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Grivet, Charles Adrien Olivier. Nova Grammatica Analytica – T03

[Nova grammatica analytica da língua portugueza]

[Relatorio… sobre a grammatica portugueza de A. Grivet]

Relatorio
do Conselheiro Sr. Francisco Octaviano de Almeida Rosa
e do Commendador J. B. Calogeras
sobre a grammatica portugueza de A. Grivet.

Novembro de 1876.

Ill.mo e Ex.mo Sñr.

Cumprindo com as ordens de V. Ex.ª, temos a honra de sujeitar
á sua illustrada consideração as observações que nos suggerio o exame
da grammatica da lingua portugueza composta pelo professor Grivet.

Esta obra, pela robusteza da logica e pela vasta erudição que a
rege desde o principio até o fim, destaca-se completamente de todas
as outras de igual natureza até hoje conhecidas. Classificadas as matérias
segundo as mais vigorosas exigências da linguagem, cada parte é
tratada com magistral proficiencia. As regras, ampla e claramente
expostas, são sempre acompanhadas do valiosissimas reflexões sobre a
sua applicação, sendo estas corroboradas, a cada passo, pelo exemplo e
autoridade dos escriptores classicos de melhor nota; e assim firmadas,
tanto as regras como a sua genuina applicação, poem naturalmente
em relevo as incorrecções que o uso tem pouco a pouco introduzido
na pratica.

Nem se diga que por ter tão profundamente penetrado nos mysterios
da bella lingua de Antonio Vieira, a obra do Sñr. Grivet é inaccessivel
aos espiritos monos reflectidos; visto que, por meio de uma
analyse perfeitamente desenvolvida, tornam-se de facil comprehensão
os assumptos mais abstractos e os mais complicados.

Para formar um juizo seguro ácerca desta obra, seria preciso lêl-a
toda, não havendo nella palavra alguma superflua. Mas, sendo isto
incompatível com as muitas e importantes incumbencias a cargo de
V. Ex.ª, apresentamos alguns extractos afim de proporcionar-lhe, pelo
menos, uma idéa geral do merecimento do trabalho do Sr. Grivet.

Primeira parte.
A lexicologia.

O Verbo é o Facto. E, com effeito, esta definição na sua generalidade
singela, abrange a existência, o estado e a acção.

O autor dá cabo do verbo passivo, que não tem existência propria
na lingua portugueza, e que é apenas uma proposição, ou antes um
aggregado de palavras que tomadas separadamente, cada uma por si
não fórma sentido algum.IX

Divide os verbos em activos, de estado e de neceesidade, estes ultimos
assim chamados porque não derivam da acção de um sujeito.
Enganam-se os grammaticos que tomam o pronome il, no verbo impessoal
francez il pleut, il fait chaud, il neige, como sujeito do verbo.
Quem é este il ? Ninguém; é apenas uma forma grammatical da lingua
franceza.

Ás perfeitas definições das diversas especies de verbos, de seus
modos e tempos, accrescenta o autor observações bem cabidas sobre
os complementos, o predicado, a apposição e a ligação, chamando ao
mesmo tempo a attenção para o processo da substituição, que serve
para evitar a confusão do sentido nos verbos que tem a mesma forma,
mas em modos e tempos differentes.

Nos verbos irregulares, distingue as irregularidades apparentes das
reaes; e, nos defectivos, indica o modo de substituir as fórmas que
faltam.

Estabelece duas ordens de conjugação nos verbos pronominaes, a
normal e a anormal; e demonstra que, nos verbos combinados, além
da forma passiva, unica adoptada até agora, cumpre admittir igualmente
em separado os verbos prepositivos e os gerundiaes.

Substantivos. — A definição dos reaes e dos abstractos, dos próprios
e dos communs, dos simples, dos compostos e dos collectivos, é
feita com a maior clareza.

Merecem especial attenção as importantes considerações do Sñr.
Grivet sobre as causas da determinação do genero.

Adjectivos. — Ás diversas especies de adjectivos convenientemente
explicadas, faz o autor a devida distincção entre os simples e
os compostos, notando aquelles que parecem synonimos e que entretanto
tem valor differente na oração.

Apresenta igualmente não pequeno numero do vocabulos, que,
sendo considerados como adjectivos de uma especie, pertencem tambem
a outras, ou, segundo o sentido em que são empregados, assumem
tambem as funcções de pronomes, adverbios, interjeições e conjuncções.

