

M. Dizey exemplo.

D. Eu tenho amado he tempo composto
do Verbo Amar, e forma-se do presente
do Verbo auxiliar Ter, e do
Participio Amado do Verbo principal
Amar.

M. E de que tempos do Verbo auxiliar se
formaõ?

D. Isso jà fica dito no Capitulo VI.

M. Tendes mais que dizer das formaçoens
dos Verbos Regulares?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Capitulo IX.
Das castas dos Verbos.

Mestre. Quantas castas ha de Verbos?

D. Muytas.

M. Dizey algumas.

D. Ha verbos Activos, Passivos, Neutros.

M. Qual he o Activo?

D. He o que significa huma cousa, que eu
faço a outrem, assim como Quebrar,
Cozer, Assar.

M. E para o Verbo ser activo he necessario
146que essa cousa seja somente feyta
no nosso pensamento, ou he necessario
mais?

D. Basta ser feyta a outrem, ainda que
seja só no nosso pensamento.

M. Dizey exemplos.

D. Amar he Verbo Activo, porque significa
cousa, que eu faço a outrem, ainda
que a cousa, que eu faço a outrem,
he dentro no meu pensamẽto.

M. Qual he o Verbo Passivo?

D. He o que significa cousa, que outrem
me faz a mim, assim como Ser amado,
ser assado, ser entendido.

M. Qual he o Verbo Neutro?

D. Verbo Neutro he o que significa huma
cousa, que eu faço, mas naõ a faço a
outrem, nem outrem ma faz a
mim, assim como Rir; ou significa
alguma cousa, que me succede, mas
naõ a faço a outrem; assim como
Adoecer, Enfraquecer, Desmayar, &c.

M. Continuay as castas dos Verbos.

D. Ha Verbos pessoaes, e impessoaes.

M. Quaes saõ?

D. Pessoaes saõ os que tem tres pessoas
em ambos os numeros, assim como
147Amo, Amas, Ama, &c. Impessoaes
os que só tem a terceyra pessoa,
assim como Acontece.

M. Continuay as castas dos Verbos.

D. Ha Verbos Reciprocos.

M. Quaes saõ?

D. Saõ os que significaõ de sorte, que fazem
a acçaõ da pessoa entre, e torne
para a mesma pessoa, assim como
Callarse, Levantarse.

M. E como se conhecem facilmente esses
Verbos?

D. Conhecem-se, porque quando fora da
Oraçaõ repetimos o seu Infinitivo,
ou raiz lhe accrescentamos a particula
se, assim como Callarse, Doerse.

M. Continuay as castas dos Verbos.

D. Ha Verbos Simplices, e Compostos.

M. Quaes saõ?

D. Simplices os que constaõ de huma só
palavra; assim como Amar. Compostos
os que constaõ de duas, assim
como Des-figurar, Tres-ler.

M. Continuay as castas dos Verbos.

D. Ha Verbos Irregulares, e Regulares.

M. Quaes saõ?

D. Regulares saõ os que se conjugaõ pelas
148regras, que demos no Capitulo
passado, Irregulares os que se affastaõ
dellas.

M. E quantos saõ os Irregulares.

D. Muytos, mas os principaes saõ estes.
Na primeyra cõjugaçaõ Dar, Estar.
Na segunda Dizer, Fazer, Poder,
Ver, Querer, Saber, Trazer. Na terceyra
Ir, Vir.

M. Esses Verbos saõ Irregulares em todos
os tempos, e modos, ou só em
alguns?

D. Huns saõ em todos, outros saõ em alguns,
mais, ou menos.

M. Dizey as conjugaçoens dos tempos
Irregulares desses Verbos.

D. Conjugaçaõ dos Verbos Irregulares.

Conjugaçaõ do Verbo Dar.

Modo Indicativo.
Presente.

tableau eu dou. | tu dàs. | elle dà. | nòs damos | vòs dais | elles daõ.

Imperfeyto.

tableau eu dava, &c.149

Perfeyto.

tableau eu dey | tu dèste | elle deu | nòs dèmos | vós dèstes | elles deraõ.

Plusquam perfeyto.

tableau eu dera | tu deras | elle dera | nòs deramos | vòs dereis | elles deraõ

Futuro.

tableau eu darey, &c.

Modo Imperativo.

tableau presente | dà tu, &c. | futuro. | daras tu, &c.

Modo Subjunctivo.
Presente.

tableau posto que eu dè, &c.

Imperfeyto.

tableau posto que eu dera.

Imperfeyto segundo.

tableau eu daria | tu darias | elle daria | nòs dariamos | vòs darieis | elles dariaõ150

Preterito perfeyto.

tableau posto que eu desse | tu dèsses | elle desse | nòs dessemos | vòs desseis | elles dessem

Plusquam perfeyto.

tableau eu dera, &c.

Futuro.

tableau como eu der | tu deres | elle der | nòs dermos | vòs derdes | elles derem

Modo Infinitivo.

tableau presente. | dar. | gerundio. | dando. | participio. | dado.

Conjugaçaõ do Verbo Estar.

Modo Indicativo.
Presente.

tableau eu estou | tu estàs | elle està | nòs estamos | vòs estais | elles estaõ

Preterito imperfeyto.

tableau eu estava, &c.151

Preterito perfeyto.

tableau eu estive | tu estiveste | elle esteve | nòs estivemos | vòs estivestes | elles estiveraõ

Plusquam perfeyto.

tableau eu estivera | tu estiveras | elle estivera | nòs estiveramos | vòs estivereis | elles estiveraõ

Futuro.

tableau eu estarey, &c.

Modo Imperativo.
Presente.

tableau està tu | esteja elle | estejamos nòs | estay vòs | estejaõ elles

Futuro.

tableau estaras tu, &c.

Modo Subjunctivo.
Presente.

tableau posto que eu esteja | tu estejas | elle esteja | nòs estejamos | vòs estejais | elles estejaõ152

Preterito imperfeyto primeyro.

tableau posto que eu estivera | tu estiveras | elle estivera | nòs estiveramos | vòs estivereis | elles estiveraõ

Preterito imperfeyto segundo.

tableau eu estaria | tu estarias | elle estaria | nòs estariamos | vòs estarieis | elles estariaõ

Preterito perfeyto.

tableau posto que eu estivesse | tu estivesses | elle estivesse | nòs estivessemos | vòs estivesseis | elles estivessem

Preterito plusquam.

tableau eu estivera, &c.

Futuro.

tableau como eu estiver | tu estiveres | elle estiver | nós estivermos | vós estiverdes | elles estiverem

Modo Infinitivo.

tableau presente. | estar. | gerundio. | estando. | participio. | estado.153

Conjugaçaõ do Verbo Dizer.

Modo Indicativo.
Presente.

tableau eu digo | tu dizes | elle diz | nòs dizemos | vós dizeis | elles dizem

Preterito imperfeyto.

tableau eu dizia, &c.

Preterito perfeyto.

tableau eu disse | tu disseste | elle disse | nòs dissemos | vós dissestes | elles disseraõ

Plusquam perfeyto.

tableau eu dissera, &c.

Futuro.

tableau eu direy | tu diràs | elle dirà | nòs diremos | vòs direis | elles diraõ

Modo Imperativo.

tableau presente. | dize tu | diga elle | digamos nòs | dizey vòs | digaõ elles154

Futuro.

tableau diràs tu | dirà elle | diremos nòs | direis vòs | diraõ elles

Modo Subjunctivo.
Presente.

tableau posto que eu diga, &c.

Preterito imperfeyto.

tableau posto que eu dissera, &c.

Imperfeyto segundo.

tableau eu diria, &c.

Preterito perfeyto.

tableau posto que eu dissesse, &c.

Preterito plusquam perfeyto.

tableau eu dissera, &c.

Futuro.

tableau como eu disser, &c.

Modo Infinitivo.

tableau presente. | dizer. | gerundio. | dizendo. | participio. | dito.155

Conjugaçaõ do Verbo Fazer.

Modo Indicativo.
Presente.

tableau eu faço | tu fazes | elle faz | nós fazemos | vós fazeis | elles fazem

Preterito imperfeyto.

tableau eu fazia, &c.

Preterito perfeyto.

tableau eu fiz | tu fizeste | elle fez | nós fizemos | vós fizestes | elles fizeraõ

Plusquam.

tableau eu fizera, &c.

Futuro.

tableau eu farey | tu faràs | elle farà | nós faremos | vós fareis | elles faraõ

Imperativo.
Presente.

tableau faze tu | faça elle | façamos nòs | fazey vòs | façaõ elles156

Futuro.

tableau faràs tu | farà elle | faremos nòs | fareis vòs | faraõ elles

Subjunctivo.
Presente.

tableau posto que eu faça, &c.

Imperfeyto.

tableau posto que eu fizera, &c.

Imperfeyto segundo.

tableau eu faria, &c.

Perfeyto.

tableau posto que eu fizesse, &c.

Plusquam.

tableau posto que eu fizera, &c.

Futuro.

tableau como eu fizer | tu fizeres | elle fizer | nós fizermos | vós fizerdes | elle fizerem

Modo Infinitivo.

tableau presente. | fazer. | gerundio. | fazendo. | participio. | feyto.157

Conjugaçaõ do Verbo Poder.

Modo Indicativo.
Presente.

tableau eu posso | tu pòdes | elle pòde | nós podemos | vós podeis | elles pòdem

Preterito imperfeyto.

tableau eu podia, &c.

Perfeyto.

tableau eu pude | tu pudeste | elle pode | nòs pudemos | vós pudestes | elles puderaõ

Plusquam.

tableau eu pudera, &c.

Futuro.

tableau eu poderey | tu poderàs | elle poderà | nòs poderemos | vós podereis | elles poderaõ

Subjunctivo.

tableau presente. | posto que eu possa, &c. | imperfeyto. | posto que eu pudera, &c. | imp. segundo. | eu poderia, &c. | perfeyto. | posto que eu pudesse, &c. | plusquam perf. | eu pudera, &c. | futuro. | como eu puder, &c.158

Infinitivo.

tableau presente. | poder. | gerundio. | podendo.

Conjunçaõdo do verbo Saber.

Indicativo Presente.

tableau eu sey | tu sabes | elle sabe | nós sabemos | vós sabeis | elles sabem

Preterito imperfeyto.

tableau eu sabia, &c.

Perfeyto.

tableau eu soube, &c.

Plusquam perfeyto.

tableau eu soubera, &c.

Futuro.

tableau eu saberey, &c.

Imperativo.
Presente.

tableau sabe tu | sayba elle | saybamos nòs | sabey vòs | saybaõ elles

Futuro.

tableau saberàs tu | saberà elle | saberemos nòs | sabereis vòs | saberaõ elles159

Subjunctivo.

tableau presente. | posto que eu sayba, &c. | imperf. primeyro. | posto que eu soubera, &c. | imperf. segundo. | eu saberia, &c. | perfeyto. | posto que eu soubesse, &c. | plusquam perf. | eu soubera, &c.

Futuro.

tableau como eu souber | tu souberes | elle souber | nós soubermos | vós souberdes | elles souberem

Infinitivo.

tableau presente. | saber. | gerundio. | sabendo. | participio. | sabido.

Conjugaçaõ do Verbo Trazer.

Indicativo.
Presente.

tableau eu trago | tu trazes | elle traz | nós trazemos | vós trazeis | elles trazem

Imperfeyto.

tableau eu trazia, &c.160

Perfeyto.

tableau eu trouxe | tu trouxeste | elle trouxe | nós trouxemos | vós trouxestes | elles trouxeraõ.

Plusquam.

tableau eu trouxera, &c.

Futuro.

tableau eu trarey | tu traras | elle trarà | nós traremos | vós trareis | elles traraõ

Imperativo.
Presente.

tableau traze tu | traga elle | tragamos nòs | trazey vòs | tragaõ elles

Futuro.

tableau traràs tu | trarà elle | traremos nòs | trareis vòs | traraõ elles

Subjunctivo.

tableau presente. | posto que eu traga, &c. | imperfeyto. | posto que eu trouxera, &c. | imperfeyto seg. eu traria, &c. | perfeyto. | posto que eu trouxesse, &c. | plusquam.161

Futuro.

tableau como eu trouxer | tu trouxeres | elle trouxer | nós trouxermos | vós trouxerdes | elles trouxerem

Infinitivo.

tableau presente. | trazer. | gerundio. | trazendo. | participio. | trazido.

Conjugaçaõ do Verbo Ir.

Modo Indicativo.
Presente.

tableau eu vou | tu vas | elle vay | nós vamos | vós ides | elles vaõ

Imperfeyto

tableau eu jà, &c.

Perfeyto.

tableau eu fuy, &c.

Plusquam.

tableau eu fora, &c.

Futuro.

tableau eu irey, &c.

Modo Imperativo.
Presente.

tableau vay tu. | va elle | vamos nòs | ide vòs | vaõ elles162

Futuro.

tableau iràs tu | irá elle | iremos nòs | ireis vòs | iraõ elles.

Subjunctivo.
Presente.

tableau posto que eu vá | tu vás | elle vá | nós vamos | vós vades | elles vaõ

Imperfeyto primeyro.

tableau posto que eu fora, &c.

Imperfeyto segundo.

tableau eu iria, &c.

Perfeyto.

tableau posto que eu fosse, &c.

Plusquam.

tableau posto que eu fora, &c.

Futuro.

tableau como eu for | tu fores | elle for | nós formos | vós fordes | elles forem

Infinitivo.

tableau presente. | ir. | gerundio. | indo. | participio. | ido.163

Conjugaçaõ do Verbo Vir.

Modo Indicativo.
Presente.

tableau eu venho | tu vens | elle vem | nòs vimos | vòs vindes | elles vem

Imperfeyto.

tableau eu vinha, &c.

Perfeyto.

tableau eu vim | tu vieste | elle veyo | nòs viemos | vòs viestes | elles vieraõ

Plusquam.

tableau eu viera, &c.

Futuro.

tableau eu virey | tu viràs | elle virà | nòs viremos | vòs vireis | elles viraõ

Imperativo.
Presente.

tableau vem tu | venha elle | venhamos nòs | vinde vòs | venhaõ elles164

Futuro.

tableau viràs tu | virà elle | viremos nòs | vireis vòs | viraõ elles

Subjunctivo.

tableau presente. | posto que eu venha, &c. | imperf. primeyro. | posto que eu viera, &c. | imperf. segundo. | eu viria, &c. | perfeyto. | posto que eu viesse, &c. | plusquam.

Futuro.

tableau como eu vier | tu vieres | elle vier | como nòs viermos | vòs vierdes | elles vierem

Infinitivo.

tableau presente. | vir. | gerundio. | vindo. | participio.

Conjugaçaõ do Verbo Ver.

Modo Indicativo.
Presente.

tableau n. s. | eu vejo | tu vès | elle vè | n. p. | nòs vemos | vòs vedes | elles vem165

Imperfeyto.

tableau eu via, &c.

Perfeyto.

tableau eu vi, &c.

Plusquam perfeyto.

tableau eu vira, &c.

Futuro.

tableau eu verey, &c.

Imperativo.
Presente.

tableau n. s. | vè tu | veja elle. | n. p. | vejamos nòs | vede vòs | vejaõ elles

Futuro.

tableau veràs tu, &c.

Subjunctivo.
Presente.

tableau n. s. | posto que eu veja | tu vejas | elle veja | n. p. | nòs vejamos | vòs vejais | elles vejaõ166

Imperfeyto primeyro.

tableau n. s. | posto que eu vira | tu viras | elle vira | n. p. | nòs viramos | vòs vireis | elles viraõ

Imperfeyto segundo.

tableau eu veria, &c.

Perfeyto.

tableau n. s. | posto que eu visse | tu visses | elle visse | n. p. | nòs vissemos | vòs visseis | elles vissem

Plusquam perfeyto.

tableau posto que eu vira, &c.

Futuro.

tableau n. s. | como eu vir | tu vires | elle vir | n. p. | nós virmos | vòs virdes | elles virem

Indicativo.

tableau presente. | ver. | gerundio. | vendo. | participio. | visto.167

Conjugaçaõ do Verbo Querer.

Modo Indicativo.
Presente.

tableau eu quero, &c.

Imperfeyto.

tableau eu queria, &c.

Perfeyto.

tableau n. s. | eu quiz | tu quizeste | elle quiz | n. p. | nòs quizemos | vós quizestes | elles quizeraõ

Plusquam perfeyto.

tableau eu quizera, &c.

Futuro.

tableau eu quererey, &c.

Imperativo.
Presente.

tableau n. s. | quere tu | queyra elle | n. p. | queyramos nós | querey vós | queyraõ elles168

Subjunctivo.
Presente.

tableau n. s. | posto que eu queyra | tu queyras | elle queyra | n. p. | nòs queyramos | vòs queyrais | elles queyraõ | &c.

Capitulo X.
Dos Adverbios, Preposiçoens, e Conjunçoens.

Mestre. Qual he a quarta casta de palavras,
de que usamos na lingua
Portugueza?

D. Participios.

M. Que cousa he participio?

D. Isso jà fica dito no Capitulo IV.

M. Qual he a quinta casta de palavras?

D. Adverbios.

M. Que cousa he Adverbio?

D. Adverbio he huma palavra, que naõ
tem tempos, nem se declina por casos,
e junta a outra palavra determina,
e declara a sua significaçaõ.169

M. Dizey exemplo.

D. Combate valerosamente, a palavra Valerosamente
he adverbio, porque junta
com o Verbo combater declara que
se combate Valerosamente, isto he
com valor.

M. E porque estas palavras se chamaõ
Adverbios?

D. Porque ordinariamente se poem junto
ao Verbo, assim como Combate valerosamente.

Tambem se poem cõ os adjectivos,
assim como Muyto bom, mas sempre
leva Verbo, ou se lhe entende.

M. E quantas castas ha de Adverbios?

D. Muytas.

M. Dizey as principaes.

D. Ha adverbios de lugar, assim como Onde,
Donde, Por onde, Para onde. Ha adverbios
de tempo; assim como
Hoje, Amanhãa, Hontem, Antehontem.
Ha adverbios de perguntar, assim como
Porque? Porque razaõ? Como
assim
? Ha Adverbios de affirmar,
assim como Sim, Certamente, Na verdade,
Sem duvida. Ha Adverbios de
negar, assim como Naõ, De nenhum
170modo
. Ha Adverbios de mostrar,
assim como Eis-aqui, Eis-alli. Ha
adverbios de chamar, assim como Olà,
O, Sciô
. Ha Adverbios de comparar,
assim como Do mesmo modo, Da mesma
sorte
. Ha adverbios de quantidade,
assim como Muyto, Pouco,
Mais, Menos.

M. Continuay as castas de Adverbios.

D. Ha Adverbios, que saõ nomes com
seu artigo, assim como Ás escondidas,
Ás claras
; Á tarde. Ha Adverbios, que
saõ nomes com proposiçaõ, assim
como De noyte, De dia, Sem duvida.

M. Continuay as castas de Adverbios.

D. Ha Adverbios, que se formaõ dos nomes
adjectivos, e adverbios, que
naõ se formaõ dos nomes adjectivos.

M. Dizey exemplos.

D. Grandemente. He Adverbio, e forma-se
do adjectivo grande, e da particula
mente. Onde naõ se forma.

M. E como se formaõ os Adverbios dos
adjectivos?

D. Formaõ-se ordinariamente dos adjectivos
na terminaçaõ feminina,
171accrescentandolhe a palavra mente.

M. Dizey exemplo.

D. Claramẽte, forma-se do adjectivo Clara,
e da particula mente, que se lhe accrescenta.

M. Qual he a sexta casta de palavras, que
ha na lingua Portugueza?

D. As Preposiçoens.

M. Que cousa he Preposiçaõ?

D. Preposiçaõ he huma palavra, que se
poem antes das outras palavras, ou junta, ou
separada.

M. Dizey exemplos.

D. Para Roma. A palavra Para he Preposiçaõ,
e està posta antes do nome
Roma. Condiscipulo. A palavra Com
he Preposiçaõ, e està junta ao nome
Discipulo.

M. E quantas castas ha de Preposiçoens?

D. Ha Preposiçoens separaveis, e inseparaveis.

M. Quaes saõ as separaveis?
D.Saõ as que podem vir separadas de outras
palavras, assim como Para Roma.

M. E quantas saõ essas Preposiçoens?

D. Saõ muytas.172

M. Dizey algumas.

D. Alem, Aquem, Antes, Em, Junto,
Perto, Por, Para, e outras.

M. Quaes saõ as inseparaveis?

D. Saõ as que naõ podem vir na Oraçaõ
sem estarem unidas, e juntas com
outra palavra.

M. Dizey exemplo.

D. Refazer. A Preposiçaõ Re està junta à
palavra fazer, e naõ pode vir na Oraçaõ
separada.

M. E quantas saõ essas Preposiçoens?

D. Muytas.

M. Dizey algumas.

D. Re, De, Ex, Extra, Intro, Per, Pro, e
outras, a mayor parte dellas tiradas
do Latim.

M. E as Preposiçoens regem caso?

D. As separadas sim.

M. E que casos regem?

D. Accusativo, e Ablativo.

M. E quaes saõ as que regem Accusativo,
e Ablativo?

D. Isso diremos na Syntaxe.

M. E ha algumas Preposiçoens, que tenhaõ
alguma particularidade?

D. Sim.173

M. Quaes saõ?

D. Estas De, Em, Por, A.

M. Que particularidade tem a Preposiçaõ
De?

D. Tem a particularidade, que na apparencia
muda de letras, tem numeros,
e terminaçaõ, humas vezes masculina,
outras feminina, humas vezes se
diz De, outras Da.

M. E porque dizeis que isso he na apparencia?

D. Isso he embaraçado, e naõ he para os
principiantes.

M. E que particularidades tem a Preposiçaõ
Em?

D. A Preposiçaõ Em muytas vezes se
muda nestas particulas No, Na,
Nos, Nas.

M. Dizey exemplo.

D. Vive em sua casa. Vive na sua casa. Vive
em o seu cazal. Vive no seu cazal
.

M. E que particularidade tem a Preposiçaõ
Por?

D. A Preposiçaõ Por muytas vezes se muda
nas particulas Pelo, Pelos, Pela,
Pelas.

M. Dizey exemplo.174

D. Veyo por mar, ou veyo pelo mar.

M. E que particularidade tem a preposiçaõ
A?

D. Tem a particularidade, que se poem
em lugar de outras preposiçoens.

M. Dizei de que preposiçoens se poem,
e que casos pede?

D. Poem-se em lugar da preposiçaõ Para,
e entaõ pede accusativo, assim como
Fuy a Roma, ou Para Roma. Deylhe
a beber agua
, ou para beber. Poem-se
em lugar da preposiçaõ Por, e pede
accusativo, assim como O arratel de
uvas val a dez reis
, ou por dez reis.
Poem-se em lugar da preposiçaõ
Com, ou De, e pede accusativo, assim
como Morro a fome, de fóme, ou com
fóme
. Poem-se em lugar da preposiçaõ
em, e pede accusativo, assim
como Foy-se ao pòr do Sol, que val o
mesmo, que se dissesse Foy-se no pòr
do Sol
. Esta preposiçaõ A he a que
na lingua Portugueza tem mais difficuldade
para fazermos os seus casos
semelhantes à Grãmatica Latina.

M. Tendes mais que dizer das Preposiçoens?175

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

M. Qual he a setima casta de palavras,
que se usa na lingua Portugueza?

D. As Conjunçoens.

M. Que cousa he Conjunçaõ?

D. Conjunçaõ he huma particula, que
serve de unir o sentido, e palavras
da Oraçaõ.

M. Dizey exemplos.

D. Eu, e Pedro somos Religiosos. Nesta
Oraçaõ a particula e serve de Cõjunçaõ,
porque une, e ata a palavra Eu
com a palavra Pedro.