Dá a razão por que alguns adjectivos que tem a forma comparativa
não passam de positivos, e indica aquelles que não tem comparativo,
nem superlativo; e finalmente os que, como os participios,
fazem algumas vezes as funcções de substantivos, assim como ha casos
em que os substantivos funccionam como adjectivos.

Pronomes. — Distingue o autor os que se referem a um antecedente
certo dos que se referem a um pensamento inteiro, ou a um
conjuncto de palavras onde nenhuma se presta a servir-lhe especialmente
de antecedente.

Mostra quaes os pronomes demonstrativos que são tambem pessoaes
ou relativos, e bem assim os casos em que os adjectivos possessivos
funccionam tambem como pronomes possessivos.

Dando ao vocabulo que a primazia sobre todos os pronomes relativos,
indica ao mesmo tempo quando deve ser substituido por quem.X

O participio. — Salvas as excepções, concorda em genero e numero
com os verbos ser e estar, e não com os verbos ter e haver. Póde
passar pelos diversos gráos de significação, como os adjectivos, quando
figura na oração como apposição ou predicado, e pode igualmente ser
substantivado.

Dá o autor a razão por que os vocabulos acabados em ante, ente
e inte
são indevidamente classificados entre os participios.

São apreciaveis as considerações que apresenta sobre a applicação
dos participios regulares ou irregulares.

Preposições. — Divide-as o autor em constantes, accidentaes, a
compostas, mostrando as suas diversas applicações.

Entra em pormenores interessantes sobre as contracções, os archaismos
e as locuções prepositivas.

Adverbio. — Nota o autor o erro de alguns autores que fazem
concordar os adverbios sem incremento com as palavras a que são
juntos. — Em certos adverbios é indifferente usar do incremento ou
da terminação adjectival.

Offerece algumas considerações sobre alguns adverbios o locuções
adverbiaes.

A conjuncção. — Salvas raras excepções, não póde ser dislocada,
nem elidida sem alteração do sentido.

Observações sobre varias conjuncções e casos em que a conjuncção
preventiva deixa-se transportar para dentro da proposição que inicia.

As interjeições. — São próprias ou impróprias. São próprias as
que não podem, e impróprias as que podem reverter para outras palavras,
e as interpellações.

Interjeições que não passam do estylo familiar.

Segunda parte.
Analyse.

A respeito da Analyse, que divide em lexicologia, syntaxica e
logica, faz o autor importantes considerações sobre a necessidade de
bem comprehender a funcção que exerce na oração a palavra, para
acertar na sua classificação, e apresenta um bello specimen de analyse
lexicologica.

Á definição e distribuição dos termos da syntaxe, segue-se a distincção
entre pensamento e idea, entre proposição e oração.

É muito interessante a discussão doutrinal do autor contra a theoria
do verbo substantivo propalada pelos grammaticos francezes; e bem
assim as largas observações que offerece sobre a concordância do verbo
impessoal Haver, assignalando os erros de alguns escriptores modernos.

Considerações sobre a collocação das palavras no discurso. — Propriedades
do estylo: clareza e euphonia. — Causas das riquezas da língua
portugueza. — São notáveis as variadissimas explicações do autor
sobre as infinitas evoluções das palavras na oração, em que se concilia
perfeitamente a clareza com a elegancia das fórmas.XI

Proposições plenas ou figuradas, — definição e emprego das figuras.
— Considerações sobre cada um dos modos do verbo, — differença
entre o infinitivo e os outros modos, — desenvolvimento sobre o emprego
do infinitivo no singular ou no plural, no pessoal ou no impessoal,
como sujeito, complemento directo ou indirecto, ou como predicado
— Erro de alguns escriptores modernos sobre a concordancia do gerundio
com o infinitivo.

Sujeitos do verbo. — Por que razão uma proposição não póde servir
de sujeito de outra, como erradamente praticam alguns escriptores
modernos. — O sujeito, pronome, é geralmente omisso, — no sujeito
infinitivo a omissão é excepcional. — Sujeitos substantivos no singular
ligados com a conjunção ou, ou com nem. — Sujeito composto de
substantivos synonimos. — Sujeito composto summariamente resumido
— Sujeito designando personalidades differentes. — Sujeito composto
de infinitivos, — de infinitivos e de substantivos. — Regras e exemplos.