M. Quantas castas ha de Conjunçoens?

D. Muytas.

M. Dizey algumas.

D. Ha Conjunçoens Copulativas, e Disjunctivas.

M. Quaes saõ as Copulativas?

D. Saõ as que ataõ as palavras com o sentido
da Oraçaõ, assim como Eu, e Pedro
somos Religiosos
.

M. Quaes saõ as Disjunctivas?

D. Saõ as que ataõ, e unem as palavras,
mas apartaõ, e desunem o sentido,
assim como Ou.

M. Dizey exemplo.176

D. Pedro, ou Paulo entrou aqui. Nesta Oraçaõ
a particula ou ata a palavra Pedro
com a palavra Paulo, mas desune-os
no sentido da Oraçaõ: porque faz
mostrar, naõ entraraõ ambos, mas
hum só, ou hum, ou outro.

M. Continuay as castas de Conjunçoens.

D. Ha Conjunçoens causaes, e condicionaes.

M. Quaes saõ as causaes?

D. As que mostraõ, e significaõ a causa
de alguma cousa.

M. Dizey exemplo.

D. Como, porque tenho fome. Nesta Oraçaõ a
particula Porque he Conjunçaõ causal;
porque declara que a causa, e
motivo de eu comer he a fome.

M. Quaes saõ as condicionaes?

D. Saõ as que fazem o sentido da Oraçaõ
condicional, assim como Se, Posto,
Ainda que, &c.

M. Dizey exemplo.

D. Se estiver doente, hey de curarme. Nesta
Oraçaõ a particula Se faz o sentido
condicional, porque affirma que me
hey de curar, mas debayxo da condiçaõ
se estiver doente.177

M. Qual he a oytava casta de palavras, de que
se usa na lingua Portugueza?

D. As Interjeyçoens.

M. Que cousa he Interjeyçaõ?

D. He huma particula, que mostra os affectos
do animo, assim como Ay, que
mostra a tristeza, ou angustia, Ó que
mostra alegria.

M. Tendes mais que dizer dos Adverbios,
Preposiçoens, Conjunçoens,
ou Interjeyçoens?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Capitulo XI.
Dos Generos dos nomes, e dos Preteritos dos
Verbos.

Mestre. Que cousa he Genero de nome?

D. He a accõmodaçaõ, que entre si guardaõ
os substantivos e adjectivos.

M. Dizey exemplo.

D. Este substantivo Monte accommoda-se
cõ a terminaçaõ masculina de qualquer
adjectivo, que tem duas terminaçoens,
178assim como quando dizemos
Monte alto, Monte fragozo, e
naõ se accommoda com a terminaçaõ
feminina alta, ou fragosa. Esta
explicaçaõ basta para o principiante,
porque isto tem seu embaraço.

M. E quantas castas ha de Generos?

D. Tres na lingua Portugueza.

M. Quaes saõ?

D. Masculino, Feminino, e Commum.

M. Qual he o masculino?

D. He a accommodaçaõ, que guardaõ os
substantivos com a terminaçaõ masculina
dos adjectivos, que tem duas
terminaçoens.

M. Dizey exemplo.

D. Monte he do genero masculino; porque
junto com o adjectivo Alto, ou
outro, que tenha duas terminações,
accommoda-se com a terminaçaõ
masculina, e se diz Monte alto, Monte
bayxo
.

M. E qual he o Genero feminino?

D. He a accommodaçaõ, que os nomes
substantivos guardaõ com a terminaçaõ
feminina dos adjectivos, que
tem duas terminaçoens.179

M. Dizey exemplo.

D. Terra he do genero feminino, porque
com os adjectivos, que tem duas
terminaçoens, se accommoda com a
feminina, assim como Terra alta,
Terra bayxa
, &c.

M. Qual he o Genero commum?

D. He a accommodaçaõ, que ha entre a
terminaçaõ commua dos adjectivos
com os substantivos masculinos, e
femininos.

M. Dizey exemplo.

D. Fertil he do genero commum, porque
se accommoda com os substantivos
masculinos, e femininos, assim como
Campo fertil, Terra fertil.

M. E como se conhece quaes saõ os nomes
masculinos, e femininos?

D. Masculinos saõ os que na declinaçaõ
antes do nominativo tem o artigo
O, assim como O monte, femininos os
que tem o artigo A, assim como A
terra
; communs os que tem hum e
outro artigo, assim como O fertil, e
A fertil.

M. E os nomes proprios, que na declinaçaõ
naõ tem artigo antes do nominativo,
180assim como Pedro, Antonio,
Portugal, Lisboa, como se conhecem
de que Genero saõ?

D. Conhecem-se pelo Genero do seu nome
appellativo, a que pertencem.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro he masculino; porque pertence
ao appellativo Homem, Portugal he
masculino, porque pertence ao appellativo
Reyno, que he masculino,
Antonia he feminino, porque pertence
ao appellativo Mulher, que he
feminino, Lisboa he feminino, porque
pertence ao appellativo Cidade,
&c.

M. E na lingua Portugueza ha nomes do
Genero incerto?

D. Naõ.

M. Qual he o nome de Genero incerto?

D. He aquelle, que huns fazem masculino,
outros feminino, assim como
Fim, a que na Provincia do Minho
a gente vulgar faz feminino, e diz
A fim, a gente polida masculino, O
fim
, e he como se deve dizer.

M. E ha Genero Neutro no Portuguez?

D. Naõ.181

M. E qual he o nome do Genero Neutro?

D. O que nem he masculino, nem feminino.
No Latim ha muytos.

M. E porque he facil no Portuguez saber
o Genero dos nomes, e no Latim he
trabalhoso?

D. Porque no Portuguez os nomes quasi
sempre se poem com o seu artigo,
que mostra o Genero, e no Latim
poucas vezes se poem com o artigo.

M. Que cousa saõ Preteritos?

D. Preteritos, fallando absolutamente, saõ
os Preteritos perfeytos do Indicativo
dos Verbos, assim como Amey,
Conheci, Admitti.

M. E como fazem no Preterito os Verbos?

D. Isso jà o disse nas Conjugaçoens.

M. Pois basta saber as Conjugaçoens para
saber os Preteritos?

D. Na lingua Portugueza sim.

M. E na Latina?

D. Naõ.

M. Porque?

D. Porque os Verbos Regulares Latinos
no Preterito ordinariamente mudaõ
de letras iniciaes, e figurativas, e naõ
182tem raiz, donde se formar; porèm
no Portuguez os Verbos no Preterito
só mudaõ a terminaçaõ, e formaõ-se
do Infinitivo.

M. E na lingua Portugueza ha Supinos?

D. Naõ.

M. Que cousa he Supino?

D. Isso pertence a quem aprende Latim.

M. Tendes mais que dizer dos Generos, e
Preteritos?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.183

Segunda parte
da grammatica
Portugueza

Capitulo I.
Da Syntaxe, e de suas castas.

Mestre. Que cousa he Syntaxe?

D. Syntaxe he a boa ordem,
e disposiçaõ das palavras.

M. E que cousa he a boa ordem,
e disposiçaõ das palavras?

D. He estarem as palavras no numero,
caso, e no lugar, que lhes pertence.

M. Dizey exemplo.

D. O Pay ama aos filhos. Nesta Oraçaõ ha
boa ordem de palavras, porque todas
184as palavras estaõ no numero, caso, e
lugar, que se lhes deve. Ao contrario
se eu disser. O Pay aos ama filhos,
ou Os Pay amaõ aos filho, estaõ mal
ordenadas as palavras, porque naõ
estaõ no caso, e lugar, que deve ser.

M. E quantas castas ha de Syntaxe?

D. Duas.

M. Quaes saõ?

D. Syntaxe simples, e Syntaxe figurada.

M. Qual he a simples?

D. He a que ensina as regras de ordenar
bem as palavras na ordem natural.

M. E qual he a ordem natural das palavras?

D. He que o artigo esteja antes do nome,
o nominativo antes do Verbo, o
caso do Verbo depois do Verbo,
que o adjectivo tenha o seu substantivo,
&c.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro ama a seu pay. Nesta Oraçaõ as
palavras estaõ na sua ordem natural,
porque o nominativo Pedro està antes
do Verbo ama, depois do Verbo
està o seu caso, &c. Ao contrario
nesta Oraçaõ Ama Pedro ao pay seu
185as palavras naõ estaõ na ordem natural
porque o nominativo Pedro està
depois do Verbo, &c.

M. Qual he a Syntaxe figurada?

D. He a que ensina quando estaõ bem ordenadas
as palavras, ainda que estejaõ
fóra da ordem natural.

M. Quantas castas ha de Syntaxe simples?

D. Duas.

M. Quaes saõ?

D. Syntaxe de concordar, e Syntaxe de
reger.

M. Qual he a de concordar?

D. He a que ensina as regras de concordar
os Verbos com os nomes, ou
pronomes, e a concordar os nomes
adjectivos com os substantivos.

M. E que cousa he concordar os Verbos
com os nomes, ou pronomes?

D. He estar o Verbo no mesmo numero,
e pessoa, em que estaõ os nomes, e
pronomes.

M. Dizey exemplo.

D. Eu amo. Nesta Oraçaõ o Verbo Amo
concorda com o pronome Eu em
numero, e em pessoa; em numero
186porque eu he singular, e singular
he tambem Amo. Em pessoa, porque
Amo he a primeyra pessoa, e Eu he
primeyra pessoa. Ao contrario nesta
Oraçaõ Eu amas. O Verbo naõ
concorda com o pronome, porque
Amas he segunda pessoa, e Eu primeyra.
Tambem nesta Eu amamos.
O Verbo naõ concorda com o pronome,
porque Eu he Singular, e
Amamos Plurar.

M. E que cousa he concordar o adjectivo
com o seu substantivo?

D. He estar o adjectivo no mesmo genero,
no mesmo numero, e no mesmo
caso, que o seu substantivo.

M. Dizey exemplo.

D. A Rosa murcha perde a gala. Nesta Oraçaõ
o adjectivo murcha concorda
com o substantivo Rosa, porque ambos
estão no numero singular, no genero
feminino, e no caso de nominativo.
Ao contrario nesta Oraçaõ:
A Rosa murchas perde a gala. O adjectivo
murchas naõ concorda com
o substantivo Rosa, porque Rosa està
no singular, murchas no plurar. Tambem
187nesta Oraçaõ. A Rosa murcho
perde a gala
, o adjectivo Murcho naõ
concorda com o substantivo Rosa,
porque Rosa he do genero feminino,
e Murcho he terminaçaõ masculina.

M. Qual he a Syntaxe de reger?

D. He a que ensina em que caso haõ de
estar na Oraçaõ os nomes, e em que
modos, e tempos haõ de estar os
Verbos.

M. Dizey as regras da Syntaxe de concordar.

D. Primeyra Regra. Todo o nome adjectivo
concorda com o seu substantivo
em genero, numero, e caso, ou
o substantivo venha na Oraçaõ claro,
ou este ja occulto.

M. Dizey exemplo com o substantivo
claro.

D. A faisca despresada causou o incendio.
Nesta Oraçaõ o adjectivo Despresada
concorda com o seu substantivo
Faisca em genero, porque Faisca he
feminino, e Despresada està na terminaçaõ
feminina; em numero, porque
Faisca està no singular, e no singular
està Despresada. Em caso, porque
188Faisca està em nominativo, e Despresada
tambem.

M. Dizey exemplo do substantivo escondido.

D. Pedro em breve ha de vir. Nesta Oraçaõ
o adjectivo Breve cõcorda com
seu substantivo Tempo, que está
escondido, em genero, porque Tempo
he do Genero masculino, e Breve
tambem he terminaçaõ masculina;
em numero, porque Tempo está no
singular, e Breve tambem; em caso,
porque Tempo está em ablativo, e em
ablativo está Breve.

M. E esta regra falta ás vezes?

D. Falta com os Participios algumas vezes.

M. Quando?

D. Quando vem nos tempos compostos,
como o Verbo Ter.

M. Dizey exemplo.

D. Nós temos comprado a louça. Nesta Oração
o adjectivo, e participio Comprado
naõ concorda, nem com o
substantivo, e pronome Nos, nem
com o substãtivo Louça: (que saõ os
que podem ser os seus substantivos)
189não concorda com o pronome Nós,
porque este está no Plurar, e Comprado
no Singular; naõ concorda com
Louça, porque Louça he feminino, e
Comprado está na terminação masculina.

M. E no Latim ha tambem essa irregularidade,
e modo de fallar?

D. Naõ, este modo de fallar he barbaro, e
procede da lingua Tudesca.

M. Continuay as regras da Syntaxe.

D. Segunda regra. Todas as vezes, que
os nomes substantivos, com que
concorda o adjectivo, saõ muytos,
e de diversos generos, o adjectivo,
quanto ao numero, se poem no plurar,
quanto ao genero concorda com
o mais nobre, que he o masculino.
Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. A Rosa, e o Cravo murchos perdem a gala.
Nesta Oraçaõ o adjectivo Murchos
concorda com os seus substantivos
Rosa, e Cravo: e porque saõ
muytos, està no plurar, e porque o
substanctivo Cravo he do genero
masculino, está na terminaçaõ masculina.190

D. Terceyra regra. O Verbo concorda
em numero, e em pessoa com o nome,
que lhe serve de nominativo.
Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro tem saude. Nesta Oraçaõ o Verbo
Tem concorda com seu nominativo
Pedro em numero, porque Pedro
està no singular, e o Verbo tem està
no singular; concorda em pessoa,
porque Pedro he terceyra pessoa.

D. Quarta regra. Quando os nomes, que
servem de nominativo ao Verbo, saõ
muytos, e pertencem a diversas pessoas,
o Verbo quanto ao numero vay
ao plurar, e quanto à pessoa concorda
com a mais nobre. Esta regra ha
tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Eu, e Pedro escapamos da tormenta. Nesta
Oraçaõ o Verbo Escapamos tem
dous nomes, que lhe servem de nominativos,
e significaõ diversas pessoas,
porque Eu significa primeyra
pessoa, e Pedro terceyra; e por isso
o Verbo quanto ao numero está no
plurar, e quanto à pessoa està na primeyra,
191e concorda com o pronome
Eu, que he a pessoa mais nobre.

D. Quinta regra. O Relativo O qual, a qual,
ou Que
concorda com o seu antecedente
em genero, e em numero,
mas naõ concorda em caso. Esta regra
ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Estimo estes soldados, os quaes saõ valerosos.
Nesta Oraçaõ o Relativo os
quaes
concorda com seu antecedente
Soldados em genero, porque Soldados
he masculino, e valerosos està na
terminaçaõ masculina: concorda em
numero; porque Soldados he plurar,
e plurar he tambem valerosos. Naõ
concorda em caso, porque Soldados
está em accusativo do Verbo Estimo,
e os quaes
em nominativo do Verbo
Saõ.

D. Sexta regra. Os pronomes Este, Esse, &c.
quando sómente saõ Relativos, concordaõ
com o seu antecedente em
genero, e numero, e não concordão
em caso. Esta regra ha tambem
no Latim.

M. Dizey exemplo.192

D. Pedro ama aos filhos, e estes naõ lhe correspondem.
Nesta Oração o pronome
Estes só he relativo, e concorda em
genero, e numero com o seu antecedente
Filhos, mas não concorda em
caso, porque Filhos está em accusativo
do Verbo Ama, e Estes em nominativo
do Verbo Correspondem.

M. Dissestes acima que todo o adjectivo
concordava com o seu substantivo
em genero, e numero, e caso,
os relativos saõ adjectivos, agora
dizeis que os relativos não concordaõ
com o seu substantivo em
caso: logo com que substantivo he
que concordaõ?

D. Concordão em caso com o mesmo seu
antecedente que depois do relativo
torna a vir escondido.

M. Dizey exemplo.

D. Na Oração acima Estimo estes Soldados,
os quaes saõ valerozos
. O rellativo os
quaes tem por antecedente o substantivo
Soldados, e este substantivo está
duas vezes na Oração, a primeyra
vez está claro, e está posto antes do
relativo os quaes; e segunda vez
193está escondido, e entende-se depois
do relativo os quaes desta sorte. Estimo
estes Soldados, os quaes Soldados
saõ valerozos
. Com o tal substantivo
pois escondido he que concorda
o relativo em genero, numero, e
caso; o mesmo he no Latim.

M. Tendes mais que dizer da Syntaxe de
concordar?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Capitulo II.
Da Syntaxe de reger, e das regras do Nominativo.

Mestre. Quantas castas ha de Syntaxe
de reger?

D. Duas.

M. Quaes saõ?

D. Syntaxe de reger os nomes, Syntaxe
de reger os Verbos.

M. Qual he a de reger os nomes?

D. He a que ensina as regras de saber em
que caso se haõ de pór na Oraçaõ os
nomes.194

M. E qual he a de reger os verbos?

D. A que ensina em que modos, tempos
&c. se haõ de por na Oraçaõ os
Verbos.

M. E quantas castas ha de Syntaxe de reger
os nomes?

D. Seis.

M. Quaes saõ?

D. A primeyra de reger o nominativo, a
segunda de reger o genitivo, a terceyra
de reger o dativo, a quarta o
accusativo, a quinta o vocativo, a
sexta o ablativo.

M. E qual he a Syntaxe de reger o nominativo?

D. A que ensina as regras de quando o
nome ha de estar, e por-se na Oraçaõ
em nominativo.

M. Dizey essas regras.

D. Primeyra regra. Todo o Verbo pessoal
do modo finito tem antes de si
nominativo claro, ou escondido.
Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Eu amo a Deos. Nesta Oração o Verbo
Amo tem antes de si o nominativo
Eu claro. Amo a Deos. Nesta Oração
195o Verbo Amo tem antes de si o
nominativo Eu escondido.

M. Antes do Verbo pòde succeder estarem
muytos nomes, dizey, pois, qual
he o nome, que antes do Verbo ha
de estar no nominativo?

D. O nome que fizer na Oração.

M. E qual he o nome, que faz na Oração?

D. He o que serve ao Verbo de pessoa.

M. Dizey exemplo.

D. El Rey de Portugal partio para a guerra.
Nesta Oração a palavra Rey he a que
faz na Oração, porque he a que serve
de terceyra pessoa ao Verbo Partio.
E isto he que se chama postura,
ou posição recta.

D. Segunda regra. Quando os nomes
que fazem na Oração forem muytos,
todos se hão de pôr em nominativo.
Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. O gesto, o rosto, os olhos muytas vezes enganaõ.
Nesta Oraçaõ, os nomes Gesto,
Rosto, Olhos
estaõ em nominativo,
porque todos fazem na Oraçaõ.

D. Terceyra regra. Quando na Oraçaõ
196vem dous nomes, que significaõ huma
só cousa, e hum delles faz na
Oração, o outro, que está tambem
com elle, se poem em nominativo, e
se chama nominativo de apposiçaõ.
Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. O Conde Governador o mandou. Nesta
Oraçaõ o nome Conde, e o nome Governador
significa huma só cousa,
isto he, huma só pessoa, e homem.
O nome Conde he o que faz na Oraçaõ,
e ambos estaõ em nominativo,
o nome Conde como nominativo
principal, e necessario, o nome Governador
como nominativo de apposiçaõ.

D. Quarta regra. O Infinitivo do Verbo
quando serve na Oraçaõ de nome, se
poem em nominativo. Esta regra
tambem ha no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. O mentir naõ me esta bem. Nesta Oraçaõ
o Infinitivo Mentir serve de nome,
e está em nominativo, porque
faz na Oraçaõ.

D. Quinta regra. Os Verbos, que significaõ
197uniaõ de huma cousa comsigo
mesma, assim como os Verbos Ser,
Ser feyto, Ser chamado, tem dous nominativos,
hum antes, outro depois
de si. Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. A velhice he doença. Nesta Oração o
Verbo He tem antes de si o nominativo
Velhice, e depois de si o nominativo
Doença, porque significa a
união de huma cousa comsigo mesma.
Isto he, que a Velhice he o mesmo
que a Doença.

D. Sexta regra. Os Verbos Neutros, quando
tem o mesmo modo de significar,
tambem tem dous nominativos, hũ
antes, outro depois de si. Esta regra
ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. O nosso exercito tornou vencedor. Nesta
Oraçaõ o nome Exercito, que está
antes do Verbo. Tornou, e o nome
Vencedor, que está depois, ambos estaõ
em nominativo do Verbo Tornou,
porque este significa por modo
de quem une, e faz que seja a mesma
198cousa o Vencedor, e o Exercito.

D. Setima regra. Os adverbios Eisaqui,
Eisalli, e outros semelhantes tem depois
de si nominativo. Esta regra
ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Eisaqui o ladraõ. Nesta Oração o nome
Ladraõ està em nominativo do
adverbio Eisaqui.

D. Oytava regra. Quando na Oração vem
hum, ou dous, ou mais nomes, os
quaes naõ saõ regidos, e estaõ na
Oraçaõ, como independentes do
demais sentido, se poem em nominativo
absoluto. Esta regra naõ a
ha no Latim, porque os taes nomes
vaõ a ablativo.

M. Dizey exemplos.

D. Posto eu à menza ouvi meyo dia. Nesta
Oração as palavras Posto eu, naõ saõ
regidas de ninguem, e estaõ como
independentes do demais sentido da
Oração, e por isso estaõ em nominativo,
Sendo eu menino, vi o successo.
Nesta Oração, as palavras Sendo eu
menino
, naõ saõ regidas de ninguem,
e estaõ como separadas, e sem dependencia
199das demais, e por isso estaõ
em nominativo absoluto.

M. Tendes mais que dizer da Syntaxe do
nominativo?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Capitulo III.
Da Syntaxe do Genitivo.

Mestre. Qual he a Syntaxe de reger
o Genitivo?

D. He a que ensina as regras de quando os
nomes estaõ, e se devem pôr em
Genitivo.

M. Dizey as regras do Genitivo.

D. Primeyra regra. Quando na Oraçaõ
vem dous nomes substantivos de
cousas diversas, hum depois do outro,
e hum significa como possuido,
e outro como possuidor, o segundo,
que significa como possuidor,
se poem em Genitivo. Esta regra
ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. O castigo he pena do peccado. Nesta Oração
200o substantivo Pena, e Peccado
significaõ diversas cousas, vem hum
depois do outro, o substantivo Pena
significa como cousa possuida, e o
substantivo Peccado como possuidor
da Pena, e por isso está em genitivo.

M. Tendes outra regra mais facil para
entender isso?

D. Sim; porèm naõ he taõ segura.

M. Dizey-a.

D. Primeyra regra. Quando na Oraçaõ
vem dous nomes substantivos, hum
depois do outro, e entre elles está o
artigo De, Do, Dos, Da, Das, o segundo,
sobre que cahem estas particulas,
está em genitivo, assim como
O amor de Deos, onde o nome Deos
está em genitivo.

M. E porque dizeis que esta regra naõ he
segura?

D. Porque às vezes falta, assim como quãdo
digo, Moeda de ouro, onde ouro
está em ablativo de materia.

D. Segunda regra. Muytos adjectivos,
que significaõ por modo de abundancia,
falta, ignorancia, cuydado, e
outros pedem genitivo, e regem-se
201desta sorte. Quem he abundante,
falto, ignorante, ou cuydadozo,
poem-se em nominativo; aquillo, de
que he abundante, falto, ignorante,
ou cuydadozo, poem-se em genitivo.
Esta regra tambem ha no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Campo fertil de frutos, onde frutos está
em genitivo do adjectivo Fertil, que
significa por modo de abundancia.
Necessitado de dinheyro, onde dinheyro
está em genitivo do adjectivo necessitado,
que significa por modo de falta,
&c.

M. E esse genitivo poderse-ha dizer que
he ablativo?

D. Com os demais adjectivos, que na lingua
Latina pedem igualmente genitivo,
ou ablativo, sim; com os que
na lingua Latina só pedem genitivo,
naõ.

M. Dizey exemplos.

D. Fertil de frutos. Posso dizer que Frutos
está em genitivo, ou ablativo,
porque por huma parte o artigo De
igualmente se accommoda ao genitivo,
e ao ablativo; por outra parte
202o adjectivo Fertil no Latim pede genitivo,
ou ablativo. Liberal de dinheyro,
naõ direy que dinheyro está
em ablativo, porque ainda que em
razaõ do artigo possa estar em hum,
ou outro caso, com tudo nos adjectivos,
que procedem do Latim, quando
não ha motivo para o contrario,
devemo-nos conformar com o Latim,
e o adjectivo Liberal no Latim
só pede genitivo.

M. E porque nos devemos conformar
com o Latim?

D. Porque a lingua Portugueza he filha
da Latina.

D. Terceyra regra. Os nomes numeraes
pedem depois de si genitivo do plural.
Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Os nossos mataraõ oytenta dos Turcos. Nesta
Oraçaõ o substantivo Turcos està
em genitivo depois do nome numeral
Oytenta.

M. E pòde se dizer que o nome Turcos
està em ablativo da preposiçaõ Dos?

D. Sim, porque no Latim os numeraes
203admittem tambem ablativo com semelhante
preposição.

M. E pode-se esse genitivo, ou ablativo
mudar em outro caso?

D. Pode-se mudar algumas vezes em accusativo
do plurar com a preposiçaõ
Entre.

M. Dizey exemplo.

D. Morreraõ oytenta entre os Turcos.

M. Esse caso do nome numeral pòde-se
pòr de outra sorte?

D. Pòde se concordar com o nome numeral,
como com nome adjectivo, e
ficar no caso, em que o numeral estiver;
o mesmo he no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Os nossos mataraõ oytenta Turcos. Onde
Turcos está concordando com o nome
numeral Oytenta, e servindo de
accusativo ao Verbo Mataraõ.

D. Quarta regra. Os nomes partitivos pedem
depois de si genitivo do plurar.
Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Nenhuma das feras he mais prudente, que
o Elefante
. Nesta Oraçaõ o partitivo
Nenhuma tem depois de si o genitivo
204do plurar das feras.

M. Esse genitivo pode-se mudar em outro
caso?

D. Este genitivo pòde se dizer que he
ablativo, porque no Latim os partitivos
admittem ablativo com semelhante
preposiçaõ. Tambem se
pode mudar em accusativo do plurar
com a preposiçaõ Entre, assim
como: Entre as feras nenhuma ha
mais prudente de q o Elefante
. O mesmo
admittem o Latim. Tambem se
póde concordar com o Partitivo em
caso, assim como Nenhuma fera he
mais prudente
, &c.

D. Quinta regra. Os Comparativos, quando
na Oraçaõ vem como Partitivos
pedem genitivo. Esta regra ha tambem
no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. O melhor Pregador dos Portuguezes foy
o Padre Antonio Vieyra
. Nesta Oração
o Comparativo Melhor vem como
Partitivo, e tem o genitivo dos
Portuguezes
. Este genitivo se pòde
dizer que he ablativo da preposição
Dos, e se pode mudar em accusativo
205com a preposiçaõ Entre, e o mesmo
se pratica no Latim.

D. Sexta regra. Quando os adjectivos
tem força de Partitivos, tambem admittem
genitivo do plurar dos seus
substantivos, mas entaõ o tal substãtivo
ha-se de pòr antes do seu adjectivo.
No Latim pode-se pòr, ou
antes, ou depois.

M. Dizey exemplo.

D. Das lans as negras naõ recebem cor. Nesta
Oração o substantivo Lans está
em genitivo antes do seu adjectivo
Negras, que tem forsa de Partitivo.
Este ablativo se pòde dizer que he
ablativo cõ a preposiçaõ Das. Tambem
se pòde mudar em accusativo
com a preposição Entre, e tambem
se pode concordar com o seu adjectivo
em genero, numero, e caso. O
mesmo tudo se pratica no Latim.

M. E se o tal substantivo se puzer depois
do seu adjectivo?

D. Entaõ na lingua Portugueza por força
ha de estar no caso, em que estiver
o seu adjectivo, assim como: Os
antigos Portuguezes eraõ muyto regulados
.206

D. Setima regra. Os Superlativos na lingua
Portugueza naõ querem genitivo,
mas querem accusativo com a
preposiçaõ Entre, como diremos
adiante. No Latim querem tambem
genitivo.

M. Dizey exemplo.

D. Nuno Alvares foy Capitaõ valerosissimo
entre os Portuguezes
. Onde o nome
Portuguezes està em accusativo com
a preposiçaõ Entre depois do Superlativo
Valerosissimo.

D. Oytava regra. O Verbo Ser quando
val o mesmo, que possuir, pede genitivo.
Rege-se desta sorte: a cousa
possuida he o nominativo, o possuidor
genitivo. Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Este livro he de Pedro. Nesta Oraçaõ
o Verbo He significa possuir, e o nome
Livro, que he a cousa possuida,
está em nominativo, e o nome de
Pedro, que he o possuidor, em genitivo.

D. Nona regra. O Verbo Ser, quando
val o mesmo, que o Verbo Pertencer,
207pede genitivo; quem pertence he
nominativo, a quem pertence genitivo.

M. Dizey exemplo.

D. He dos moços respeytar aos velhos. Nesta
Oraçaõ o Verbo He significa Pertencer,
e tem depois de si genitivo dos
moços
, que he a quem pertence.

D. Decima regra. O Verbo Ser quãdo significar
Causar, pede genitivo; quem
causa he nominativo, o que causa he
genitivo, a quem o causa he dativo.
No Latim naõ pede genitivo.

M. Dizey exemplo.

D. A chuva foy de proveyto aos campos. Nesta
Oraçaõ o Verbo Foy significa Causar,
e tem depois de si o genitivo de
proveyto
, que he o que causa a Chuva.

D. Undecima regra. Os Verbos de esquecerse,
lembrarse, alegrarse, entristecerse,
e outros, quando naõ saõ
activos, pedem depois de si genitivo:
quem se lembra, esquece, &c. poem-se
em nominativo, aquillo de que
se esquece, lembra, &c. poem-se em
genitivo. Esta regra ha tambem no
Latim.208

M. Dizey exemplo.

D. Lembrome dos meus males. Nesta Oração
o Verbo Lembrome naõ he activo,
e tem depois de si o genitivo Dos
meus males
, que he o do que me lembro.

M. E estes Verbos podem ser activos?

D. Alguns sim, assim como Lembrar, Allegrar,
e outros, porque se diz O Sol
alegra os campos
. Lembrey a ElRey os
meus serviços
, e nestas oraçoens saõ
activos.

D. Duodecima regra. Os Verbos de admoestar
alèm do seu accusativo de
Verbos activos, pedem genitivo;
quem admoesta poem-se em nominativo
a quem admoesta em accusativo,
a cousa de que admoesta, em
genitivo. Esta regra ha tambem no
Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Admoestey aos Religiozos da sua obrigaçaõ.
Nesta Oraçaõ o Verbo Admoestey
tem depois de si o genitivo Da
sua obrigaçaõ
, que he a cousa, de que
Admoestey. Este genitivo se pòde
dizer, que he ablativo com preposiçaõ
209Da, porque no Latim estes Verbos
admittem ablativo com semelhante
preposiçaõ.

D. Decima terceyra regra. Os Verbos de
accusar, e absolver alèm do seu accusativo
de Verbos activos, pedem
genitivo do crime, de que accuso,
ou da pena, de que absolvo. Esta
regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Absolvi a Pedro da pena, em que encorreo.
Nesta Oraçaõ o Verbo Absolvi
alèm do seu accusativo, tem depois
de si o genitivo Pena, que he de que
o absolvi. Este genitivo se pòde dizer
he ablativo, porque no Latim
estes Verbos admittem ablativo com
semelhante preposiçaõ.

D. Decima quarta regra. Alguns adverbios
muytas vezes pedem depois de
si genitivo. Esta regra ha tambem
no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Tive Assaz de trabalho. Nesta Oraçaõ
o nome Trabalho está em genitivo
do adverbio assaz.

D. Decima quinta regra. O Verbo no
210Infinitivo muytas vezes serve de genitivo,
assim como He tempo de cear.
Onde o Verbo de cear, que està no
Infinitivo, serve de genitivo e val o
mesmo que He tempo de cea.

D. Decima sexta regra. Quando depois
de hum nome substantivo, que està
em genitivo sem interposiçaõ nenhuma,
se segue outro substantivo,
que significa, e pertence á mesma
cousa, o tal segundo substantivo
está em genitivo, e se chama genitivo
de apposiçaõ. Esta regra ha
tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Este livro he de Pedro bom Estudante.
Nesta Oraçaõ o nome Estudante està
depois do substantivo, e genitivo de
Pedro
, significa ao mesmo Pedro, e
por isso està em genitivo de apposiçaõ.

M. Tendes mais que dizer da Syntaxe do
genitivo?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.211

Capitulo IV.
Da Syntaxe, e regras do Dativo.

Mestre. Qual he a Syntaxe do Dativo?

D. He a que ensina as regras de quando
os nomes estaõ, e se haõ de pòr no
caso do Dativo.

M. Dizey essas regras.

D. Primeyra regra. Aquillo, que he como
fim, e termo, para que diz ordem, a
significação do adjectivo, ou Verbo,
se poem em Dativo. Esta regra ha
tambem no Latim.

M. Dizey exemplos.

D. Lisboa esta visinha ao Mar. Nesta Oração
o nome Mar, está em Dativo,
porque he o fim, e termo, a que diz
ordem o adjectivo Visinho. Demos
graças a Deos
. Nesta Oração o nome
Deos está em Dativo, porque he o
termo, e fim a que diz ordem o Verbo
Dar.

M. Esse Dativo pode-se mudar em outro
caso?212

D. Com alguns nomes, e Verbos pode-se
mudar em accusativo com a preposiçaõ
Para. O mesmo ha no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. A paz he util a todos, ou para todos. Nesta
Oraçaõ o nome Todos he o termo,
e fim do adjectivo Util; e o tal nome
Todos pode estar, ou em dativo, ou
em accusativo com a preposiçaõ Para.

M. E quaes saõ esses nomes, e Verbos,
que podem ter hum, ou outro caso?

D. Isso com o uso se aprende.

D. Segunda regra. Muytos adjectivos,
que significaõ por modo de perda,
ou proveyto, graça, ou desgraça,
favor, ou desfavor, fidelidade, ou
infidelidade, pedem dativo depois
de si, e regem-se desta sorte, aquillo,
que he danoso, ou proveytoso,
&c. poem-se em nominativo, a
quem he danoso, proveytoso,
&c. poem-se em dativo. Esta regra
he filha da primeira, e tambem a ha
no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. O Prégador foy molesto aos ouvintes. Nesta
213Oraçaõ o adjectivo Molesto, que
significa por modo de cousa danosa,
tem depois de si o dativo Aos ouvintes,
que he a quem he danoso.

M. E alguns adjectivos desses podem ter
outro caso?

D. Sim, assim como: Contrario a todos, ou
de todos
, e outros muytos.

M. E como se sabe quaes saõ esses adjectivos?

D. Pelo uso.

D. Terceyra regra. Os Verbos Neutros
muytos pedem dativo, assim como,
Gritar, Argumentar, Pelejar, &c.

M. Dizey exemplo.

D. Gritey aos Soldados, porque fugiaõ.

M. E como se conhece, quando querem
dativo?

D. Quando o nome, a que dizem ordem,
tem antes de si o artigo ao, a, aos, as,
os, assim como, Gritey aos Soldados.

M. Esse caso pòde-se mudar?

D. Algũs Verbos o podem mudar em ablativo
com preposição, assim como Peleyjey
com os Soldados, porque fugiaõ
.

D. Quarta regra. Os Verbos de declarar,
prometter, dar, restituir, ajuntar,
214mandar, e entregar, e outros, que
com o uso se aprendem, alèm do accusativo
de Verbos activos, pedem
dativo, daquella pessoa, ou cousa,
para que a acção do Verbo diz ordem,
e regem-se desta sorte. Quem
declara, promette, &c. poem-se em
nominativo; aquillo, que promette,
declara, &c. poem-se em accusativo;
a pessoa, ou cousa a quem o declara,
promette, &c. poem-se em dativo.
Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Entreguey as cartas a Pedro. Nesta Oração
o nome Pedro está em dativo do
Verbo Entreguey, porque he o nome,
a quem diz ultimamente ordem a
acçaõ do Verbo Entreguey, e he a
pessoa, a quem se entregou.

D. Quinta regra. Alguns dos Verbos acima
ditos em lugar do dativo pòdem
ter accusativo com a preposiçaõ
Para, assim como Trago as cartas
a El Rey, ou para El Rey
. Isto succede
tambem no Latim.

M. E quaes saõ esses Verbos?215

D. Sabem-se com o uso.

D. Sexta regra. O Verbo Ser quando significa
Causar, pede dativo. Rege-se
desta sorte. Quem causa he nominativo,
o que causa genitivo, a quem
o causa dativo. No Latim pede dous
dativos.

M. Dizey exemplo.

D. A chuva foy de proveyto aos campos. Nesta
Oração o Verbo Foy val o mesmo
que Causou, e o nome Campos, que he
a quem causou, está em dativo.

D. Setima regra. O Infinitivo do Verbo
às vezes serve de dativo; assim como
Estive attento ao ler da sentença, onde
o Infinitivo Ler serve de dativo ao
adjectivo Attento, e val o mesmo
que Estive attento à liçaõ da sentença.

D. Oytava regra. Quando na Oraçaõ depois
de hum substantivo, que està em dativo,
vem outro apoz elle, que significa
a mesma cousa, o segundo està
tambem em dativo; e se chama
dativo de apposiçaõ. Esta regra ha
tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Entreguey as cartas ao Conde Governador.
216Nesta Oraçaõ o substantivo Governador
destà depois do substantivo, e
dativo Conde, significa a mesma cousa,
e por isso esta em dativo de apposiçaõ.

M. Tendes mais que dizer da Syntaxe de
dativo?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Capitulo V.
Da Syntaxe do Accusativo, e das suas regras.

Mestre. Qual he a Syntaxe do Accusativo?

D. He a que ensina as regras de quando os
nomes estaõ; e se haõ de pór em Accusativo.

M. Dizey essas regras.

D. Primeyra regra. Todo o Verbo activo
pede depois de si accusativo. Esta
regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Amo a Pedro. Nesta Oraçaõ o nome
Pedro està em accusativo do Verbo
Amo.217

M. E qual ha de ser o nome, que ha de
servir de accusativo ao Verbo activo?

D. O substantivo, sobre que cahir a acçaõ
do Verbo.

M. Dizey exemplo.

D. Entreguey as cartas a Pedro. Nesta Oraçaõ
o nome Cartas serve de accusativo
ao Verbo Entreguey, porque
a acçaõ do Verbo Entreguey cahe sobre
o nome Cartas.

D. Segunda regra. Os Verbos Neutros,
quando significaõ como activos pedem
accusativo. Esta regra ha tambem
no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Vivo vida ditosa. Nesta Oraçaõ o Verbo
Neutro Vivo rege o nome Vida,
que nasce do mesmo Verbo Vivo.
Andey o caminho. Nesta Oraçaõ o
Verbo Neutro Andar rege o nome
substantivo Caminho, cuja significaçaõ
tem parentesco com a do Verbo
Andar.

D. Terceyra regra. O Verbo no Infinitivo
às vezes serve de accusativo,
assim como Procuro cear, onde o
218Infinitivo Cear serve de accusativo ao
Verbo Procuro. Esta regra ha tambem
no Latim.

D. Quarta regra. As Preposiçoens Conforme,
Contra, Entre, Junto, Por, Para,
Segundo pedem depois de si accusativo,
assim como Entre os Portuguezes,
Junto à fonte, Por terra
. Esta regra
ha tambem no Latim.

A preposiçaõ A pede depois de si accusativo,
segundo dissemos, quando
tratàmos das preposiçoens, assim
como Vay a Roma. Esta preposiçaõ
A se pode muytas vezes equivocar
com o artigo, assim como Veste ao
modo de França
, onde A he preposiçaõ,
e naõ artigo.

A causa, o instrumento, o modo
muytas vezes se poem em accusativo
com preposiçaõ A, assim como
Morto à sede, Jugar aos dados, Andar
a bom passo
.

M. E estes accusativos podem-se mudar
em outro caso?

D. Alguns se podem mudar em ablativo
com outra preposiçaõ, assim como
Morto de fome. No Latim a causa, o
219instrumento, o modo, poem-se em
ablativo.

D. Quinta regra. Quando na Oraçaõ vem
os nomes de lugar de sorte, que correspondem
a pergunta Para onde?
os taes nomes se poem em accusativo
com a preposiçaõ Para.

M. Dizey exemplo.

D. Vay para a Igreja. Nesta Oraçaõ o nome
Igreja, està em accusativo com
a preposiçaõ Para, porque vem na
Oraçaõ correspondendo à pergunta
Para onde.

D. Sexta regra. Quando vem os nomes
de lugar correspondendo à pergunta
Por onde, se poem em accusativo
com a preposiçaõ Por. Esta regra ha
tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Passou por Coimbra. Nesta Oraçaõ o nome
Coimbra està em accusativo com
a preposiçaõ Por, porque vem na
Oraçaõ correspondendo à pergunta
Por onde?

M. Quaes saõ os nomes de lugar?

D. Os que significaõ alguma cousa, aonde
se pode estar, assim como Terra,
220Campo, Villa, Cidade, &c.

D. Setima regra. O espaço de tempo, que
corresponde à pergunta Por quanto
tempo
, se poem na Oração em accusativo
com a preposiçaõ Por clara,
ou escondida. Esta regra ha tambem
no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Viveo por seis mezes, ou Viveo seis mezes.
Nesta Oraçaõ os nomes Seis
mezes
; que significaõ o espaço do
tempo, estaõ em accusativo com a
preposiçaõ Por.

D. Oytava regra. Os nomes de tempo,
quando vem na Oraçaõ correspondendo
à pergunta Quando, ou Em
que tempo
, algumas vezes se poem
em accusativo.

M. Dizey exemplo.

D. Aos dez dias de Mayo succedeo a ruina.
Nesta Oração os nomes Aos dez dias
estaõ em accusativo da preposiçaõ
A. Note-se que o A aqui he preposiçaõ.

M. Quaes saõ os nomes de tempo?

D. Os que significaõ o tempo, assim
como Hora, Dia, Mez, &c.221

D. Nona regra. O espaço, ou distancia
do lugar, poem-se na Oraçaõ em accusativo,
com a preposiçaõ Por clara,
ou escondida. Esta regra quasi
a ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. A minha quinta dista do Mar por huma
legoa
, ou dista do Mar huma legoa.
Nesta Oraçaõ o nome Legoa esta
em accusativo com a preposiçaõ
Por clara, ou escondida, porque he
o espaço que dista.

D. Decima regra. O preço muitas vezes
se poem em accusativo com a preposiçaõ
Por clara, ou escondida. No
Latim naõ.

M. Dizey exemplo.

D. Comprey hum escravo por cem mil reis,
ou custoume o escravo cem mil reis
.
Nestas Oraçoens o preço está em accuzativo
com a preposiçaõ Por, ou
clara, ou escondida.

M. Esta preposiçaõ que está escondida
pòde-se pòr clara?

D. Sempre naõ.

M. Dizey exemplo.

D. Custou-me hum escravo cem mil reis. Nesta
222Oraçaõ a preposiçaõ Por está escondida,
e seria erro polla clara, dizendo
Custoume hum escravo por cem
mil reis
. Isto succede muytas vezes
na lingua Portugueza em que se devem
entender as preposiçoens, e naõ
se podem por claras.

D. Undecima regra. Os Verbos passivos
depois de si pedem accusativo com a
preposiçaõ Por. Esta regra ha tambem
no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Sou chamado por El Rey. Nesta Oraçaõ
o nome El Rey està em accusativo
com a preposiçaõ Por depois do
Verbo passivo Ser chamado.

D. Duodecima regra. Quando na Oraçaõ
vem hum substantivo depois de
outro, que està em accusativo, ambos
significaõ a mesma cousa, o segundo
se poem em accusativo, e se
chama accusativo de apposiçaõ. Esta
regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Amo a Pedro Estudante. Nesta Oraçaõ
o nome Estudante vem depois do accusativo
Pedro, significa o nome Pedro,
223e está em accusativo de apposiçaõ.

O Vocativo só se usa delle por modo
de chamar, como Ó Pedro. O mesmo
he no Latim.

Capitulo VI.
Da Syntaxe do Ablativo, e suas regras.

Mestre. Qual he a Syntaxe do Ablativo?

D. He a que ensina as regras de quando
os nomes estaõ, e se haõ de por em
Ablativo.

M. Dizey essas regras.

D. Primeyra regra. Todo o Ablativo he
regido de preposiçaõ clara, ou escondida.
Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Nesta tarde vou para a Quinta. Nesta
Oraçaõ os nomes Esta tarde estaõ em
ablativo da preposiçaõ Em clara trocada
na letra N. Esta tarde vou
para a Quinta
. Nesta Oraçaõ os nomes
224Esta tarde estaõ em ablativo da
preposiçaõ Em, que de todo està
escondida, e se entende.

D. Segunda regra. A causa, o instrumento,
a parte, o modo comummente
se poem em ablativo com alguma
preposiçaõ. No Latim quasi he o
mesmo.

M. Dizey exemplos.

D. Cahio com medo. Ferido da espada. Tremulo
das maõs. Anda de vagar com
medo
he ablativo de causa. Da espada
de instrumento, Das mãos, de parte,
De vagar, de modo.

M. E algumas vezes poem-se a causa, o
instrumento, o modo em outro caso?

D. Sim, como jà dissemos no Capitulo do
accusativo, o que se sabe com o uso.

D. Terceyra regra. Os nomes numeraes,
partitivos, e superlativos admittem
ablativo do plurar como jà dissemos
no Capitulos dos Genitivos.

D. Quarta regra. Muytos adjectivos,
que significaõ abundancia, privaçaõ,
diversidade, e outros pedem ablativo,
segundo dissemos no Capitulo dos Genitivos.225

D. Quinta regra. Os Verbos Neutros
pela mayor parte pedem ablativo
com alguma preposiçaõ, assim como:
Desfalecer de forças. Confiar da virtude.
Tresbordar em sangue. Viver com
gosto
. No Latim muytos querem ablativo,
muytos dativo.

D. Sexta regra. Alguns Verbos admittem
ablativo, ou accusativo depois
de si, assim como Gozar, usar, e outros.
O mesmo he no Latim.

M. Dizey exemplos.

D. Gozo do Imperio, ou Gozo o Imperio, Uso
os vestidos
, ou Uso dos vestidos.

M. E esses Verbos quando regem ablativo
saõ activos?

D. Naõ, entaõ saõ neutros, porque a acçaõ
do Verbo naõ cahe no substantivo.

M. E quando tem accusativo?

D. Entaõ saõ activos, porque a acçaõ do
Verbo cahe no substantivo.

D. Setima regra. Os Verbos de encher,
carregar, descarregar, livrar, prender,
e outros alèm do seu accusativo,
pedem ablativo, e regem-se
desta sorte. Quem enche, carrega
226&c. poem-se em nominativo, a quem
enche, carrega, &c. em accusativo;
à cousa, de que enche, carrega, &c.
em ablativo com preposiçaõ. No Latim
tambem, mas sem preposiçaõ
commummente.

M. Dizey exemplo.

D. Enchi a quartã de agua. Nesta Oraçaõ
o nome Agua està em ablativo, porque
he a cousa, de que enche.
Muytos querem que estes ablativos,
e os dos adjectivos sejaõ ablativos,
ou de causa, ou de instrumento, ou
de modo, ou de materia.

D. Oytava regra. Os Verbos passivos ordinariamente
em lugar do accusativo
com a preposiçaõ Por admittem
ablativo com a preposiçaõ De. No
Latim quasi he o mesmo.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro he amado de mim. Nesta Oraçaõ
o pronome Mim está em ablativo
com a preposiçaõ do Verbo passivo
He amado, podera ser accusativo com
a preposiçaõ Por. Pedro he amado por
mim
.

D. Nona regra. Quando na Oraçaõ vem
227os nomes correspondendo à pergunta
Em que parte? se poem em
ablativo com a preposiçaõ Em. E
esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Naci em Lisboa. Nesta Oração o nome
Lisboa está em ablativo com a
preposiçaõ Em, porque vem na Oraçaõ
correspondendo à pergunta Em
que parte
?

D. Decima regra. Quando na Oraçaõ os
nomes de lugar vem correspondendo
à pergunta De que parte? poem-se
em ablativo cõ a preposiçaõ De.

M. Dizey exemplo.

D. Venho de casa. Nesta Oraçaõ o nome
De casa está em ablativo com a preposiçaõ
De, porque vem na Oração
correspondendo à pergunta De que
parte
?

D. Undecima regra. O espaço do tempo,
quando vem na Oração correspondendo
à pergunta Em quanto tempo,
se poem em ablativo com a preposição
Em.

M. Dizey exemplo.

D. Compuz este livro em tres mezes. Nesta
228Oraçaõ os nomes Tres mezes estaõ
em ablativo com a preposiçaõ Em,
porque vem na Oraçaõ correspondendo
à pergunta Em quanto tempo?

D. Duodecima regra. O Verbo no Infinitivo
muytas vezes serve de ablativo,
assim como Com pelejar se desfaz
a contenda
, onde o Infinitivo Pelejar
serve de ablativo à preposiçaõ Com.

D. Decima terceyra regra. Os nomes de
tempo, quando vem na Oração correspondendo
a pergunta Quando, ou
em que tempo, pela mayor parte se
poem em ablativo com a preposição
Em. Esta regra quasi a ha tambem
no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. No Veraõ se padece calma. Nesta Oração
o nome Veraõ está em ablativo
com a preposiçaõ Em, porque vem
na Oraçaõ correspondendo à pergunta
Quando?

D. Decima quarta regra. A medida se
poem em ablativo com a preposiçaõ
De clara, ou escondida. No Latim se
poem em ablativo sem preposiçaõ.

M. Dizey exemplo.229

D. Esta trave he mais grossa, que a outra
hum palmo
. Nesta Oraçaõ os nomes
Hum palmo estáem ablativo com
a preposiçaõ De escondida, e significa
a medida. Tambem se póde dizer
que estaõ em accusativo da preposiçaõ
Por escondida, entendendo-se
assim. Esta trave he mais grossa, que
a outra hum por palmo
.

D. Decima quinta regra. O preço se
poem muytas vezes em ablativo
com a preposiçaõ Em. No Latim
sem preposiçaõ.

M. Dizey exemplo.

D. Tayxaõ este livro em dous tostoens. Nesta
Oraçaõ os nomes Dous tostoens, que
significaõ preço, estaõ em ablativo
com a preposiçaõ Em.

D. Decima sexta regra. Quando depois de
hum substantivo, que está em ablativo,
vem logo outro, que pertence á
mesma cousa, se poem em ablativo
e se chama ablativo de apposiçaõ.
Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplos.

D. Fuy com Pedro Soldado. Nesta Oraçaõ
o nome Soldado vem depois do substantivo
230e ablativo Pedro, significa
ao mesmo Pedro, e está em ablativo
de apposiçaõ.

M. E os comparativos, quando saõ partitivos,
que caso pedem na lingua
Portugueza?

D. Póde-se dizer que pedem ablativo com
a preposiçaõ Que, tomando esta palavra
Que por preposiçaõ, ou se póde
dizer, que naõ pedem caso.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro he mais douto, que seu irmaõ. Nesta
Oraçaõ se tomarmos a particula
Que como preposiçaõ, diremos estar
em ablativo os nomes Seu irmaõ.
Porem naõ a tomando como preposiçaõ,
diremos que o comparativo
naõ pede caso, e que os nomes Seu
irmaõ
estaõ em nominativo do Verbo
He, que se torna a entender desta
sorte: Pedro he mais douto, do que he
seu irmaõ
.

M. E os adverbios, que se compoem de
nome, e artigo, assim como, De força,
De noyte, Ás claras, &c. em
que caso estão?

D. Os que se compoem de nome, e preposiçaõ
231De, assim como De força, estaõ
em ablativo. Os que se compoem
de artigo sómente, como Ás claras,
podemos dizer estaõ em accusativo
de alguma preposiçaõ escondida, ou
em ablativo, assim como Ás claras
pòde-se dizer esta em accusativo, entẽdendo-se
a preposiçaõ Pelas claras;
pois dizemos Pela mansa em lugar
de Mansamente. Ou se pòde dizer
estar em ablativo da preposiçaõ Em,
que se lhe entende, pois dizemos
Em vaõ em lugar Vãamente.

M. E quando na Oração vem alguns nomes,
que parece se naõ pòdem accõmodar
as regras de nenhum caso?

D. Entaõ deve-se entender alguma preposiçaõ
mediante, a qual fique neste,
ou naquelle caso, ainda que seja erro
polla clara.

M. Dizey exemplo.

D. A ferida està correndo sangue. Nesta Oraçaõ
o nome Sangue naõ apparece
o caso, em que esteja, mas na verdade
està em ablativo da preposiçaõ
Em, que se lhe entende, e naõ está
clara; mas está clara, quando se
232usa do cõposto Escorrer Os vestidos ainda
estaõ escorrendo em agua
.

M. Tendes mais que dizer da Syntaxe de
reger os casos?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Capitulo VII.
Da Syntaxe dos Verbos.

Mestre. Qual he a Syntaxe dos Verbos?

D. He a que ensina as regras, modos,
tempos, numeros, e pessoas, em
que estão, e se devem por os Verbos.

M. Dizey essas regras.

D. O que pertence a pessoas, numeros,
e tempos nas Linguagens, e Capitulo
dos Verbos fica dito, e tambem
o que pertence ao modo Indicativo,
assim direy sò o que pertence ao
subjunctivo, e Infinitivo.

D. Primeyra regra. A conjunçaõ Para
que
commummente leva o Verbo ao
subjunctivo. Esta regra ha tambem
233no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Sirvo a Pedro para, que me pague. Nesta
Oraçaõ o Verbo Pague està no subjunctivo,
porque tem antes a conjunçaõ
Para que.

D. Segunda regra. As conjunçoens, e adverbios
Antes que, Primeyro que sempre
levaõ o Verbo ao subjunctivo. No
Latim tambem levaõ o Verbo ao
subjunctivo.

M. Dizey exemplo.

D. Antes que estude reso. Nesta Oraçaõ
o Verbo Estude està no subjunctivo,
porque tem antes de si o adverbio, e
conjunçaõ Antes que.

D. Terceyra regra. As conjunçoens, Posto
que
, Ainda que, Atè que, Quando,
Como quer que, e outras muytas levão
o Verbo ao subjunctivo, ou ao Indicativo.
A mesma regra ha no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Ainda que ame a meu filho, castigo-o, ou
Ainda que amo a meu filho, castigo-o
. Nestas
Oraçoens o Verbo Ame està no
subjunctivo, e o Verbo Amo no Indicativo,
porque tem antes de si a conjunçaõ,
234Ainda que.

D. Quarta regra. O Verbo no Infinitivo
sempre he regido de outro Verbo,
que està antes. Esta regra ha tambem
no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Naõ posso correr, Nesta Oração o Infinitivo
Correr he regido do Verbo
Posso, que està antes.

D. Quinta regra. Se o Infinitivo faz na
Oraçaõ, e serve de nominativo, naõ
he regido de outro Verbo antecedente.
Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. O viver bem a todos aproveyta. Nesta
Oraçaõ o Infinitivo Viver naõ he
regido de outro Verbo antecedente,
porque faz na Oraçaõ, e serve de
nominativo.

D. Sexta regra. O Verbo no Infinitivo
muitas vezes val o mesmo, que o Verbo
no Indicativo cõ a Conjunçaõ Que.
Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Vejo arder o monte. Esta Oraçaõ val
o mesmo, que estoutra. Vejo que
235arde o monte
.

D. Setima regra. O Infinitivo muytas
vezes val o mesmo que o Verbo no
Indicativo com o relativo Qual, ou
Que. Esta regra ha tambem no Latim.

M. Dizey exemplo.

D. Ouço tanger os sinos. Esta Oraçaõ val o
mesmo que esta, Ouço os sinos, os
quaes tangem, ou que tangem
.

D. Oytava regra. O Verbo no Infinitivo
muytas vezes val o mesmo, que o
Verbo no subjunctivo com a Conjunçaõ
Que.

M. Dizey exemplo.

D. Mandey aos Soldados vigiar. Esta Oraçaõ
val o mesmo, que estoutra.
Mandey aos Soldados que vigiassem.

M. Tendes mais que dizer da Syntaxe dos
Verbos?

D. Mais ha, que dizer, mas isto basta.236

Capitulo VIII.
Do resolver das Oraçoens.

Mestre. Que cousa he resolver huma
Oraçaõ?

D. He fazer a Oraçaõ por outras palavras,
que valem o mesmo, e o dizem
mais claramente.

M. E as Oraçoens feytas pelo Verbo activo,
podem se resolver pelo passivo.

D. Sim.

M. Dizey de que sorte.

D. Attenta-se na Oraçaõ activa para o nominativo,
para o Verbo, e para o
seu accusativo, e entaõ o accusativo
muda-se em nominativo, e o Verbo
muda-se para passivo. Quanto ao modo,
e tempo, fica no mesmo: quanto
ao numero, e á pessoa, concorda
com o seu nominativo, que tem na
passiva; e o que era nominativo na
voz activa, passa para ablativo com
a preposiçaõ De, ou para accusativo
com a preposiçaõ Por.

M. Dizey exemplo.237

D. Pedro ama as virtudes. Esta Oraçaõ
está feyta pelo verbo activo Amo, e
resolve-se pelo Verbo passivo Ser
amado
nesta forma. As virtudes saõ
amadas por Pedro
o nome Virtudes,
que na Oraçaõ activa era accusativo
do Verbo, na passiva fica nominativo.
O Verbo Amar, que na activa
estava no modo Indicativo, no tempo
Prezente, no numero singular,
na terceyra pessoa, na passiva fica no
mesmo modo, no mesmo tempo,
muda porem o numero, porque o
nominativo da passiva he plurar, e
o da activa he singular; a pessoa he
a mesma, porque hum, e outro nominativo
saõ terceyras pessoas na
activa Pedro, na passiva, as Virtudes,
e finalmente o nome Pedro que na
activa estava em nominativo, na
passiva passa para ablativo com a
preposiçaõ De, ou accusativo com a
preposiçaõ Por.

M. E se na Oraçaõ alem dos casos dittos
vierem outros?

D. Tudo o mais fica da mesma sorte, que
estava na activa.238

M. Dizey exemplo.

D. Pedro com grande fervor imita as virtudes
dos Santos
. Esta Oraçaõ se muda na
passiva desta sorte. As virtudes dos
Santos saõ imitadas por Pedro com
grande fervor
. Onde só se muda o
accusativo do Verbo, o Verbo, e o
nominativo, e tudo o mais fica como
estava na activa. O mesmo he
no Latim.

M. Tendes mais, que dizer do resolver
das Oraçoens?

D. Sim, e he que para os meninos aprenderem
bem, e se facilitarem para o
Latim, se lhes façaõ resolver as Oraçoens
de humas palavras Portuguezas
para outras, que venhaõ a dizer
o mesmo, e tenhaõ alguma correspondencia
com a Grammatica Latina.

M. Dizey exemplo.

D. Esta Oraçaõ v. g. Os Christãos vencèraõ
os Turcos
. Mandar-selhe-ha fazer
pelo Verbo, e palavras Ficar debayxo
desta sorte. Os Turcos ficáraõ
debayxo dos Christãos
. Estoutra Pedro
ama as letras
mande-selhe fazer
239pelo Verbo Ser tido, e a palavra
Amor desta sorte. O amor das letras
he tido por Pedro
. Ou pela palavra
Amavel desta sorte. As letras saõ
amaveis a Pedro
.

M. Tendes mais que dizer da Syntaxe
simples?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.240

Terceyra parte.

Capitulo I.
Da Syntaxe figurada, e da primeyra figura.

Mestre. Que he cousa Syntaxe
figurada?

D. Saõ as regras de dispor
bem as palavras fora da
ordem natural, e por figuras.

M. Que cousa he figura?

D. He o modo de fallar contra as regras
da Syntaxe simples, porèm admittido
do uso.

M. Dizey exemplo.

D. O Turco arma. Nesta Oraçaõ o Verbo
activo Arma naõ tem accusativo,
contra as regras da Syntaxe simples,
241e assim ha figura na tal Oraçaõ, e lhe
faltaõ as palavras A sua gente.

M. E quantas figuras ha na Syntaxe?

D. Muytas, mas todas se reduzem a quatro,
ou cinco.

M. Quaes saõ?

D. Ellipse, que quer dizer falta. Pleonasmo,
que quer dizer superfluidade.
Sillepse, que quer dizer pensamento;
Hiperbaton, que quer dizer perturbaçaõ.
Idiotismo, que quer dizer propriedade.

M. Que cousa he Ellipse?

D. He a falta de alguma palavra na Oraçaõ.

M. Quantas castas ha de Ellipse.

D. Duas. Ellipse pura, Ellipse não pura,
que se chama Zeugma.

M. E quando ha Ellipse pura?

D. Quando alguma palavra falta totalmente
na Oração.

M. Dizey exemplo.

D. Recebia de um. Nesta Oração falta totalmente
a palavra Carta, e por isso
ha Ellipse pura.

M. E qual he a Ellipse Zeugma?

D. He quando alguma palavra falta, e
242vem na Oraçaõ.

M. Dizey exemplos.

D. Amo a Pedro, e naõ a Francisco. Nesta
Oração a palavra Amo vem na Oraçaõ,
e falta, porque devia vir duas vezes,
e dizer Amo a Pedro, e naõ amo a
Francisco
.

M. Dizey as regras da Ellipse pura.

D. Primeyra regra. Todas as vezes, que
ha caso de apposiçaõ, ha Ellipse do
Verbo Ser, e do relativo Qual, ou
Que.

M. Porque?

D. Porque o caso de apposiçaõ necessariamente
diz uniaõ, e esta se declara
pelo Verbo Ser.

M. Dizey exemplos.

D. O Conde Governador o mandou. Nesta
Oração faltaõ as palavras Que he, as
quaes unem o nome Governador, caso
de apposiçaõ, com o nome Conde
desta sorte. O Conde, que he Governador,
o mandou
. Na mesma fórma
Este livro he de Pedro Estudante. Esse
livro he de Pedro, que he Estudante
.
O mesmo he no Latim.

D. Segunda regra. Todas as vezes que o
243Verbo no modo finito naõ tem nominativo,
ha Ellipse.

M. Porque?

D. Porque todo o Verbo no modo finito
pede antes de si nominativo.

M. Dizey exemplo.

D. Amo a Pedro. Nesta Oração o Verbo
Amo não tem antes de si nominativo,
e ha Ellipse do nominativo Eu.
O mesmo he no Latim.

M. E pode-se usar dessa figura em todos
os Verbos, tempos, e pessoas?

D. Sim, excepto quando os Verbos significaõ
acçoens diversas.

M. Dizey exemplo.

D. Eu leyo, tu escreves. Naõ posso dizer
Leyo, Escreves, porque se poem para
significarem acçoens diversas. O
mesmo he no Latim.

D. Terceyra regra. Todas as vezes que
depois do Verbo activo naõ està accusativo,
ha Ellipse.

M. Porque?

D. Porque todo o Verbo activo pede depois
de si accusativo.

M. Dizey exemplo.

D. O Turco arma. Nesta Oraçaõ o Verbo
244activo Arma naõ tem o seu accusativo,
e há Ellipse do accusativo A
sua gente
. O Turco arma a sua gente.
O mesmo he no Latim.

M. E desta Ellipse posso usar com todos
os nomes, e Verbos?

D. Naõ. Só com os que o uso introduzio.

D. Quarta regra. Todas as vezes, que na
Oraçaõ està o adjectivo sem o seu
substantivo, ha Ellipse.

M. Porque?

D. Porque o adjectivo naõ pode estar na
Oraçaõ sem o seu substantivo.

M. Dizey exemplo.

D. Em breve tornarey. Nesta Oraçaõ o
adjectivo Breve está sem substantivo,
e ha Ellipse do substantivo
Tempo. Em breve tempo tornarey. O
mesmo he no Latim.

M. E desta Ellipse pode-se usar com todos
os adjectivos, e substantivos?

D. Naõ. Sò nos que introduzio o uso.

D. Quinta regra. Todas as vezes, que a
palavra Que na Oração he relativo,
ha Ellipse.

M. Porque?245

D. Porque o relativo ha de concordar em
caso com o seu substantivo, e com o
relativo Que nunca se poem o substantivo,
com quem concorda em
caso.

M. Dizey exemplo.

D. Repito as palavras, que lhe disse. Nesta
Oração a palavra Que he relativo, e
val o mesmo, que o relativo Qual, e
faltalhe o substantivo Palavras, com
quem concorda em caso. Repito as
palavras, as quaes palavras lhe disse
.

M. E desta Ellipse pòde-se usar sempre?

D. Cõ o relativo Que he obrigação usalla,
com o relativo Qual pòde-se usar,
ou não usar.

D. Sexta regra. Quando o relativo Que,
ou Qual não tem antes de si o seu
antecedente, ha duas Ellipses.

M. Porque?

D. Porque o relativo necessariamente ha
de ter duas vezes o seu substantivo,
huma antes, como antecedente, outra
depois, como seu substantivo,
com quem concorda em caso.

M. Dizey exemplo.

D. Ha huns, a que agradaõ as armas, ou Ha
246huns, aos quaes agradaõ as armas
.
Nesta Oração ha duas Ellipses da
palavra Homens, a primeyra antes do
relativo, a segunda depois. Ha huns
homens, aos quaes homens agradaõ as
armas
. O mesmo he no Latim.

D. Oytava regra. Todas as vezes, que
vem na Oração algum nome, sem ser
nominativo absoluto, e naõ apparece
em que caso está, nem quem o
reja, ha Ellipse de alguma preposiçaão.

M. Porque?

D. Porque todo o nome he regido ou de
outro nome, ou de algum Verbo, ou
de preposição.

M. Dizey exemplo.

D. Esta taboa he larga dous palmos. Nesta
Oração os nomes Dous palmos naõ
saõ regidos de ninguem, nem apparece
em que caso estejaõ, e faltalhe a
preposição De. Esta taboa he larga
de dous palmos
.

M. E esta Ellipse pode-se usar sempre?

D. Naõ. Sò onde o uso introduzio se
pòde usar.

D. Nona regra. Quando na Oração ha
247diversos membros, e o Verbo, que
rege a Oração, se não pòde accommodar
mais que a hum, ha Ellipse
do Verbo diverso.

M. Dizey exemplo.

D. Naõ duvido passar a India, mas ficar là
isso naõ
. Nesta Oração ha dous membros,
Passar à India hum, Ficar là outro.
O Verbo Duvido he o que governa
o primeyro, porèm não accõmoda
para governar o segundo, e
assim no segũdo falta o Verbo Quero.
Naõ duvido passar à India, mas
ficar là, isso naõ quero
. O mesmo he
no Latim.

M. Dizey as regras de Ellipse Zeugma.

D. Primeyra regra. Todas as vezes, que
na Oração está algum nome, ou
Verbo, o qual para o sentido da Oraçaõ
se deve tornar a repetir da mesma
sorte, que está na Oração, ha
Zeugma. E esta he a primeyra casta.

M. Dizey exemplo.

D. Conheceis os astros do Ceo, e as influencias.
Nesta Oração para o sentido ficar
perfeyto, he necessario tornar a entender
a palavra Conheceis, e a palavra
248Ceo, mas sem mudança, nem no tempo, nem no
numero, nem na pessoa,
nem no caso: desta sorte Conheceis
os astros do Ceo, e conheceis as influencias
do Ceo
. O mesmo he no Latim.

D. Segunda regra. Quando o nome, ou
Verbo se deve tornar a entender, mas
com mudança no numero, género,
pessoa, tempo, ou caso, ha Zeugma!
Esta he a segunda casta.

M. Dizey exemplo.

D. Recebido o Rey, e os companheyros. Nesta
Oração falta segunda vez a palavra
Recebido, e se torna a entender, mas
em diverso numero. Recebido o Rey,
e recebidos os companheiros
.

Da mesma sorte. Hoje estou em Portugal,
á manhãa em Castella
, falta, e se
torna a entender o Verbo Estou, mas
em diverso tempo Estarey. O mesmo
he no Latim.249

Capitulo II.
Da figura Pleonasmo.

Mestre. Que cousa he Pleonasmo?

D. He a palavra, que vem demais,
e naõ he necessaria na Oração.

M. Quantas castas ha de Pleonasmo?

D. Duas.

M. Quaes saõ?

D. Pleonasmo quanto ao sentido, e Pleonasmo
quanto à construição.

M. Dizey as regras dessa figura.

D. Primeyra regra. Todas as vezes, que
na Oração vem palavra, sem a qual
fica o sentido perfeyto, ha Pleonasmo,
quando ao sentido.

M. Dizey exemplo.

D. Anda o seu caminho. Nesta Oração ha
Pleonasmo, quanto ao sentido, porque
sem as palavras Seu caminho fica
perfeyto o sentido da Oração. O
mesmo he no Latim.

D. Segunda regra. Quando na Oraçaõ
vem alguma palavra, sem a qual fica
perfeyta a regencia, ha Pleonasmo,
250quanto à construiçaõ.

M. Dizey exemplo.

D. S. Francico antes predisse o successo.
Nesta Oraçaõ ha Pleonasmo quanto
à regencia; porque sem a palavra
Antes ficava perfeyta a regencia das
palavras da Oraçaõ S. Francisco predisse
o successo
.

D. Terceyra regra. Quando na Oraçaõ
vem alguma palavra, sem a qual
fica perfeyto o sentido, mas naõ a
regencia, ha Pleonasmo quanto ao
sentido, mas naõ quanto à regencia.

M. Dizey exemplo.

D. Anda o seu caminho. Nesta Oraçaõ ha
Pleonasmo, quanto ao sentido, mas
naõ quanto a regencia, porque o
Verbo Andar esta activo, e o Verbo
activo rege accusativo precisamente,
e sem as palavras Seu caminho
naõ tinha accusativo.

D. Quarta regra. Quando na Oração vem
palavra, sem a qual fica perfeyto o
sentido, e a regencia, ha Pleonasmo
do sentido, e da regencia.

M. Dizey exemplo.

D. S. Francisco antes predisse o successo. Nesta
251Oração ha Pleonasmo, quanto ao
sentido, e à regencia, porque a Oração
sem a palavra Antes fica perfeyta,
quanto a huma, e outra cousa.

Capitulo III.
Da figura Syllepse.

Mestre. Que cousa he Syllepse?

D. He a palavra, que naõ concorda
com outra palavra, com a qual devia
concordar, mas concorda com a significação,
e sentido della.

M. Dizey exemplo.

D. O exercito pereceo, parte acabaraõ de doença,
parte morreraõ nos recontros
.
Nesta Oração os Verbos Acabaraõ, e
Morreraõ
, naõ cõcordaõ em numero
com o seu nominativo Parte, porque
Parte he singular, Acabaraõ he Plurar,
e Morreraõ tambem; mas concorda
com a significaçaõ, ou sentido,
porque Parte significa muytos Soldados.

M. Dizey as regras da figura Syllepse.
252D. Primeyra regra. Todas as vezes, que
o adjectivo naõ concorda em genero,
ou numero com o seu substantivo,
mas com o significado delle, ha
Syllepse, ou no genero, ou no numero,
ou no genero, e numero.

M. Dizey exemplo.

D. Estava muyta gente, e todos pasmados.
Nesta Oração os adjectivos Todos
pasmados
, naõ concordaõ em genero,
nem em numero com o seu substantivo
Gente, mas com o significado,
que he Homens, e val o mesmo que
Estavaõ muytos homens, e todos pasmados.
Isto mesmo succede no Latim.

D. Segunda regra. Todas as vezes, que
na Oração o Verbo naõ concorda
com o seu nominativo, mas com o
significado, e sentido delle, ha Syllepse
no numero.

M. Dizey exemplo.

D. Chegou a multidaõ, entraraõ na Cidade.
Nesta Oração o Verbo Entraraõ
naõ concorda com o seu nominativo
Multidaõ no numero, mas com o
significado, e sentido, que he Homẽs,
e val o mesmo, que Chegou a multidaõ,
253entraraõ os homens na Cidade
. O
mesmo he no Latim.

M. E desta figura pòde-se usar com todos
os nomes, e Verbos?

D. Naõ, só se usa com os que o uso introduzio,
e saõ alguns nomes Collectivos.

D. Terceyra regra. Todas as vezes que
na Oraçaõ vem o Verbo, ou adjectivo
no plurar, e os substantivos,
hum está no caso competente, outro
em ablativo com a preposiçaõ
Com ha Syllepse no numero.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro com sua irmãa partiraõ para Roma.
Nesta Oraçaõ o Verbo Partiraõ naõ
concorda em numero com o seu nominativo
Pedro, mas concorda com
o sentido, que he este. Pedro, e sua
irmãa partiraõ para Roma
. O mesmo
he no Latim.

M. Esta figura pode-se usar com todos os
Verbos, e nomes?

D. Sim.

D. Quarta regra. Quando na Oraçaõ vem
nome relativo, e antes de si naõ tem
antecedente, e se percebe pelo sentido
254da Oração, ha Syllepse relativa.

M. Dizey exemplo.

D. As nuvens choveraõ sangue, o qual chuveyro
muytos viraõ
. Nesta Oração o
relativo qual não tem antecedente, e
percebe-se pelo sentido ser a palavra
Chuveyro. As nuvẽns choveraõ choveyro
de sangue, o qual chuveyro muytos
viraõ
. O mesmo he no Latim,
mas esta figura he rarissima.

Capitulo IV.
Da figura Hyperbaton.

Mestre. Que cousa he Hyperbaton?

D. He estarem as palavras na Oração
fóra do lugar natural, e confusas,
a saber, estar o Verbo antes do
seu nominativo, ou depois do seu caso,
&c.

M. Dizey exemplo.

D. A Pedro amo eu. Nesta Oração as palavras
estaõ fóra da ordem natural,
porque Pedro he o caso do Verbo
255está antes do Verbo Amo; e o Verbo
Amo está antes do nominativo Eu.

M. Quantas castas ha de Hyperbaton?

D. No Portuguez tres.

M. Quaes saõ?

D. Anastrophe, que quer dizer inversão,
Parenthesis, que quer dizer
interposição, Synchesis, que quer
dizer confuzaõ. No Latim ha mais.

M. Que cousa he Anastrophe?

D. He porse a palavra antes de outra palavra,
devendo estar depois.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro se matou. Nesta Oração a particula
Se está antes do Verbo Matou,
e o seu lugar natural era estar depois.
Pedro matou-se. O mesmo he
no Latim.

M. E desta figura pode-se usar com todos
os nomes, e palavras?

D. Naõ. Sò com as que permitte o uso.

M. Qual he a figura Parenthesis?

D. He quando se interrompe o sentido da
Oração, e depois se torna a continuar,
e esta he bem vulgar.

M. Qual he a figura Synchesis?

D. He quando na Oração todas, ou muytas
256palavras estaõ fora do seu lugar
natural.

M. Dizey exemplo.

D. A Pedro amo eu. Nesta Oração todas
as palavras estaõ fóra do lugar natural,
como acima dissemos.

M. E esta figura usa-se no Portuguez?

D. No verso sim, na prosa naõ. No Latim
em prosa, e verso se usa com
mais, ou menos moderação.

M. E na mesma Oraçaõ succede haver
muytas figuras?

D. Sim.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro ha de mister curado. Nesta Oraçaõ
ha a figura Anastrophe, porque a
preposiçaõ De havia naturalmente
estar depois da palavra Mister, e ha
a figura Ellipse; porque na tal Oraçaõ
falta, e se entende o Verbo Ser.
Pedro ha mister de ser curado.257

Capitulo V.
Dos Idiotismos.

Mestre. Que cousa he Idiotismo?

D. He o modo particular de fallar
de alguma lingua.

M. E que cousa he Idiotismo da lingua
Portugueza?

D. He o modo de fallar da lingua Portugueza
particular da tal lingua.

M. E neste Capitulo, que entendeis pela
palavra Idiotismo?

D. Entendo todos os modos, e termos de
fallar da lingua Portugueza, que
não tem conveniencia, ou semelhança
com a Grammatica Latina,
ainda que os taes modos de fallar da
lingua Portugueza se achem na
Grammatica de outras linguas vulgares,
assim como na Castelhana, Italiana,
&c.

M. E quantas castas de Idiotismos ha na
lingua Portugueza?

D. Muytas.

M. Dizey algumas.
258D. Ha Idiotismos quanto aos artigos.

M. Porque?

D. Porque na lingua Portugueza os nomes
commummente antes de si levão
o seu artigo, e no Latim poucas
vezes.

M. Continuay os Idiotismos.

D. Ha Idiotismos quanto às declinações
dos nomes, e quanto ás terminações
dos casos.

M. Porque?

D. Porque na lingua Portugueza só ha
duas declinaçoens, como dissemos
no Capitulo primeyro da primeyra
parte desta Grammatica, e no Latim
ha sinco. E porque na lingua
Portugueza todos os casos tem a
terminaçaõ do nominativo, e no Latim
muytos casos naõ tem diversa
terminaçaõ do nominativo.

M. Continuay.

D. Ha Idiotismos nos pronomes Isto, Isso,
Aquillo, e no adjectivo Tudo, que
significaõ por hum modo especial,
e naõ tem plurar.

M. Explicay isso.

D. Pedro tudo quer para si. Nesta Oraçaõ
259o adjectivo Tudo significa por hum
modo particular, porque significa
muytas cousas, e val o mesmo que
se disseramos Pedro todas as cousas
quer para si
; e ao mesmo tempo he
singular, e parece naõ tem substantivo,
com quem concorde. E advirta-se
que ha muyta differença entre o
adjectivo Todo substantivado, e o
adjectivo Tudo, porque dizemos
v. g. Este palacio visto por partes naõ
parece perfeyto, mas visto o todo delle, està
perfeyto
, e não podemos dizer Visto
o tudo delle
.

M. E ha tambem Idiotismos nos Verbos?

D. Sim.

M. Quaes saõ?

D. Primeyramente ha Idiotismo nas vozes
dos Verbos.

M. Porque?

D. Porque os Verbos no Latim só tem
duas vozes, activa, e passiva, e na
lingua Portugueza tem quasi tres
vozes.

M. Quaes saõ?

D. Voz activa, passiva, e reciproca, que
he hum modo de significar quasi como
260se fora outra voz.

M. Que cousa he essa voz, a que chamais
reciproca?

D. He quando o Verbo significa de sorte,
que mostra que a acçaõ, ou significaçaõ
do Verbo sahe, e torna para a
mesma pessoa.

M. Dizey exemplos.

D. Eu ferime, onde o Verbo Ferime mostra
que a acçaõ de ferir sahio de mim, e
para mim tornou. Comeceyme a queyxar,
ou comecey a queyxarme
, onde a
acçaõ de queyxar sahe de mim, e
torna para mim. Estes Idiotismos
às vezes saõ Grammatica muyto
barbara.

M. E como se reciprocaõ os Verbos?

D. Reciprocaõ-se, accrescentando-selhes os
pronomes Me, Te, Se, Nós, Vós, Se.

M. Dizey exemplo.

D. Eu amome, Tu amas-te. Elle ama-se,
Nós amamonos, Vòs amais-vos, Elles
amaõ-se
. Eu amavame, &c. accrecentando
o pronome Me a primeyra
pessoa do singular, o pronome Te á
segunda, o pronome Se à terceyra,
o pronome Nós à primeyra do plurar,
261o pronome Vós á segunda, o pronome
Se á terceyra.

M. E podem reciprocarse quaesquer Verbos?

D. Alguns não, assim como o Verbo Leyo,
porque não podemos dizer Eu leyo-me,
&c. Porèm alguns Verbos ha,
que, ainda que se naõ pódem reciprocar
quanto à significaçaõ, reciprocaõ-se
quanto á terminação.

M. Dizey exemplo.

D. Escrevo he Verbo, que se naõ reciproca
quanto á significaçaõ, porque nunca
mostra que a acção de escrever
sahe, e torna para a mesma pessoa,
mas reciprocamolo na terminação,
porque dizemos Eu escrevome com
Pedro
em lugar de dizer Eu escrevo
a Pedro, e Pedro escreveme a mim
, com
que lá vem a ter hum certo ar de reciproco.

Tambem damos terminação, e ar de
reciprocos a alguns Verbos, que o
naõ pòdem ser, assim como Voume,
Vas-te, Riome de Pedro, Riaõ-se de
Pedro
, e outros muytos, que fazem
huma Grammatica barbara, e embaraçada.262

M. Dissestes que a particula Se reciprocava
os Verbos nas terceyras pessoas.
Pergunto, e a tal particula Se naõ
faz tambem muytas vezes voz passiva
nas terceyras pessoas?

D. Sim.

M. Dizey exemplos.

D. Os Turcos matavaõ-se á espada pelos
Portuguezes
. Nesta Oraçaõ a particula
Se faz passivo o Verbo Matavaõ,
e val o mesmo que se disseramos
Os Turcos eraõ mortos à espada,
&c. Porèm nestoutra Oração Os
Turcos matavaõ-se por naõ ficarem cativos,
a particula Se reciproca o Verbo
Matavaõ, porque mostra que a
acção de matar sahia dos Turcos, e
tornava para elles, e val o mesmo
que se dissera. Os Turcos matavaõ
a si mesmos por naõ ficarem cativos
.

M. E como se conhece se a particula Se
faz o Verbo passivo, ou reciproco?

D. Conhece-se desta sorte. Attenta-se
donde nasce a acçaõ, ou significação
do Verbo, e se nasce do nome que
está na Oraçaõ em nominativo, está
o Verbo reciprocado; porèm se nasce
263de nome, que está em accusativo e
a preposiçaõ Por, ou Ablativo com
preposiçaõ, está o Verbo na voz
passiva.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro pintava se neste paynel. Nesta Oraçaõ
a acçaõ de pintar nasce de Pedro,
que está em nominativo, e assim
o Verbo Pintava está reciprocado.
Ao contrario nesta Oraçaõ. Pedro
pintava se neste paynel pelo seu Mestre
.
Nesta Oraçaõ a acçaõ de pintar nasce,
e sahe do Mestre, que está em accusativo
com a preposiçaõ Por, ou
Pelo, e assim mostra que o Verbo
Pintava com a particula Se está passivo.

M. Muyto embaraçada he a Grammatica
dos Verbos reciprocados.

D. Sim, e por isso, e porque discorda
muyto da Latina, se não deve ensinar
aos meninos.

M. Continuay os Idiotismos dos Verbos.

D. Ha Idiotismos nos tempos compostos
activos, como já dissemos no Capitulo
sexto da primeyra parte desta
Grammatica.264

M. Continuay.

D. Ha Idiotismos nos Infinitivos.

M. Porque?

D. Porque na lingua Portugueza a voz
do Infinitivo naõ pòde supprir as
vozes do Indicativo, v. g. a voz Amar
naõ pode supprir o Indicativo com
a particula Que, Que amo, Que amava,
Que amey, Que hey de amar
, &c.
e no Latim sim.

M. Explicay isso mais.

D. Quando dizemos no Portuguez, v. g.
Pedro sabe que eu amo a seus irmãos, o
Verbo Amo a respeyto da lingua
Portugueza està no Indicativo, a respeyto
porèm do Latim está ou no
Indicativo, ou no Infinitivo, conforme
querem usar. No Portuguez cõtudo
não se pode usar da voz Amar
que he a voz do presente do Infinitivo.

Isto mesmo succede com o preterito
do Indicativo quando antes de si
tem a particula Que, e com o futuro
composto do Verbo Haver, v. g. Pedro
dizia que eu amara a seus irmãos.
Ou Pedro dizia que eu havia de amar
265a seus irmãos
. Onde no Portuguez
huma, e outra Oração estão no Indicativo,
e não se pódem fazer por
voz do Infinitivo, no Latim sim.

M. Continuay os Idiotismos.

D. Ha Idiotismos tambem no Infinitivo,
porque na lingua Portugueza o Verbo
no Infinitivo serve naõ só de nome,
mas tem tempos, numeros, e
pessoas, e no Latim o Infinitivo,
posto que sirva de nome, com tudo
nunca tem artigo, numeros, nem
pessoas.

M. Dizey exemplo.

D. O eu ler a miude me faz mal aos olhos. O
tu leres a miude te faz mal aos olhos
.
O elle ler a miude, &c. O nòs lermos
a miude
, &c. O vòs lerdes a miude,
&c. O elles lerem a miude, &c. Nas
quaes Oraçoens o Verbo Ler, Leres,
&c. está no Infinitivo, tem artigo,
pessoas, e numeros. Da mesma sorte
podemos dizer no tempo preterito.
O eu ter lido a miude, o tu teres
lido a miude
, &c. Da mesma sorte
no tempo futuro. O eu haver de ler
a miude
. O tu haveres de ler a miude,
&c.266

M. E porque naõ puzestes esse tempo
conjugado quando tratastes das Cõjugaçoens
dos Verbos?

D. Porque este tempo he o mesmo, e se
regùla pelo futuro do Conjuntivo,
v. g. Como eu ler, Como tu leres, &c.

M. E em todos os Verbos se regùla pelo
futuro do Conjuntivo?

D. Nos Verbos regùlares sim, nos irregulares
naõ, porque nos irregulares
commummente se differença a terminação
do Infinitivo da terminação
do futuro do subjunctivo, v. g.
Ser no futuro do subjunctivo faz Como
eu for ver
, Como eu vir. Dizer.
Como eu disser, &c.

M. Continuay os Idiotismos.

D. Ha Idiotismos nos Gerundios.

M. Porque?

D. Porque na lingua Portugueza só ha
hum Gerundio, que he o Gerundio
em Do, assim como Amando, e no
Latim ha tres Gerundios, hum em
Di, outro em Do, outro em Dum,
para explicar os quaes se serve a lingua
Portugueza da voz do Infinitivo
com alguma preposiçaõ, assim
267como De amar, Para amar, &c.

M. Continuay.

D. Ha Idiotismos nos Participios activos.

M. Porque?

D. Porque na lingua Portugueza o Gerundio
em Do quando leva adiante
de si os pronomes Eu, Tu, Elle, Nós,
Vós, Elles, serve de Participio activo,
e tambem muytas vezes, ainda
que naõ leve diante os taes pronomes,
v. g. Vendo eu o successo, chamey
a Pedro
. Onde o Verbo Vendo está
no participio activo. Da mesma sorte
Soprando o vento se alterou o mar.
Onde Soprando he participio activo.

M. Continuay os Idiotismos.

D. Ha Idiotismos nos adverbios, preposiçoens,
conjunçoens, &c. que o uso
facilmente ensina, e se percebem cõ
facilidade.

M. Continuay.

D. Ha Idiotismos na Syntaxe de concordancia.

M. Porque?

D. Porque os participios passivos quando
com o Verbo Haver formaõ os tempos
compostos, muytas vezes naõ
268concordaõ com os seus substantivos,
como já advertimos no Capitulo
primeyro da Segunda Parte desta
Grammatica.

M. Continuay.

D. Ha Idiotismos na concordancia do
Verbo com o seu nominativo.

M. Porque?

D. Porque o Verbo Haver nas terceyras
pessoas do numero singular não concorda
em numero com o seu nominativo.

M. Dizey exemplo.

D. Ha muytas flores neste jardim. Onde o
Verbo Haver está no numero singular,
e o seu nominativo Flores no
plurar. Da mesma sorte: Havia
muytas flores neste jardim
, &c. O que
he hum Idiotismo, e Grammatica
muyto irregular.

M. Continuay.

D. Ha Idiotismos na regencia dos casos.

M. Dizey-os.

D. Ha Idiotismos na regencia dos nominativos.

M. Porque?

D. Porque muytas vezes o Verbo naõ
269tem nominativo, nem claro, nem occulto,
e os nomes, que deviaõ servir
de nominativo, estaõ em outros
casos.

M. Dizey exemplo.

D. A mim naõ se me dà de Pedro. Onde o
Verbo Da naõ tem nominativo algum
claro, ou occulto. O pronome
A mim está em dativo, e o nome Pedro
em ablativo. Da mesma sorte.
A mim naõ se me dà de Francisco hum
caracol
. Onde tambem não ha nominativo
nem claro, nem occulto,
porque as palavras Hum caracol estaõ
em accusativo, ou ablativo de
preço. E val o mesmo que se disseramos.
Naõ estimo a Francisco em
hum caracol
, ou por hum caracol, segundo
deyxamos explicado na Syntaxe.

M. Continuay.

D. Ha Idiotismos no nominativo absoluto,
porque o não ha no Latim, e o
ha no Portuguez, v. g. Posto eu a
menza deu meyo dia
. Onde os nomes
Posto eu estaõ em nominativo, como
fica dito na Syntaxe.270

M. E ha algũa duvida nessa Grammatica,
que seguis nesta materia.

D. Alguma pòde causar ver que nos participios
activos postos em caso absoluto
muytas vezes o pronome, com
quem concordaõ, he Me, Te, Se, &c.
os quaes naõ pòdem ser nominativos,
assim como nestas Oraçoens Indome
para França. Pondome à menza
ouvi a noticia
, em que os participios
estaõ no caso absoluto, e concordando
com o pronome Me. Porem
eu entendo que nestes modos de fallar
ha Ellipse do nominativo Eu,
Tu, Elle, &c. e que o pronome só
serve de reciprocar o participio,
porque dizemos Indome eu para
França
. Pondome eu à menza. Onde
claramente o participio Indo, e Pondo
concorda com o pronome Eu, que he
nominativo, e a particula Me
serve de dar ao participio hum ar
de reciproco.

M. Continuay.

D. Ha Idiotismos na regencia dos accusativos.

M. Porque?271

D. Porque muytas vezes o Verbo tomado
impessoalmente rege accusativo
a qual Grammatica he muyto diversa
da Latina.

M. Dizey exemplo.

D. Manda ElRey que se prendaõ os traidores.
Onde o nome, e artigo Os traidores
està claramente em accusativo, e
parece ser regido do Verbo se prẽdaõ,
que està impessoal.

M. Esta Grammatica he muyto barbara,
podeylla por ventura reduzir a
Grammatica Latina?

D. Sim, dizendo que o nome Traidores
esta alli pela figura Syllepse regido
do Verbo Prender, naõ do tal Verbo,
segundo se acha impessoal na Oraçaõ,
mas do Verbo, segundo o seu
sentido, que he este Manda ElRey
que prendaõ os traidores
.

M. Continuay.

D. Ha Idiotismos na significaçaõ das palavras.

M. Porque?

D. Porque as palavras muytas vezes significaõ
huma cousa, e querem dizer
outra.272

M. Dizey exemplos.

D. A Deos. Estas palavras saõ o termo, de
que usamos nas despedidas, e significaõ
Deos, mas querem dizer Ficay
com bem
, ou Deos vos guarde. Da
mesma sorte Morrer de fome. Nestas
palavras o Verbo Morrer, que significa
acabar a vida, quer dizer Ter
grande fome
. Morrer de riso, quer
dizer Ter grande vontade de rir, ou
Rir muyto.

M. Continuay.

D. Ha outros muytos termos de fallar na
lingua Portugueza, que saõ puros
Idiotismos, assim como Pedro aborreceme
como moscas
, que val o mesmo
que Tenho tanto aborrecimento a Pedro,
como tenho às moscas
, ou Tenho
odio grande a Pedro
. Esqueceome
o livro
, que val o mesmo que Esquecime
do livro
, e outros, que o uso ensina.

M. E deve o Mestre ensinar a Grammatica
destes Idiotismos aos meninos?

D. Naõ, principalmente a dos muyto embaraçados,
deve sómente dizerlhe
que saõ Idiotismos.

M. Dizey algũas regras nesse particular.273

D. Primeyra regra. Todas as vezes que
na Oraçaõ vierem as palavras Tudo,
Isto, Isso, Aquillo
, ha suspeyta de Idiotismo
embaraçado, e assim o Mestre
o naõ explicará ao menino.

Segunda regra. Todas as vezes que
na Oração vierem os pronomes, ou
particulas Me, Te, Se, Lhe, &c. ha
suspeyta de Idiotismo, e o Mestre
o naõ explicará ao menino.

Terceyra regra. Todas as vezes que
o Verbo estiver no modo Infinito, ha
suspeyta de Idiotismo, e o Mestre
o naõ explicará ao menino.

Quarta regra. Todas as vezes que na
Oração vier o Verbo Haver, ha suspeyta
de Idiotismo, e o Mestre o naõ
explicará ao menino.

M. E se o Mestre conhecer claramente,
que naõ ha Idiotismo?

D. Entaõ poderá dizer a Grammatica ao
menino.

M. E se o Mestre conhecer no menino
boa percepçaõ, e perspicacia, que
farà?

D. Entaõ poderlhe-ha ensinar os Idiotismos
mais faceis. Os muyto difficultozos
274porèm nunca se devem
ensinar, se naõ com grande cautela
de o naõ confundir.

M. Tendes mais que dizer dos Idiotismos
da lingua Portugueza?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Capitulo VI.
Das figuras da Dicçaõ.

Mestre. Que cousa he Dicçaõ?

D. He a palavra, ou o dito.

M. E que cousa he figura da Dicçaõ?

D. He o modo particular de dizer, ou escrever
algũas palavras contra as regras
commuas.

M. Quantas figuras ha de Dicçaõ?

D. Diversas, mas todas se podem reduzir
a tres.

M. Quaes saõ?

D. Addiçaõ, Subtracçaõ, Commutaçaõ.

M. E que quer dizer Addiçaõ?

D. Quer dizer accrecentamento.

M. Que cousa he Addiçaõ?

D. He quando na palavra se accrecenta
275alguma letra, que segundo as regras
commuas naõ devia ter.

M. Dizey exemplo.

D. Assombrar. Esta palavra segundo as
regras commuas devia dizerse Sombrar,
porque nasce da palavra Sombra,
e significa fazer sombra, mas
pela figura Addiçaõ se lhe accrecentaõ
as letras As.

M. E quantas castas ha de Addiçaõ?

D. Tres, a saber, no principio da palavra,
no meyo, e no fim.

M. Qual he a Addiçaõ no principio da
palavra?

D. He quando no principio da palavra se
accrecenta alguma letra, ou letras,
que segundo as regras commuas
não devia ter, assim como Assombrar.

M. E como se chama entaõ a essa figura?

D. Prothese, ou Addição.

M. E essa figura he muyto usada na lingua
Portugueza?

D. Naõ muyto; mas usa-se em alguns
Verbos, e nomes, que se sabem pelo
uso.

M. E qual he a Addiçaõ no meyo da palavra?276

D. He quando no meyo da palavra se accrecenta
alguma letra, que segundo
as regras commuas naõ devia ter.

M. Dizey exemplo.

D. Eu Queyra, tu Queyras, &c. nestas
pessoas, e tempo do Verbo Querer
se accrecenta a letra I, no meyo da
palavra, que segundo as regras da
Grammatica devia estar sem ella, e
devia dizerse, Eu Quera, tu queras,
&c. porque o Verbo Querer naõ tem
I, no Infinitivo, ou Indicativo, que
he donde se formaõ as pessoas, e
tempos do Verbo.

M. E como se chama a essa figura?

D. Epenthese, ou Interjeyçaõ.

M. E he muyto usada na lingua Portugueza?

D. Naõ muyto, e sabe se pelo uso.

M. E qual he a Addiçaõ no fim da palavra?

D. He quando no fim da palavra se accrecenta
alguma letra ou letras, que segundo
as regras commuas naõ devia
ter.

M. Dizey exemplo.

D. Eu quiz, nesta pessoa, e tempo perfeyto
do Indicativo do Verbo Querer
277se accrecenta no fim a letra Z, que
segundo as regras das formaçoens
naõ devia ter.

M. E como se chama essa figura?

D. Paragoge, ou Adjunçaõ.

M. E he muyto usada na lingua Portugueza?

D. Naõ.
M.Que cousa he Subtracçaõ?

D. He quando na palavra se tira alguma
letra, ou letras, que segundo as regras
commuas devia ter.

M. Dizey exemplo.

D. Pollonia, onde o nome Apollonia perde
a letra A, que devia ter.

M. E que quer dizer Subtracçaõ?

D. Quer dizer tiramento, ou diminuição.

M. E quantas castas ha de Subtracçaõ?

D. Tres, a saber, no principio da palavra,
no meyo, e no fim.

M. Qual he a Subtracçaõ no principio?

D. He quando no principio da palavra se
tira alguma, ou algumas letras, que
segundo as regras commuas deviaõ
ficar, assim como Pollonia em lugar
de Apollonia.

M. E como se chama a essa figura?278

D. Apherese, ou Subtracçaõ simplesmente.

M. E he muyto usada na lingua Portugueza?

D. Naõ.

M. Qual he a Subtracçaõ no meyo da palavra?

D. He quando no meyo da palavra se tira
alguma, ou algumas letras, que segundo
as regras commuas devia ter.

M. Dizey exemplo.

D. Como vòs amares, onde a palavra Amardes
perde a letra D, que se lhe devia
pòr, e dizer Como vós amardes.

M. E como se chama a essa figura?

D. Chama-se Syncope, ou Concisaõ.

M. E he muyto usada na lingua Portugueza?

D. Sim.

M. Dizey em que palavras se usa.

D. Usa-se nas segundas pessoas do numero
plurar do futuro do conjuntivo
dos Verbos, pelo que dizemos
Como vòs amares, ou Amardes. Como
vòs escreveres
, ou Escreverdes. Como
vòs admittires
, ou Admittirdes. Usa-se
tambem com a segunda pessoa do
numero plurar do tempo presente
279do Verbo Haver quando faz futuro
composto, pelo que dizemos Vos heis
de amar
, ou Vós haveis de amar.
Usa-se tambem com o futuro composto
do Verbo Dizer quando vem
com os pronomes Me, Te, Se, Lhe,
Nòs, Vòs, Lhes, assim como Dirme-ha,
Dirte-ha, Dirnos-haõ em lugar
de Dizerme-ha, Dizerte-ha, &c. Usa-se
mais em outras palavras, que ensinarà
o uso, assim como Pero em lugar de
Pedro, Payo em lugar de
Pelayo, &c.

M. E qual he a Subtracçaõ no fim da palavra?

D. He quando no fim da palavra se tira
alguma letra, ou letras, que devia ter
segundo as regras commuas.

M. Dizey exemplo.

D. Elle quer, onde a palavra Quer perde a
ultima letra E, porque segundo as
regras das Conjugaçoens commuas
devia ser Elle quere.

M. E como se chama essa figura?

D. Apocope, ou Separaçaõ.

M. E he muyto usada na lingua Portugueza?280

D. Naõ. Usa-se com tudo nas terceyras
pessoas do numero singular do
tempo presente do modo Indicativo
de alguns verbos, assim como
Elle produz, Elle luz, Elle diz, Elle faz,
que segundo as regras deviaõ ser,
Elle produze, Luze, Dize. Usa-se mais
em algumas palavras, que o uso ensinarà.

M. Que cousa he Commutaçaõ?

D. He quando na palavra se muda huma,
ou muytas letras em outra, ou outras,
contra as regras commuas.

M. Dizey exemplo.

D. Eu sinto, onde na palavra Sinto a letra
E, se muda na letra I, porque devendo
dizerse Eu sento do Infinitivo
Sentir, se diz Eu sinto. Da mesma
sorte a palavra Perco muda a letra D,
em C, porque nasce do Infinitivo
Perder. A palavra Digo muda o Z,
em G, porque nasce do Infinitivo
Dizer.

M. E essa figura he muyto usada na lingua
Portugueza?

D. Sim.

M. Dizey quando se usa.281

D. Usa-se em diversas pessoas, e tempos
de alguns Verbos irregulares, assim
como Digo, Diga, Perco, Perca,
Minto, Minta, dos Verbos Dizer,
Perder, Mentir. Vòs ledes, Lede
vòs
, do Verbo Ler, Peço, de Pedir,
Despeço de Despedir, &c.

M. Usa-se mais algumas vezes?

D. Usa-se tambem em algumas palavras
derivadas, assim como Prisaõ, que se
deriva, isto he, que nasce do Verbo
Prender, e muda o E, em I.

M. Usa-se mais algumas vezes?

D. Usa-se juntamente com outras figuras
em diversas palavras.

M. Que quer dizer isso?

D. Quer dizer que em algumas palavras
se acha esta figura Commutaçaõ, e
tambem outras figuras.

M. Dizey em que palavras.

D. Na preposiçaõ Em, na preposiçaõ Por,
na palavra Cento, na palavra Santo,
e em outras.

M. Explicay isso.

D. Quando à preposiçaõ Em, se ajuntão
os artigos O, Os, A, As, a tal preposição
Em, por Subtracção perde a
282letra E, e pela figura Commutação
muda a letra M, em N, e junta com
o artigo faz No, Nos, Na, Nas, assim
como Estou em o campo, ou no campo.
Estou em casa de Pedro, ou na casa de
Pedro
.

Da mesma sorte, quando com a preposiçaõ
Por se ajuntaõ os artigos O, ou Os, A, ou
As, muda pela figura Commutação
as letras O, e R, em E, e L,
e junta com os artigos faz Pelo, Pelos,
Pela, Pelas, assim como Pelo mar,
ou Por mar. Pela terra, ou Por terra.

Da mesma sorte na palavra Cento pela
figura Subtracçaõ perde as letras ultimas
T, e O, e pela figura Commutaçaõ
muda a letra N, em M, e faz
Cem.

Tambem a palavra Santo quando se
accommoda aos nomes de Santos,
que começão por letra consoante,
pela figura Subtracção perde a letra
T, e pela figura Commutação muda
o M, em til, e fica Saõ, assim como
Saõ Francisco, Saõ Gregorio, &c. exceptua-se
desta regra Santo Thomas,
que posto que começa o nome Thomas
283por consoante, se lhe accommoda
a palavra Santo.

Pelas mesmas figuras dizemos Graõ
Prior
, Graõ Mestre, Graõ Turco, em
lugar de Grande Prior, Grande Mestre,
&c.

M. E usa-se algumas vezes mais da figura
Commutação?

D. Usa-se com todas as pessoas dos Verbos,
que acabaõ em S, quando se lhe
ajunta o relativo O, Os, A, As, porque
muda entaõ a pessoa do Verbo
a ultima letra S, em L.

M. Dizey exemplos.

D. Tu amalo em lugar de Tu o amas. Nós
amamolo
em lugar de Nós o amamos.
Vós amastelo em lugar de Vós o amastes,
onde todas as pessoas acabadas
em S, mudaõ o ultimo S, em L.

Tambem se usa da figura Comutação
com a figura Addição em todas as
pessoas dos Verbos acabadas em R,
quando se ajuntaõ com os relativos
acima ditos O, Os, A, As, porque as
taes pessoas, ou palavras do Verbo
mudaõ o R, ultimo em L, e se lhe
accrecenta outro L, assim como Ha
284de querello
em lugar de Ha de o querer.
A Deos he bom amallo em lugar
de He bom amar a Deos, onde as palavras
Querer, e Amar mudaõ o ultimo
R, em L, e se lhe accrecenta outro
L, e estaõ juntas com o relativo
O.

Ultimamente usa-se a figura Commutaçaõ
com outras palavras, que o uso
ensinará.

M. Ha mais alguma figura da Dicçaõ?

D. Ha outra cousa, a que tambem podemos
chamar figura da Dicçaõ.

M. Qual he?

D. He a Apostrophe.

M. Que quer dizer Apostrophe?

D. Quer dizer Retroversaõ, ou Volta.

M. E que cousa he Apostrophe?

D. He quando alguma palavra perde a ultima
vogal para hir continuando cõ
a palavra, que lhe vay diante, e formarem
ambas huma só palavra.

M. Dizey exemplo.

D. Antontem, onde das palavras Ante, e
Ontem se forma huma só palavra, e
para se fazer de ambas huma só palavra
perde a palavra Ante a ultima
285vogal que he a letra E, e se ajunta
com a palavra Ontem.

M. E he muyto usada a Apostrophe na lingua
Portugueza?

D. Sim.

M. Dizey quando se usa.

D. Usa-se em alguns nomes proprios,
assim como Pedralves em lugar de
Pedro Alvares, Marianna, em lugar
de Maria Anna, &c.

Usa-se com os pronomes Me, Te, Lhe,
quando vem antes dos relativos O,
Os, A, As, assim como Dissemo, que
sem Apostrophe havia de ser Disseme o.
Digama, que sem Apostrophe havia
de ser Digame a. Lha manda, que
sem Apostrophe havia de ser Lhe a
manda
, &c.

Usa-se mais em algumas palavras, que
o uso mostra.

M. E porque se chama a esta figura Apostrophe,
ou Volta, ou Retroversaõ?

D. Porque para sinal de haver Apostrophe,
nas palavras usaõ em algumas linguas
por huma virgulasinha voltada
para a palavra, que perde a vogal, desta
sorte Ant'ontem, porem na lingua
286Portugueza naõ usamos deste sinal.

M. Tendes mais que dizer das figuras da
Dicçaõ?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Capitulo VII.
Das palavras Encliticas.

Mestre. Que cousa he palavra, ou
dicçaõ Enclitica?

D. Dicçaõ Enclitica he aquella particula,
ou palavra, que perde o seu tom, e
o poem na ultima syllaba da palavra
antecedente, se he capaz delle.

M. E que cousa he tom?

D. He hum certo geyto ou diversidade de
som, com que pronunciamos a mesma
palavra, ou particula.

M. Dizey exemplo.

D. Dizme nesta palavra a particula Me se
pronuncia com algum geyto, ou diversidade,
do que quando pomos a
particula Me, antes do Verbo Diz,
e pronunciamos Me diz.

M. Isto he huma cousa, que mal se percebe,
287ou conhece.

D. Assim he, e na verdade em algumas
palavras se percebe mais, em outras
menos.

M. E que cousa he Syllaba?

D. Isso naõ pertence aqui. Agora baste
dizer que he a pronunciaçaõ de alguma,
ou algumas letras vogaes per
si só, ou com algũa, ou algumas consoantes.

M. Dizey exemplo.

D. A, Da, Foz, Os, Mey, &c. cada huma
destas pronunciaçoens faz huma
syllaba.

M. E quaes saõ as particulas, ou dicçoens
Encliticas na lingua Portugueza?

D. Saõ estas Me, Te, Se, Lhe, Nós, Vòs,
Lhes, e a meu ver tambem os relativos
O, Os, A, As.

M. E quaes saõ as regras dos Encliticos?

D. Saõ estas. Todas as vezes que estas
particulas, ou pronomes Me, Te,
Se, Lhe, Nòs, Vòs, Lhes, se poem
logo depois do Verbo, se fazem Encliticas.
Isto he mudaõ o seu tom.

M. Dizey exemplos.

D. Mandeme, Mandaisme, Dizte, Perdese.
288Delhe, Fizeramos, Digovos,
Dizemlhes, onde as particulas Me,
Te, &c. perdem o tom proprio, e
se fazem Encliticas, porque estaõ
postas logo depois dos Verbos Mande,
Diz, &c.

M. E quando essas particulas, ou pronomes
se poem antes do Verbo, saõ
Encliticas?

D. Naõ.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro me he suspeyto, onde a particula
Me, naõ he Enclitica, porque està
antes do Verbo He.

M. E esses pronomes, ou particulas podem-se
por antes, ou depois do
Verbo?

D. Commummente ou se podem pòr antes,
ou depois.

M. Dizey exemplo.

D. Tu daslhe paõ, ou Tu lhe das paõ, onde
a particula Lhe em huma Oraçaõ
está depois do Verbo Das, em outra
está antes.

M. E quando he que saõ Encliticos os relativos
O, Os, A, As?

D. Quando se ajuntaõ aos pronomes Me,
289Te, &c. que vem logo depois dos
Verbos.

M. Dizey exemplo.

D. Deylhos, onde o relativo Os está Enclitico,
porque se ajunta ao pronome
Lhe vindo depois do Verbo Dey.

M. Tendes mais que dizer das palavras
Encliticas?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.290

Quarta parte
da grammatica
Portugueza.

Capitulo I.
Dos Dialectos da lingua Portugueza.

Mestre. Que quer dizer
Dialecto?

D. Quer dizer modo de fallar.

M. Que cousa he Dialecto?

D. He o modo diverso de fallar a mesma
lingua.

M. Dizey exemplo.

D. O modo, com que se falla a lingua Portugueza
nas terras v. g. da Beyra, he
diverso do com que se falla a mesma
291lingua Portugueza em Lisboa
porque em huma parte se usa de humas
palavras, e pronuncia, e em outra
parte se usa de outras palavras, e
outra pronuncia, naõ em todas as
palavras, mas em algumas. Esta diversidade
pois de fallar, que observa
a gente da mesma lingua, he que se
chama Dialecto.

M. E quantas castas ha de Dialectos?

D. Muytas, mas as principaes saõ tres.

M. Quaes saõ?

D. Dialectos locaes, e Dialectos de tempo,
e Dialectos de profissaõ.

M. Que cousa he Dialecto local?

D. Dialecto local he a differença, com que
se falla a mesma lingua em diversas
terras da mesma naçaõ.

M. Dizey exemplo.

D. A diversidade, com que se falla a lingua
Portugueza nas terras da Beyra,
e da Estremadura, he Dialecto local.

M. E quantos Dialectos locaes tem a lingua
Portugueza?

D. Muytos, mas os principaes saõ cinco.

M. Quaes saõ?

D. O Dialecto da Provincia da Estremadura,
292o da Provincia de Entre Douro,
e Minho, o da Beyra, o do Algarve,
e o de Tras os Montes.

M. E que cousa he o Dialecto da Provincia
da Estremadura?

D. He a pronuncia, palavras, e modo de
fallar a lingua Portugueza usado nas
terras da Provincia da Estremadura.

M. E que cousa he o Dialecto da Provincia
de Entre Douro, e Minho?

D. He a pronuncia, palavras, e modo de
fallar a lingua Portugueza usado
nas terras da Provincia do Minho, o
mesmo se deve de dizer competentemente
dos demais.

M. E em que differe o Dialecto de Entre
Douro, e Minho, do da Estremadura?

D. Differe na pronuncia, porque a letra
V, consoante pronunciaõ como B,
ao Vinho dizem Binho; a letra B, pronunciaõ
como V consoante, ao Vento,
dizem Bento. As letras pronunciaõ
om, ao Naõ dizem Nom, ao
Paõ Pom. Differe nas palavras, porque
à Viraçaõ chamaõ Marè, à Alameda
chamaõ Devesa. Differem no
modo de fallar, porque fazem a alguns
293nomes masculinos femininos,
e aos femininos masculinos, O fim dizem
A fim. A febre dizem O febre, e
tambem mudaõ em alguns Verbos
as terminaçoens das pessoas, Eu estive
dizem Eu esteve. Eu fiz dizem
Eu fez.

M. E em que differe o Dialecto da Beyra
do da Estremadura?

D. Differe na pronuncia, porque ao ditongo
Ou sempre pronunciaõ Oy, a Ouvir
dizem Oyvir, a Couves dizem
Coyves. Esta pronuncia se reteve no
Dialecto da Estremadura em muytas
palavras, porque ao Couro dizemos
Coyro, ao Mouro Moyro, ao
Touro Toyro, &c.

Differe outro sim o Dialecto da Beyra
do da Estremadura, porque às palavras,
que começaõ por A, accrecentaõ
muytas vezes a letra I, Agoa dizem
Aiagoa. A alma dizem Aialma.
Differem nas palavras, porque aos
Canteyros de flores, ou hortaliça chamaõ
Leyras, aos Vagados Oyras, aos
Rapazes Cachopos, às Raparigas Cachopas.294

M. Em que differe o Dialecto de Tras os
Montes do da Estremadura?

D. Differe na pronuncia, e nas palavras,
que condizem muyto com as da
Beyra, e Entre Douro, e Minho.

M. E em que differe o Dialecto do Algarve
do da Estremadura?

D. Differe na pronuncia, porque ao E, fechado
pronunciaõ como I, assim como
Pedaço dizem Pidaço, e ao I,
pronunciaõ como E fechado, assim
como Dizer pronunciaõ Dezer, e
em outras cousas. Meu dizem Mey,
Seis horas dizem Seis joras.

M. E porque naõ pondes o Dialecto da
Provincia de Alentejo entre os demais?

D. Porque differe pouco do da Estremadura,
ao Concertar chama Amanhar,
aos Casaes chama Montes, &c. e dizem
tem alguns defeytos da pronuncia
do Algarve.

M. E ha mais alguns Dialectos locaes?

D. Ha alguns de alguns lugares de Tras os
Montes, e Minho nas rayas de Portugal,
que saõ muyto barbaros, e
quasi que se naõ pòdem chamar
295Portuguez, mas só os usa a gente
rustica da quelles lugares.

M. E que cousa he Dialecto de tempo?

D. He a differẽça do fallar da mesma lingua
em diversos tempos.

M. E quantos Dialectos de tempo ha na
lingua Portugueza?

D. Podemos dizer que tres.

M. Quaes saõ?

D. Antiquissimo, e he o que se usou atè o
tempo de ElRey Dom Diniz o
Sexto de Portugal. Antigo, e he o
que se usou quasi atè a perda de ElRey

D. Sebastiaõ, e Moderno, e he
o que actualmente se usa da perda
de ElRey D. Sebastiaõ para cà.

M. E em que differe o Dialecto antigo, e
antiquissimo do moderno?

D. Em muytas cousas, principalmente o
antiquissimo, o que se vè nos livros,
e doaçoens antiguas. Baste saber
que tinhaõ muyta parte do Dialecto
actual do Minho, Beyra, e
Tras os Montes.

M. E esses Dialectos he necessario sabellos?

D. Para as pessoas curiosas, e doutas he
296necessario saber muyta parte delles,
mas isso aprende-se com mais vagar.

M. E que cousa he Dialecto de profissaõ.

D. He a differença de fallar a mesma lingua,
de que usaõ os que exercitaõ diversa
profissaõ de fallar.

M. Dizey exemplo.

D. Quem falla, ou escreve hum successo
em verso, conta-o com muyta differença
do que quẽ o conta em prosa,
e a esta differença chamo Dialecto
de profissaõ sem entrar na disputa
se esta divisaõ he propria, ou
impropria.

M. E quantos Dialectos de profissaõ ha
na lingua Portugueza?

D. Dous no sentido, em que aqui tomo a
palavra Dialecto.

M. Quaes saõ?

D. O da prosa, a que chamaremos Prosaico,
e o do verso, a que chamamos
Poetico.

M. E qual he o Dialecto da prosa, ou como
vós lhe chamais Prosaico?

D. He o modo de fallar, de que usamos
quando dizemos qualquer cousa
297sem ser em verso, assim como quando
fallamos familiarmente, &c.

M. E qual he o Dialecto Poetico?

D. He o modo de fallar, de que usamos
quando contamos algum successo,
ou o escrevemos em verso.

M. E em que differe o Dialecto Poetico
do Prosaico?

D. Differe nas palavras, e na ordem das
palavras.

M. Porque differe nas palavras?

D. Porque ao que o Dialecto Prosaico
chama Throno, o Poetico muytas vezes
chama Solio, ao Sol chama Febo,
ao Chegar diz Appropinquar. Ao Ceo
chama Polo, &c.

M. E porque differe na ordem das palavras?

D. Porque o Dialecto da prosa sempre
conserva a ordem natural das palavras,
segundo deyxamos dito na
Syntaxe. Porèm o Dialecto Poetico
muytas vezes naõ conserva a tal
ordem, antes usa da figura Hyperbaton,
e Synchisis, que explicàmos
no Capitulo quarto da Syntaxe figurada.298

M. Dizey exemplo.

D. O Sileno buscava
Daquellas que a serra deu bacantes
Ja que Ninfas as nega ser errantes
O hombro sem aljava

Nestes versos a palavra Sileno significa
o Guarda, Bacantes significa Loucas,
Ninfas significa Mulheres, Errantes
significa Vagabundas, e a ordẽ das
palavras está toda cõfusa, e ordenada
no Dialecto familiar devia ser assim.
Buscava ao guarda daquellas mulheres
loucas, que vinhaõ pela serra, pois
o naõ trazerem aljava no hombro mostrava
naõ serem mulheres vagabundas
.
Onde se vè que he muyto diversa a
ordem, que as palavras tem no Dialecto
Poetico, e no de Prosa.

M. Ha mais algũ Dialecto, de que trateis?

D. Ha hum modo de fallar a lingua Portugueza
mao, e viciado, ao qual podemos
chamar Dialecto rustico, e
delle usa a gente ignorante; rustica,
e incivil, e delle he necessario desviar
aos meninos bem criados.

M. E em que differe esse mao Dialecto
do Dialecto verdadeyro?299

D. Differe na pronuncia, nas palavras, e
no modo de fallar a lingua Portugueza.

M. Dizey exemplos.

D. Para dizerem os rusticos Por certo, dizem
Bofé. Aos Tostoens dizem Tostaens,
aos Graõs Grães, &c. A letra Z
muytas vezes pronunciaõ como G,
ao Vizitar dizem Vigitar, à Vizita
Vigita
. Eu fizera dizem Eu figera,
Eu trouxe dizem Eu trouve, a Ouvido
dizem Ouvisto. Atreverse dizem
Estreverse. Flores dizem Froles, &c.

M. Ha mais algum Dialecto?

D. Ha os Dialectos ultramarinos, e conquistas
de Portugal, como India,
Brasil, &c. os quaes tem muytos termos
das linguas barbaras, e muytos
vocabulos do Portuguez antigo.
Tambem em Lisboa entre os homens,
a que chamaõ de ganhar, ha hum genero
de Dialecto, a que chamaõ Giria,
de que os taes usaõ algumas vezes
entre si. E assim tambem os Siganos
tem outra especie de Giria,
por que se entendem huns com os outros.300

M. Tendes mais que dizer dos Dialectos
da lingua Portugueza?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Capitulo II.
Da Construiçaõ da lingua Portugueza.

Mestre. Que cousa he Construiçaõ?

D. He declarar com as palavras de
huma lingua, ou Dialecto o que está
escrito, ou dito em palavras de outra
lingua, ou Dialecto, assim como
declarar com palavras Portuguezas
o que está dito, ou escrito com palavras
Latinas. Ou declarar com palavras
do Dialecto, de prosa Portugueza
o que está escrito, ou dito no
Dialectico Poetico.

M. Dizey exemplo.

D. Quero construir estas palavras do Dialecto
Poetico. No solio rutilante o
fulgor reverberava
; e declaro estas
palavras com outras do Dialecto de
prosa, que significaõ o mesmo, assim
A luz fazia reflexo no throno resplandecente.301

M. Explicay isso.

D. Fulgor quer dizer Luz. Reverberava
quer dizer Fazia reflexo. No solio
quer dizer No throno. Rutilante quer
dizer Resplandecente.

M. E de quantas partes consta a Construiçaõ?

D. De duas.

M. Quaes saõ?

D. Trocar as palavras, e mudarlhe a ordem.

M. Explicay isso.

D. Trocar as palavras he em lugar de humas
palavras de huma lingua, ou
Dialecto, por outras de outra lingua,
ou Dialecto, que signifiquem o
mesmo, como acima fica dito. Mudar
a ordem das palavras he por na
ordem natural as palavras, que na lingua
Latina, ou no Dialecto Poetico
estaõ confusas pela figura Hyperbaton,
como dissemos no Capitulo antecedente.

M. E como se sabe trocar as palavras de
huma lingua nas palavras de outra
lingua, ou as palavras de hum Dialecto
nas de outro Dialecto?
302D. Isso sabe-se pelos Vocabularios.

M. E como se sabe mudar as palavras da
ordem confusa para a ordem natural?

D. Sabe-se pelas regras da Construiçaõ.

M. Que cousa saõ as regras da Cõstruiçaõ?

D. Saõ as regras, que ensinaõ a por em huma
lingua na ordem natural as significaçoens
daquillo, que em outra
lingua, ou Dialecto estava na ordem
perturbada, e confusa.

M. Dizey essas regras.

D. Primeyra regra. Na Construiçaõ a primeyra
palavra, que se deve buscar na
Oraçaõ confusa, he o nome, que faz
na Oraçaõ, e serve ao Verbo de nominativo
ou claro, ou occulto, e
esta se deve pòr primeyro na Oraçaõ
feyta na ordem natural, e Dialecto
da prosa.

M. Dizey exemplo.

D. Insustava nos mares furiozo
Com rapida procella o Austro iniquo
.
Nesta Oraçaõ que està feyta no Dialecto
Poetico cõfuso, para lhe desfazer
a cõfusaõ, e a pòr na ordẽ natural do
Dialecto Prosaico, deve-se buscar
quem he o nome, que faz na Oraçaõ,
303e serve de nominativo ao Verbo Insustava,
que significa soprar, e acharemos
que he o nome Austro, que
significa o vento Sul, porque este
nome he o que serve de pessoa ao
Verbo Insustava; e assim construiremos
primeyro, e poremos na Oraçaõ
natural a palavra Austro, dizendo
o Vento Sul, &c.

Segunda regra. Se ha adjectivos, que
concordem com o nominativo, que
faz substantivo na Oraçaõ, estes taes
se devem buscar logo na Oraçaõ confusa,
e pollos depois do seu substantivo
na Oraçaõ feyta na ordem natural.

M. Dizey exemplo.

D. Insustava nos mares furioso
Com rapida procella o Austro iniquo
.
Nesta Oraçaõ os adjectivos Furioso, e
Iniquo concordaõ com o substantivo
Austro, que faz na Oraçaõ, e assim logo
depois da palavra Austro os devemos
construir, e pòr na Oração feyta na
ordem natural, dizendo. O vento Sul
furioso perverso
, &c.

Terceyra regra. Se o substantivo, que
304faz na Oração; tiver outros nomes,
que pendaõ delle, e fação com elle
hum modo de fazer na Oração, tambem
se devem construir, e pòr primeyro
na Oraçaõ natural antes de
construir; ou pòr o Verbo.

M. Dizey exemplo.

D. Insustava nos mares produzido
Da rapida procella o Austro iniquo
.
Nesta Oraçaõ os nomes Da rapida
procella
pendem do substantivo principal
Austro, que faz na Oraçaõ, e cõ
elle de algũa sorte fazem tambem na
Oraçaõ; e assim se devem construir,
e pòr na Oraçaõ natural depois do
substantivo Austro, e seus adjectivos,
e dizer O vento Sul perverso produsido
da arrebatada tempestade
, &c.
porque Rapida significa Arrebatada.
Procella significa Tempestade.

Quarta regra. Depois de estar construido
tudo o que de algum modo
faz na Oração, e serve de pessoa ao
Verbo, se constroe o Verbo, e se
poem na ordem natural.

M. Dizey exemplo.

D. Insustava nos mares produzido.
305Da rapida procella o Austro iniquo
.
Constroe-se, e se poem na ordem
natural o Verbo Insustava, depois
de posto na ordem natural, o que na
regra atraz fica dito, e se diz. O vento
Sul perverso produzido da arrebatada
tempestade soprava
, &c.

Quinta regra. Depois do Verbo se
constroe, e poem na ordem natural
o nome, que serve de caso ao Verbo.

M. Dizey exemplo.

D. Aos mares agitava furiozo
Com rapida procella o Austro iniquo
.
Nesta Oração depois do Verbo Agitava,
que significa Mover, se constroe,
e poem na ordem natural o artigo, e
nome Aos mares, porque he o caso do
Verbo Agitar, e se diz assim. O vento
Sul furiozo, e perverso movia os mares
.

Sexta regra. Se o nome, que serve de
caso ao Verbo, tem adjectivo, que
concorde com elle, se constroe, e
poem na ordem natural logo depois
delle.

M. Dizey exemplo.

D. Aos mares agitava compellidos
Da rapida procella o Austro iniquo
.
306Nesta Oraçaõ depois do nome Mares
se constroe, e poem na ordem natural
o adjectivo Compellidos, que
concorda com Mares, e se diz. O
vento Sul perverso movia os mares
obrigados da arrebatada tempestade
.

Setima regra. Se o caso do Verbo tem
pendentes de si outros nomes substantivos,
se constroem depois do caso
do Verbo.

M. Dizey exemplo.

D. Aos mares agitava compellidos
Da rapida procella o Austro iniquo
.
Nesta Oraçaõ as palavras Da rapida
procella
estaõ pendentes dos casos
Mares compellidos, porque a Rapida
procella
he por quem saõ compellidos,
e assim se devem construir logo
depois, e dizer. O vento Sul perverso
movia aos mares obrigados da
arrebatada tempestade
.

Oytava regra. Depois do caso do Verbo
activo, e suas dependencias se constroe,
e poem na ordem natural o
caso, a que o Verbo faz correlaçaõ,
que he o caso de dativo.

M. Dizey exemplo.307

D. Aureos tributava às Regias plantas
Do Augusto Joseph votos
.
Constroe-se assim. Offerecia peças de
ouro aos pes Reaes do Augusto Joseph
,
onde As Regias plantas, que quer dizer
aos Reaes pès, e he o caso, a quem faz
correlaçaõ o Verbo Tributava, que
quer dizer Offerecia, se constroe, e
poem na ordem natural depois das
palavras Aureos votos, que quer dizer
Peças de ouro, que he o caso do Verbo
Tributava.

Nona regra. O caso de genitivo, ou
ablativo sempre se constroem depois
do nome, ou Verbo, ou preposiçaõ,
de que dizem dependencia.

M. Dizey exemplo.

D. Aos mares agitava furiozo
Com rapida procella o Austro iniquo
.
Constroe-se na ordem natural. O
vento Sul furiozo, e perverso movia os
mares com a arrebatada tempestade
.
Onde as palavras, Com a arrebatada
tempestade
se poem depois das palavras
Agitava os mares, porque saõ
como huma dependencia das taes
palavras em razaõ de a tempestade
308ser a causa, ou Instrumento, com
que se agitavaõ os mares.

Decima regra. Os relativos muytas
vezes se constroem antes dos nomes,
que fazem na Oraçaõ.

M. Dizey exemplo.

D. Soprava o vento nas margens,
Que o doce Tejo recrea
.
Constroe se. O vento soprava nas ribeyras,
as quaes o doce Tejo alegra
. Onde
o relativo Que, ou As quaes na
ordem natural se constroe, e poem
antes dos nomes Doce Tejo, que fazem
na Oraçaõ.

M. Ha mais regras da Construiçaõ?

D. Muytas mais, mas estas bastaõ para
mostrar ao principiante a conveniencia,
e semelhança entre a Construiçaõ
Latina, e Portugueza, e lhe
dar luz para a Construiçaõ Latina.309

Pratica
da regencia da grammatica
Portugueza conforme com
a regencia da Latina.

Para intelligencia clara do
modo, com que se deve ensinar
esta Grammatica, e para
que os meninos se facilitem
pela regencia della à regencia,
e regras da lingua Latina, me pareceo
propor aqui o exercicio pratico das
regras, que temos dado, e delle usáraõ os
Mestres na fórma, que dizemos na Introducção,
que vay no principio desta Grammatica.

Para idea pois, e exemplar deste exercicio,
e regencia pratica, escolhi huma
Carta escrita pelo insigne Padre Antonio
310Vieyra, da Companhia de Jesus ao Eminentissimo
Cardial de Lancastre, a qual
naõ anda impressa atèqui, e ma participou
hum amigo, e he a seguinte.

Carta
do P. Antonio Vieyra
para o Eminentissimo Cardial
de Lancastre.

Eminentissimo Senhor.

Com melhor saude, que o anno passado, e
com menos vida, porque elle passou,
beyjando de joelhos a sagrada Purpura dou a
Vossa Eminencia as graças da continuada mercè,
com que Vossa Eminencia por sua benignidade,
e grandeza se digna de conservar na memoria,
e de honrar por tantos modos este minimo
criado de Vossa Eminencia.

Se o amor da Patria, com que os meus annos
se animàraõ a compor, aquelles discursos,
foy merecedor de algum premio, na approvaçaõ
de Vossa Eminencia recebi o que me naõ
311atrevia a pretender, nem ainda a dezejar. Eu
os dediquey à sepultura do segredo, e Vossa
Eminencia mandando-os sahir à luz do mundo,
resuscitou em mim a confiança morta, a
que por tantos outros esquecimentos ha muyto
tinha feyto as exequias no templo do desengano.
Nelle porèm, vendo-me taõ favorecido de Vossa
Eminencia, adoro hoje a imagem, que nunca vi,
do agradecimento, nem por isso arrependido de
ter idolatrado as estatuas da ingratidaõ, naõ
só com os fumos do incenso, mas com os sacrificios
do sangue; e sera a mayor gloria do meu
amor a Patria, como he a mayor fineza, servir
aos futuros, pagar aos passados, e naõ dever
nada aos presentes. Deos guarde a Vossa Eminencia.
Bahia 14. de Julho de 1690.

Eminentissimo Senhor.

Antonio Vieyra.

Esta Carta contèm quatro periodos, e
assim regeremos a sua Grammatica, propondo
primeyro hum periodo, e depois
outro, com a advertencia que a do primeyro
periodo a regeremos cõ toda a miudeza,
312para que os Mestres vejaõ como haõ de
perguntar, e ensinar aos meninos. Os demais
periodos os regeremos sem tanta
miudeza, por naõ causar tedio na repetição
das mesmas cousas.

M. Que cousa he regencia da Grammatica?

D. He declarar que cousa saõ as palavras,
que se achaõ em alguma Oraçaõ, e
a fórma, porque estaõ postas, e a razaõ.

M. Explicay isso mais claramente.

D. Reger a Grammatica he dizer de cada
palavra que parte da Oração he, e
se he nome, dizer que casta de nome
he, de que declinação, de que numero,
de que genero, em que caso
está, e de quẽ. Se he Verbo, que casta
de Verbo he, em que modo, em que
tempo, em que numero, em que pessoa
està, que caso pede, &c.

M. Tendes algum papel bem feyto, por
onde pratiqueis essa regencia?

D. Sim, huma Carta do grande Padre Antonio
Vieyra para o Eminentissimo
Cardeal Lancastre.313

M. Dizey o primeyro periodo dessa
Carta.

D. Eminentissimo Senhor com melhor saude,
que o anno passado, mas com menos vida,
porque elle passou; beyjando de joelhos
a sagrada Purpura, dou a V. Eminencia
as graças da continuada mercè,
com que V. Eminencia por sua benignidade,
e grandeza se digna de conservar
na memoria, e de honrar por tantos
modos este minimo criado de V. Eminencia
.

M. Comecemos a regencia da Grammatica
dessa Carta. Dizey que cousa he
Eminentissimo?

D. He nome adjectivo superlativo.

M. Porque he nome?

D. Porque tem numeros, e se declina por
casos.

M. Que numeros tem, e como faz nelles?

D. Tem numero singular, e faz Eminentissimo,
tem numero plurar, e faz
Eminentissimos.

M. E porque se declina por casos?

D. Porque se diz O Eminentissimo. Do Eminentissimo,
&c.

M. E porque he nome adjectivo?314

D. Porque naõ pòde estar na Oração sem
o seu substantivo, ou claro, ou occulto.
Ou porque se lhe accommoda a
palavra Cousa na terminação feminina
Cousa Eminentissima.

M. E porque tem terminação feminina
diversa?

D. Porque os adjectivos acabados em O
tem duas terminaçoens, huma para
os nomes masculinos, que he a que
acaba em O, outra para os femininos,
que he a que acaba em A. Eminentissimo,
Eminentissima.

M. E porque he superlativo?

D. Porque significa com excesso, isto he,
cousa naõ só eminente, mas muyto
eminente.

M. Donde se fórma o superlativo Eminentissimo?

D. Do seu positivo Eminente, mudado o
E em issimo.

M. Com quem concorda o superlativo
Eminentissimo?

D. Com o seu substantivo Senhor.

M. E porque he o seu substantivo?

D. Porque he a cousa, que he eminentissima.315

M. E como concorda?

D. Concorda em genero, em numero, e
em caso.

M. Porque?

D. Porque todo o adjectivo concorda cõ
o seu substantivo em genero, numero,
e caso.

M. E como concorda em genero, numero,
e caso?

D. Concorda em genero, porque Senhor
he masculino, e Eminentissimo está
na terminação masculina; concorda
em numero, porque Senhor he do numero
singular, e Eminentissimo tambem;
concorda em caso, porque Senhor
está em vocativo, e Eminentissimo
tambem.

M. Que cousa he Senhor?

D. He nome substantivo, appellativo, masculino,
do numero singular.

M. Porque?

D. He nome, porque significa, tem numeros,
e se declina por casos. He
substantivo, porque pode estar per
si só na Oraçaõ. He appellativo,
porque per si só naõ significa tal Senhor,
mas este, ou aquelle. He masculino,
316porque se lhe accommoda o
artigo O. O Senhor. He do numero
singular, porque significa huma
só cousa, e naõ acaba na letra S.

M. Em que caso està?

D. Em vocativo.

M. De quem?

D. Da particula O, que se lhe entende
pela figura Ellipse, e val o mesmo,
que se dissesse Ó Eminentissimo Senhor.

M. Que cousa he Com?

D. Preposiçaõ.

M. Que caso pede?

D. Ablativo.

M. Que cousa he Melhor?

D. Nome adjectivo, comparativo.

M. E porque he adjectivo?

D. Isso jà fica dito na palavra Eminentissimo,
e naõ devemos estar sempre
repetindo o mesmo quando, do que
fica dito em humas palavras se ve o
que se ha de dizer nas outras.

M. Porque he comparativo?

D. Porque compara a saude de hum anno
com a saude de outro anno.

M. Quantas terminaçoens tem?317

D. Huma, e serve para os nomes masculinos,
e femininos.

M. Quem he o seu positivo?

D. O adjectivo Bom, porque Melhor val
o mesmo que Mais bom.

M. Quem he o seu substantivo, cõ quem
concorda?

D. He o nome Saude, e concorda com
elle em genero, numero, e caso.

M. Que cousa he Saude?

D. He nome substantivo, appellativo,
feminino do numero singular.

M. Porque?

D. He feminino, porque se lhe accommoda
o artigo A, A saude. O demais
fica dito no nome Senhor.

M. E em que caso està Saude?

D. Està em ablativo da preposiçaõ Com.

M. Que cousa he Que?

D. He preposiçaõ, ou adverbio, segundo
se disse no Capitulo sexto da
Syntaxe simples em razaõ de que
aqui cahe sobre a cousa comparada,
como logo veremos.

M. Que cousa he O?

D. Aqui O não he artigo, ou ao menos
serve de preposição; porque ha hũ
318Idiotismo muy embaraçado nestas
palavras. Com melhor saude, que o
anno passado
.

M. E onde està ahi o Idiotismo?

D. Nas palavras. O anno passado.

M. E como conheceis que ha ahi Idiotismo?

D. Conheço-o, porque as taes palavras
não apparece em que caso estejaõ,
nem Verbo, ou preposiçaõ, que as
reja, nem fazem sentido sem se lhes
entenderem outras muytas palavras.

M. E atreveisvos a explicar, e resolver
este Idiotismo?

D. Sim, mas não he para principiantes.

M. Explicay-o, e resolvey-o.

D. A particula O aqui he a preposição No,
e se lhe come a letra N pela figura
da Dicção Apherese. As palavras
Anno passado estaõ em ablativo à pergunta
Quando; ou Em que tempo, e
demais ha aqui Ellipse das palavras
seguintes. A saude, que eu tinha; e
assim posta a Oração inteyra, e sem
figura pelas regras da Syntaxe simples
ha de ser. Com melhor saude, que
a saude, que eu tinha no anno passado
.319

M. Que cousa he Mas?

D. Conjunção.

M. Porque?

D. Porque ata o sentido, e as palavras.

M. Com menos, que cousa he Menos?

D. Adverbio de quantidade, e comparativo
do adjectivo comparativo Menor.

M. Porque he comparativo?

D. Porque compara a vida de hum anno
com a vida do outro.

M. Que cousa he Vida?

D. He nome substantivo, &c.

M. Em que caso està?

D. Em genitivo do adverbio Menos, e ha
Ellipse do artigo De. Com menos de
vida
.

M. Qual he aqui o caso da preposição
Com?

D. Servelhe de caso o adverbio Menos.

M. Que cousa he Porque?

D. Conjunçaõ causal.

M. Porque he causal?

D. Porque declara o fundamento de a vida
de hum anno ser mais breve que
a outra.

M. Que cousa he Elle?320

D. He pronome, relativo.

M. E porque he pronome?

D. Porque se poem em lugar do nome
Anno. Elle, isto he, O anno.

M. Porque he relativo?

D. Porque traz à memoria o nome Anno.

M. Quem he o seu antecedente?

D. O nome Anno, porque fica antes delle.

M. Com quem concorda?

D. Em genero, e numero com o nome
Anno.

M. E com quem concorda em caso?

D. Com o nome Anno, que se lhe torna a
entender depois Elle anno.

M. E em que caso està, e de quem?

D. Està em nominativo do Verbo Passou.

M. Porque?

D. Porque he o nome, que faz na Oraçaõ.

M. E porque faz na Oraçaõ?

D. Porque he o nome, que serve de pessoa
ao verbo Passou. Elle, isto he, o
anno Passou.

M. E que pessoa he, e porque?

D. He terceyra pessoa, porque he de
quem se falla. Fala-se do anno, e dis-se
delle que jà passou. E he a terceyra
pessoa, porque he o pronome
321Elle, que sempre com os Verbos he
terceyra pessoa.

M. E de que numero he, e porque?

D. He do singular, porque significa hum
so, e naõ muytos.

M. Que cousa he Passou?

D. Verbo.

M. Porque?

D. Porque significa, tem modos, e tempos,
numeros, e pessoas.

M. Que casta de Verbo he?

D. Neutro.

M. Porque?

D. Porque naõ significa cousa, que se faz
a outrem.

M. A que conjugaçaõ pertence, e por
onde vay?

D. Pertence à primeyra dos Verbos acabados
no Infinitivo em Ar, e vay
pelo Verbo Amar.

M. Quaes saõ as suas letras iniciaes?

D. Saõ Pas.

M. Porque?

D. Porque saõ as por onde principia, e ficaõ
antes da figurativa.

M. E qual he a sua letra figurativa?

D. He a letra S segunda.322

M. Porque?

D. Porque he a que se poem antes da terminaçaõ
Ar do Infinitivo Pas-s-ar.

M. Passou em que modo, em que tempo,
em que numero, em que pessoa
està e porques?

D. Está no modo Indicativo, porque affirma,
e mostra que o anno na verdade
passou, e foy. No preterito
perfeyto, porque affirma simplesmente
que o anno passou. No singular,
porque fala de hum só anno.
Na terceyra pessoa, porque concorda
com Elle, que he terceyra pessoa.

M. Que cousa he Beyjando?

D. He o Verbo Beyjar.

M. Que casta de Verbo he?

D. Activo.

M. Porque?

D. Porque significa cousa, que se faz a
outrem.

M. Em que modo está, e porque?

D. Está no Infinitivo, porque per si só a
palavra Beyjando não affirma nada.

M. E que cousa he do Infinitivo?

D. Gerundio.

M. Porque?323

D. Porque significa com hum certo geyto
de quem obra.
M, Que caso pede?

D. Accusativo.

M. Porque?

D. Porque todo o Verbo activo pede accusativo.

M. Que cousa he De joelhos?

D. Adverbio.

M. Porque?

D. Porque junto ao Gerundio Beyjando
determina o modo, porque se faz a
acçaõ. Isto he, que se faz estando
com os joelhos em terra.

M. E que casta de adverbio he?

D. He dos adverbios, que saõ nomes com
o seu artigo, porque De he artigo,
Joelhos nome.

M. Que cousa he A?

D. He artigo feminino do nome Sagrada.

M. Que cousa he Sagrada?

D. He adjectivo da terminação feminina.

M. Porque he feminino?

D. Porque se lhe accommoda o artigo A.

M. Que adjectivo he?

D. Positivo.

M. Porque?324

D. Porque significa simplesmente sem
comparação, nem excesso.

M. Como faz o comparativo?

D. Mais sagrada.

M. E como faz no superlativo?

D. Sacratissima.

M. Com quem concorda Sagrada?

D. Com Purpura.

M. Que cousa he Purpura?

D. Nome substantivo, &c.

M. Em que caso está, e de quem?

D. Està em accusativo de Beyjando, porque
he a cousa beyjada.

M. Que cousa he Dou?

D. He Verbo activo irregular da primeyra
Conjugaçaõ, &c.

M. E porque he irregular?

D. Porque em muytos tempos se desvia
da Conjugação dos Verbos em Ar.

M. Quem he o seu nominativo?

D. O pronome Eu, que se lhe entende por
Ellipse.

M. Pois nada mais he seu nominativo?

D. He seu nominativo de alguma sorte
tudo o que pende do pronome Eu,
que vem a ser todas as palavras Com
melhor saude, que o anno passado, mas
325com menos vida beyjando a sagrada
Purpura de joelhos
.

M. E porque?

D. Porque quem dà naõ he só Eu, mas
Eu com melhor saude, que o anno passado,
&c.

M. A vossa; que cousa he Vossa?

D. He hum pronome possessivo, que nasce
do pronome primitivo Vós.

M. Com quem concorda?

D. Com Eminencia.

M. Em que caso está Eminencia, e de quẽ?

D. Em dativo do Verbo Dou.

M. Porque?

D. Porque he a quem se dà.

M. Em que caso està Graças?

D. Em accusativo do Verbo Dou.

M. Porque?

D. Porque he a cousa dada.

M. Que cousa he Da?

D. Preposiçaõ.

M. Que cousa he Continuada?

D. Hum adjectivo participio do Verbo
Continuar.

M. Com que concorda?

D. Com o substantivo Merce.

M. Em que caso està?326

D. Em ablativo da preposiçaõ Da.

M. Com que. Que cousa he Que?

D. He relativo, e val o mesmo que Qual.

M. Quem he o seu antecedente?

D. O nome Merce, e faz este sentido,
Com a qual merce.

M. Em que caso está Que?

D. Em ablativo da preposiçaõ Com.

M. Em que caso está Vossa Eminencia?

D. Em nominativo do Verbo Digna-se,
porque lhe serve de pessoa, e faz na
Oraçaõ.

M. Que cousa he Por?

D. Preposiçaõ.

M. Que cousa he Sua?

D. Pronome possessivo derivado do pronome
Si.

M. Com quem concorda?

D. Com o nome Benignidade.

M. Em que caso està Benignidade?

D. Em accusativo da preposiçaõ Por.

M. Que cousa he E?

D. Conjunçaõ copulativa.

M. Em que caso está Grandeza?

D. Em accusativo da preposiçaõ Por, que
por Ellipse se torna a entẽder desta
sorte. Por benignidade, e por grandeza.327

M. Que cousa he Se digna?

D. He o Verbo Dignarse.

M. Que Verbo he?

D. Neutro, e reciproco.

M. Porque he reciproco?

D. Porque faz tornar para a pessoa a acção
do Verbo, e conhece-se, porque no
Infinitivo lhe ajuntamos a particula
Se.

M. Pois, se o Verbo he dignarse, como
tem antes a particula Se?

D. Pela figura Anastrophe.

M. Que cousa he De conservar?

D. He o Verbo Conservar.

M. Em que modo està?

D. No Infinitivo.

M. E porque tem a particula De?

D. Aqui tem-na pela figura Pleonasmo,
e pudera estar sem ella.

M. Em que tempo està?

D. No presente.

M. De que Verbo he regido este Infinitivo?

D. Do Verbo Se digna.

M. Que cousa he Na?

D. He a preposiçaõ Em com o artigo A,
tirada a letra E, pela figura da dicçaõ
328Apherese, e mudado o M em
N pela figura Commutaçaõ.

M. Em que caso està Memoria?

D. Em ablativo da preposiçaõ Na.

M. Que cousa he De honrar?

D. He o Verbo Honrar. Està no Infinitivo.

M. De quem he regido esse Infinitivo?

D. Do Verbo Se digna, que se torna a entender
por Ellipse, E se digna de honrar.

M. Por tantos. Que cousa he Tantos?

D. Nome adjectivo.

M. He por ventura relativo?

D. He, mas aqui naõ.

M. Porque?

D. Porque naõ traz a ninguem à memoria,
e significa o mesmo, que Muytos.
Por muytos modos.

M. Que cousa he Este?

D. Pronome demonstrativo.

M. E he aqui relativo?

D. Naõ, porque naõ traz ninguem à memoria.

M. Com quem concorda?

D. Com o substantivo Criado.

M. Que cousa he Minimo?329

D. Superlativo do positivo Pequeno.

M. Com quem concorda?

D. Com o substantivo Criado.

M. Em que caso està Criado?

D. Em accusativo do Verbo activo Honrar,
porque he a cousa honrada.

M. Em que caso està De vossa Eminencia?

D. Em genitivo de dous nomes substantivos,
&c.

M. Dizey o segundo periodo da Carta.

D. Se o amor da patria, com que os meus annos
se animaraõ a compor aquelles discursos,
foy merecedor de algum premio,
na approvaçaõ de Vossa Eminencia recebi
o que me naõ atrevia a pretender,
nem ainda a dezejar
.

M. Que cousa he Se?

D. Conjunçaõ condicional.

M. Porque he condicional?

D. Porque mostra que recebeu premio debayxo
da condiçaõ de ser merecedor.

M. Em que caso està Amor?

D. Em nominativo do Verbo Foy.

M. Em que nominativo?

D. Em nominativo de antes.

M. Em que caso està Patria?330

D. Em genitivo de dous nomes substantivos, &c.

M. Em que caso está Meus annos?

D. Em nominativo do Verbo Se animaraõ.

M. Que cousa he Se animaraõ?

D. O Verbo passivo Ser animado, ou Animarse.

M. Pois naõ he o Verbo Animar reciprocado?

D. Tambem se pòde dizer que o he, mas
entaõ a particula Se he o artigo Si, e
está em accusativo do Verbo activo
Animar, e faz este sentido, O amor
da Patria, com que os meus annos animaraõ
a si
.

M. Que cousa he A?

D. Aqui he preposição, e val o mesmo
que Para.

M. Que couda he Compor?

D. Verbo composto.

M. Porque he composto?

D. Porque se compoem da preposição
Com, e do Verbo simples Por.

M. Em que caso està Aquelles discursos?

D. Em accusativo do Verbo Compor, porque
he a cousa composta.331

M. Que cousa he Foy?

D. He o Verbo Ser.

M. Em que caso està Merecedor?

D. Em nominativo do Verbo Foy, e he nominativo
de depois.

M. E porque tem aqui dous nominativos?

D. Porque significa uniaõ de huma cousa
comsigo mesma. O amor foy merecedor.

M. Que cousa he Algum?

D. Nome adjectivo partitivo.

M. Porque he partitivo?

D. Porque significa hum entre muytos,
hum premio entre muytos premios.

M. Em que caso està Premio?

D. Em genitivo de dous nomes substantivos,
porque faz este sentido Foy
merecedor de premio algum
.

M. Que cousa he Recebi?

D. Verbo da terceyra Conjugação em Er.
Receber.

M. Que cousa he O que?

D. O aqui he relativo, traz à memoria
Premio, està em accusativo do Verbo
Recebi, Que he tambem relativo; traz
à memoria Premio, está em accusativo
do Verbo Pretender. Ha aqui
332Ellipse da palavra Premio, e sem
Ellipse se resolve assim: Recebi o
premio, o qual premio me naõ atrevia
a pretender
.

M. Me naõ atrevia. Que cousa he Me?

D. Me he a particula Me, ou reciproco
Eu, que reciproca o Verbo Atrevèr-se,
e havia de ser Naõ me atrevia.

M. Que cousa he Nem ainda?

D. He conjunção.

M. Dizey o terceyro periodo da Carta.

D. Eu os dediquey à sepultura do segredo, e
Vossa Eminencia mandando-os sahir à
luz do mundo, resuscitou em mim a
confiança morta, a que por tantos outros
esquecimentos ha muyto tinha feyto as
exequias no templo do desengano
.

M. Que cousa he Os?

D. Relativo, concorda com Discursos, está
em accusativo do Verbo Dediquey.
Quer dizer Eu os discursos dediquey.

M. Em que caso está Sepultura?

D. Em dativo, porque he a quem diz ordem
o Verbo Dediquey.

M. Em que caso está Luz?

D. Em accusativo da preposição A.

M. Em que caso está A que?333

D. Em dativo do Verbo Tinha feyto.

M. Que cousa he Hà muyto?

D. He hum Idiotismo do Verbo Haver.

M. Póde-se reduzir à Grammatica Latina?

D. Parece-me que naõ.

M. Que cousa he Tinha feyto?

D. He preterito plusquam perfeyto do
Indicativo do Verbo Fazer.

M. Em que caso está Exequias?

D. Em accusativo de Tinha feyto, porque
he a cousa feyta.

M. O nome Exequias tem singular?

D. Naõ.

M. Dizey o ultimo periodo da Carta.

D. Nelle porèm vendome taõ favorecido de
Vossa Eminencia; adoro hoje a imagem,
que nunca vi, do agradecimento,
nem por isso arrependido de ter idolatrado
as estatuas da ingratidaõ, naõ só
com os fumos do incenso, mas com os
sacrificios do sangue, e sera a mayor
gloria do meu amor a Patria, como he
a mayor fineza, servir aos futuros, pagar
aos passados, e naõ dever nada aos
presentes. Deos guarde a Vossa Eminencia.
Bahia quatorze de Julho de
334mil e seiscentos e noventa. Eminentissimo
Senhor. Antonio Vieyra
.

M. Que cousa he Nelle?

D. He o pronome relativo Elle com a
preposiçaõ No, que perde a ultima
letra por Apostrofe.

M. Que cousa he Porèm?

D. Huma conjunçaõ.

M. Que cousa he Vendome?

D. He o gerundio em do, Vendo com o
pronome Me accusativo do pronome
Eu.

M. Que cousa he Taõ?

D. Adverbio.

M. Que cousa he Favorecido?

D. He Participio passivo do Verbo Favorecer.

M. Com quem concorda?

D. Com o pronome Me.

M. Em que caso està De Vossa Eminencia?

D. Em ablativo do participio passivo Favorecido.

M. Que cousa he Hoje?

D. Adverbio de tempo.

M. Que cousa he Nem por isso?

D. Huma conjunçaõ causal.

M. Em que caso está Arrependido?335

D. Em nominativo.

M. De quem?

D. Do Verbo Estou, que por Ellipse se
lhe entende. Nem por isso estou arrependido.

M. Que cousa he Ter idolatrado?

D. He o preterito perfeyto do Infinitivo
do Verbo Idolatrar.

M. E esse Infinitivo serve de caso?

D. Sim. Serve de caso de genitivo ao participio
Arrependido, porque quem
está arrependido he nominativo,
aquillo de que está arrependido genitivo.

M. Que cousa he Naõ?

D. Adverbio.

M. Que cousa he ?

D. Adverbio.

M. Que cousa he Serà?

D. Futuro do Indicativo do Verbo Ser.

M. Quem he o seu nominativo de antes?

D. A mayor gloria.

M. E qual he o seu nominativo de depois?

D. Servir aos futuros, &c.

M. Porque?336

D. Porque une o Servir aos futuros com
A mayor gloria, e os faz a mesma
cousa. A mayor gloria do meu amor
será servir aos futuros
.

M. Em que caso está Aos futuros?

D. Em accusativo do Verbo Servir, porque
este Verbo na lingua Portugueza
he activo.

M. Em que caso está Aos passados?

D. Em dativo do Verbo Pagar, porque
he a quem paga.

M. Pagar he Verbo activo, qual he logo
aqui o seu accusativo?

D. Naõ o tem claro, mas entende-selhe
por Ellipse alguma palavra competente
ao sentido, v. g. Pagar o ensino
aos passados
, ou Pagar as dividas aos
passados
.

M. Que cousa he Nada?

D. Adverbio de quantidade.

M. E aqui serve de caso?

D. Sim, serve de accusativo ao Verbo Dever,
porque he a cousa devida.

M. Em que caso està Aos presentes?

D. Em dativo do Verbo Dever, porque
he a quem se deve.

M. Que cousa he Bahia?337

D. Aqui he nome proprio, porque significa
cousa certa. Isto he tal Cidade
chamada a Bahia.

M. Em que caso està?

D. Em ablativo à pergunta Em que lugar.

M. Ha aqui alguma figura?

D. Sim. Ha Ellipse de muytas palavras,
porque a oraçaõ inteyra ha de dizer.
Esta Carta se escreveu na Bahia.

M. Que cousa he Quatorze?

D. Nome numeral cardinal.

M. Em que caso está?

D. Está em accusativo da preposiçaõ A
à pergunta Quando, o que se vè resolvida
a Ellipse, que aqui ha nesta
forma. Escreveu-se esta Carta na Bahia
aos quatorze dias do mez de Julho
.

M. Que cousa he Julho?

D. Nome proprio de hum certo mez.

M. Que cousa he Antonio?

D. Nome proprio.

M. Que cousa he Vieyra?

D. Nome proprio.

M. Em que caso està?

D. Em nominativo continuado.338

M. De quem?

D. Do Verbo Assinar, que aqui se entende
por Ellipse nesta forma. Eu Antonio
Vieyra assino esta Carta
.339

Tratado breve
da
Orthografia
da lingua Portugueza.

Pareceume fazer aqui no fim
desta Grammatica menção
da Orthografia Portugueza,
para que os meninos tenhaõ
alguma noticia della.

Capitulo I.
Que cousa seja Orthografia, e das propriedades
das letras.

Mestre. Que cousa he Orthografia?

D. He a arte de escrever as palavras,
e Oraçoens com acerto.341

M. E que cousa he isso?

D. He escrever as palavras, e Oraçoens
com as letras, e pontuaçaõ, com que
se devem escrever.

M. E que cousa he letra?

D. He huma figura, que representa o
som, que devemos fazer com a boca
para a pronunciar.

M. Dizey exemplo.

D. Vejo a figura A, e representame que
para a pronunciar hey de fazer com
a boca o som A.

M. Quantas letras ha na lingua Portugueza?

D. Isso aprende-se na escola quando decoramos
o Abecedario.

M. E quantas saõ as propriedades das letras?

D. Tres.

M. Quaes saõ?

D. Figura, Nome, e Poder.

M. Que cousa he Figura?

D. He o debuxo da letra, que se faz com
tinta, ou outra qualquer cousa.

M. Dizey exemplo.

D. O debuxo de hum circulo he a figura
da letra O, o debuxo de hum meyo
342circulo he a da letra C.

M. E quantas figuras tem as letras?

D. Duas: huma grande, outra pequena,
segundo nos ensinaõ na escola quando
aprendemos o ABC.

M. Pois algumas letras pequenas naõ tem
muytas castas de figuras?

D. Sim, e tambem algumas grandes tem
muytas castas de figuras, mas as figuras
pequenas todas saõ pequenas, e as figuras grandes
todas saõ grandes, e por isso dizemos que só tem
duas figuras grande, e pequena.

M. E que cousa he nome de letra?

D. He aquella palavra, que dizemos para
significar a figura, ou letra.

M. Dizey exemplo.

D. Xis he palavra, que dizemos para significar
a figura, e letra X. Be he a
palavra, que dizemos para significar
a letra B.

M. E que cousa he o poder da letra?

D. He o som, que lhe damos quando a
pronunciamos.

M. Explicay isso.

D. O som, que faço com a boca quando
pronuncio a letra A, he o poder da
343letra A. O som, com que pronuncio
as letras Bo, he o poder das letras
B, e O.

M. E a mesma letra tem sempre o mesmo
poder.

D. Naõ.

M. Porque?

D. Porque a mesma letra humas vezes
faz hum som, outras vezes outro.

M. Dizey exemplo.

D. A letra V, quando he consoante, tem
hum som, assim como na palavra
Vinha; quando he vogal, tem outro
som, assim como na palavra Unha.

M. E quaes saõ as letras, que humas vezes
tem hum som, outras vezes outro?

D. C, G, I, N, S, V, Z.

M. Explicay isso, e dizey exemplos.

D. A letra C quando pega com a letra E,
ou I, tem som da letra S, assim como
Ceo, Cinto; quando pega com a
letra A, O, V, tem som diverso da
letra S, assim como Camelo, Coco,
Cura.

M. E quando a letra C pega com A, O, V,
e tem por bayxo huma plica?344

D. Entaõ conserva o som da letra S, assim
como Moço, Moça, Doçura.

M. Explicay a letra G.

D. A letra G quando pega com a letra
A, O, V, tem hum som, assim como
Gato, Gosto, Magusto; quando pega
com a letra E, I, tem outro som, assim
como Gesto, Gizar.

M. Explicay a letra I.

D. A letra I quando he vogal tem hum
som, assim como em Tio, quando he
consoante, tem outro, assim como
em Joaõ.

M. Explicay a letra N.

D. A letra N quando vem antes de letra,
que naõ seja vogal, tem quasi o som
da letra M, assim como Anno, Antonio,
onde a letra N primeyra tem o
som de M.

M. Explicay a letra S.

D. A letra S em muytas palavras tem o
som da letra Z, assim como Fermoso,
Rosa.

M. Explicay a letra Z.

D. Z no fim das palavras tem o som da
letra S, assim como Voz, Noz, Foz.

M. E ha mais algumas letras, que mudem
345o poder, e som?

D. Sim: as letras vogaes nos dithongos,
assim como Outo, onde a letra V tem
o som da letra I; mas isto pertence
ao tratado dos dithongos, de que
aqui naõ fallaremos, por ser de
muyta extensaõ.

M. E as palavras tem às vezes alguma letra,
que naõ faça som, isto he, que
se naõ pronuncie?

D. Sim.

M. Dizey exemplo.

D. Quando na palavra vem dous BB
juntos, como em Abbade, o segundo
B naõ se pronuncia, e perde o som.
Isto mesmo succede ás letras D, F,
G, L, P, T, S, quando vem dobradas,
e juntas na palavra.

M. E de que serve entaõ dobrar as letras,
se ellas se naõ pronunciaõ, e lhes falta
o poder?

D. Serve humas vezes de mostrar donde
se deriva a palavra, outras serve de
mostrar a significaçaõ.

M. Dizey exemplo.

D. Escritto escreve-se com dous TT para
mostrar que se deriva do adjectivo
346Latino Scriptus. Amasse escreve-se
com dous SS, e mostra que significa
no preterito plusquam perfeyto,
e naõ no presente Ama se.

M. E pronuncia-se alguma letra as vezes
sẽ que a tal letra se escreva na palavra?

D. Sim.

M. Dizey exemplo.

D. Idea se pronuncîa como se tivera a letra
I, e fora Ideia, mas isto só succede
nos dithongos, de que aqui naõ
tratamos, e propriamente nunca se
pronuncia letra, que naõ venha na
Oraçaõ, porque a verdade he que as
letras EA, que fazem dithongo,
muytas vezes tem o poder de EIA.

M. Tendes mais que dizer da propriedade
das letras?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Capitulo II.
Dos modos, com que se erra a Orthografia, e
como se haõ de evitar os erros.

Mestre. De quantos modos se erra a
Orthografia?347

D. De quatro.

M. Quaes saõ?

D. Por diminuiçaõ, por augmento, por
mudança, e por transposiçaõ.

M. Qual he o erro por diminuiçaõ?

D. He quando se escreve a palavra com
menos letras das que deve ter.

M. Dizey exemplo.

D. Quando escrevemos Eclise ha erro por
diminuiçaõ, porque falta na palavra
a letra P, e se deve escrever
Eclipse.

M. Qual he o erro por accrecentamento?

D. He quando se escreve a palavra com
mais letras das que deve ter.

M. Dizey exemplo.

D. Quando escrevemos Metter ha erro
por accrecentamento, porque tem
dous TT, devendo só ter hum, e
escreverse Meter.

M. Qual he o erro por mudança?

D. He quando na palavra em lugar de
huma letra pomos outra, ou quando
em lugar de letra grande pomos
letra pequena, ou quando em lugar
de letra pequena pomos letra grãde.

M. Dizey exemplos.348

D. Quando escrevemos Cazo em lugar de
Caso, mudando o S em Z, antonio
em lugar de Antonio, l Inho em lugar
de Linho.

M. E qual he o erro por transposiçaõ?

D. He quando mudamos o lugar da letra.

M. Dizey exemplo.

D. Quando em lugar de Flor escrevemos
Frol, pondo o L no fim, devendo
estar antes, e pondo o R antes do
O, devendo este estar antes do R.

M. E como se haõ de evitar esses erros?

D. Escrevendo as palavras sem mais, nem
menos letras do que lhe competem,
e no lugar, que lhe convem.

M. E como se sabe isso?
S. Sabe-se pelos livros da Orthografia
Portugueza, e tambem com o uso,
e liçaõ dos livros, attentando o como
se escrevem as palavras.

M. Dizey algumas dessas regras.

D. As regras da Orthografia Portugueza
a mayor parte depende de alguma
noticia da lingua Latina, e como
este tratadinho se faz para os que
ainda naõ sabem a lingua Latina, he
escusado repetir essas regras.349

M. Dizey algumas, para que naõ he necessaria
a noticia da lingua Latina.

D. Primeyra regra. Todo o nome proprio
se deve escrever com letra grande
no principio, assim como Antonio,
Lisboa.

Segunda regra. Todas as vezes que
acaba a Oraçaõ, e faz ponto, e começa
outra Oraçaõ, deve a Oraçaõ,
que começa, principiar por letra
grande.

Terceyra regra. A letra C quando vem
antes de A, O, U, e se pronuncia como
S, poem-selhe huma plica em
bayxo, assim como Caça, Corço, Çumo.

Quarta regra. Antes das letras B, P, M,
nunca se poem immediatamente a
letra N, mas a letra: M em seu lugar,
assim como Amparo, Emmagrecer,
Ambiçaõ.

Quinta regra. Depois da letra Q sempre
se poem a letra U, assim como
Quem, Quando.

Sexta regra. Nenhuma letra consoante
no principio da palavra se poem
dobrada.350

Setima regra. Nenhuma letra consoante
se poem dobrada se naõ entre
duas vogaes, assim como escritto,
&c. Honra escreve-se com R singelo,
porque naõ vem entre duas vogaes,
Corra com R dobrado, porque
vem entre duas vogaes, e o requere
a pronuncia.

M. Tendes mais que dizer dos erros da
Orthografia?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Capitulo III.
Da Pontuaçaõ da Orthografia Portugueza.

Mestre. Dissestes que o escrever com
acerto consistia tambem na Pontuaçaõ.
Que cousa he Pontuaçaõ?

D. Pontuaçaõ saõ huns risquinhos, ou
pontos, com que se apartaõ entre si
as palavras, e mostraõ que casta de
sentido fazem.

M. Quantas castas ha desses risquinhos,
ou pontos?

D. Sete.351

M. Quaes saõ?

D. Saõ os seguintes. Virgula, Ponto, e
virgula, dous pontos, Ponto, Ponto
admiraçaõ, Ponto interrogaçaõ,
Parenthesis.

M. Que cousa he virgula?

D. He huma figurinha desta sorte ,

M. Que cousa he ponto, e virgula?

D. He huma figura desta sorte ;

M. Que cousa saõ dous pontos?

D. He huma figura desta sorte :

M. Que cousa he ponto?

D. He huma figura desta sorte .

M. Que cousa he ponto, admiraçaõ?

D. He huma figura desta sorte !

M. Que cousa he ponto interrogaçaõ?

D. He huma figura desta sorte?

M. Que cousa he Parenthesis ?

D. He huma figura desta sorte ( )

M. Dizey as regras, que ensinaõ quando
se haõ de pòr as virgulas.

D. Primeyra regra. Todas as vezes que
na Oraçaõ vem palavras, que per
si fazem algum sentido, mas muyto
imperfeyto, se poem virgula.

M. Dizey exemplo.

D. Se hoje fizer Sol, será bom dia. Nesta
352Oraçaõ as palavras Se hoje fizer Sol,
fazem per si algum sentido, mas
muyto imperfeyto, e por isso entre
ellas, e as palavras Sera bom dia pomos
virgula.

Segunda regra. Antes dos nomes relativos
sempre se poem virgula.

M. Dizey exemplo.

D. Aos Soldados, que saõ valerozos, se lhes
daõ premios
. Onde antes do relativo
Que está virgula.

Terceyra regra. Antes das conjunçoens
copulativas, e disjunctivas sempre
se poem virgula.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro, e Paulo aqui estaõ. Onde antes
da conjunçaõ copulativa E està virgula.
Da mesma sorte Pedro, ou
Paulo chegou de França
, onde antes
da conjunçaõ disjunctiva Ou està
virgula.

Quarta regra. Todas as vezes que na
Oraçaõ vem nominativo absoluto,
depois delle se poem virgula.

M. Dizey exemplo.

D. Posto eu à menza, me deraõ as cartas. Onde
depois do nominativo absoluto
353Posto eu à menza està virgula.

Quinta regra. Quando na Oraçaõ vem
muytos nomes, ou Verbos por modo
de differença, ainda que per si
naõ façaõ sentido, se poem virgula
em cada hum.

M. Dizey exemplo.

D. Os Portuguezes venceraõ Indios, Mouros,
Turcos, Francezes, Castelhanos,
e outras naçoens
. Onde entre os nomes
Indios, Mouros, &c. se poem
virgula. Da mesma sorte nesta Oraçaõ
Os Portuguezes descobriraõ, domaraõ,
conquistaraõ as Indias
. Onde
entre os Verbos Descobriraõ, Domaraõ,
&c. se poem virgula.

M. E quando se deve pòr na Oraçaõ ponto,
e virgula?

D. Quando as palavras naõ fazem sentido
perfeyto, mas tambem naõ o fazem
de todo imperfeyto.

M. Dizey exemplo.

D. Pedro foy para Roma com grande fausto;
como se fora muyto rico
. Nesta Oraçaõ
as palavras Pedro foy para Roma,
&c. fazem bastante sentido, mas
naõ perfeyto a respeyto das palavras,
354que se seguem.

M. Quando se devem pòr dous pontos?

D. Quando a Oraçaõ he grande, e huma
parte della faz sentido quasi perfeyto.
Os exemplos se podem ver em
qualquer livro.

M. Quando se deve pòr ponto?

D. Quando a Oraçaõ faz inteyramente
sentido perfeyto sem dependencia
do que vay adiante. Os exemplos
se pòdem ver em qualquer livro a
cada passo.

M. Quando se deve por ponto, e admiraçaõ?

D. Quando dizemos alguma cousa por
módo de quem se admira.

M. Dizey exemplo.

D. Oh que grande batalha venceo Portugal!
Onde ponos ponto, e admiraçaõ
no fim, porque falamos como quem
se admira da grandeza da batalha,
ou vitoria.

M. Quando se deve pòr ponto interrogaçaõ?

D. Quando se pergunta alguma cousa.

M. Dizey exemplo.

D. Quem venceo? Onde depois das palavras
355Quem venceo ponho ponto interrogaçaõ,
porque incluem em si
pergunta.

M. Quando se deve pòr Parenthesis?

D. Quando na Oraçaõ se interpoem algumas
palavras, que interrompem
o sentido della, e logo torna a continuar.

M. Dizey exemplo.

D. Tityro, em quanto torno, (o caminho he
breve) guarda as minhas ovelhas
.
Onde as palavras O caminho he breve
estaõ postas com a figura Parenthesis,
porque interrompem o sentido
da Oraçaõ.

M. Tendes mais que dizer da Orthografia
Portugueza?

D. Mais ha que dizer, mas isto basta.

Finis, Laus Deo,

Virginique Matri.356