Complemento directo. — Não exerce influencia sobre o verbo. —
Abusos, distincção entre os complementos de substantivos ou pronomes,
e de infinitivos. — Erros. — Pleonasmo: contribuem, ás vezes
para a clareza, e até para a elegancia das proposições. — Outras considerações
e exemplos.

O complemento indirecto. — Não é composto quando os seus
differentes termos não se podem ligar por meio de uma conjuncção. —
Um só complemento pode competir simultaneamente a mais de um
verbo, coadunando-se a cada um em separado. — Alem de assignalarem-se
sempre uma preposição, os complementos indirectos formam-se
tambem de gerundios, que são complementos quando podem ser resolvidos
por uma preposição e seu regime. — Nenhuma das preposições
a, de, em, por, pode formar contracção com a palavra que se lhe segue,
a não constituir esta o seu regime, ou uma apposição forçosamente
annexa ao seu regime. — Inconveniencia dos abusos que se notam
nos escriptores modernos. — Outras observações, regras e exemplos.

Os predicados. — São simples ou compostos. — Casos em que o
predicado e não o sujeito rege o verbo — quando o participio é predicado.
— Predicados empregados como adverbios.

Differença entre o predicado e a apposição; aquelle prende-se
somente ao sujeito, e esta, ao sujeito, complemento, predicado ou outra
apposição.

Ha varias especies de ligações; suas funcções não podem ser substituidas,
e vão sempre antepostas aos verbos a que se referem, salvas
raras excepções.

Definição e uso dos idiotismos.

Observações peculiares sobre diversas especies de palavras.

Sobre, os verbos ter e haver considerados como auxiliares, ou com
a significação de possuir ou considerar.

Dissertação importante sobre a concordancia do verbo impessoal
Haver.XII

Differença entre ser e estar, sobre os verbos pronominaes (reflexivos,
reciprocos, ambiguos). — Conveniencia de converter os verbos
de forma passiva em pronominaes. Nem sempre apparece o sujeito,
nem o objecto do verbo, como pretendem alguns grammaticos. — Latinismos.
— Abusos do pronome se na phraseologia moderna.

Regras sobre o genero e numero de alguns substantivos.

Sobre o emprego, repetição ou omissão dos artigos — suas diversas
funcções na proposição. — Deve-se repetir o artigo ante qualificativos
diversos do mesmo substantivo. — Erros frequentes.

Adjectivos. — Substituição dos numeros ordinaes pelos cardeaes
de 200 por diante; o uso estabeleceu-o tambem abaixo de 200.

Casos em que dispensam-se os possessivos. — Seu substituido por
lhe ou lhes.

Máo emprego do indefinito cujo. Considerações a que dá lugar o
indefinito todo — gallicismo.

Impropriedade do augmento do superlativo, que se nota em alguns
escriptores modernos.

Pronomes pessoaes. — Differença entre o emprego de si e de
elle.

Differença entre os demonstrativos este, aquelle, est’outro, aquell’outro,
e isto, isso, aquillo
.

Casos em que os possessivos prescindem do artigo.

Razão por que os relativos que, quem o qual são tambem indefinitos.

O quem ou quem devem sempre concordar com o sujeito do verbo
anterior. Erros de alguns modernos que, cingindo-se á forma franceza,
concordam que ou quem com a terceira pessoa do verbo.

Differença entre todo e tudo, — porque devem sempre ser seguida
do artigo o, apezar do uso contrario de alguns escriptores.

Adverbios. — Quaes as funcções de onde e quando na mesma
phrase. Não se confunda tambem com o comparativo adverbial tão bem.

Differença entre as conjuncções porque e por que, porquanto e por
quanto
.

Nem substitue o sem nas proposições em que sem é repetido.

Especimen de analyse syntaxica.

Terceira parte.
Ortographia.

As bases da ortograpliia são a etymologia e a phonicidade ou euphonia.
As discordancias arbitrarias sobre a applicação destas bases, são
as causas da falta de um padrão definitivo ácerca de milhares de palavras.
— E’ para notar que são poucas as terminações das seis especies
de palavras variaveis. — Os accentos devem-se empregar com parcimonia.
— Para discriminar o preterito do futuro é preferível accentuar
a penultima syllaba do primeiro do que a ultima do segundo, que é
já accentuada com o til. A terminação do passado em am não é
XIIIadmissível por não conformar-se com os substantivos e outros vocabulos
que terminam em ão. Esta terminação passando por um augmento
converte-se em an e não se conserva inalterada, como alguns
fazem.

Origem da cedilla.

Reflexões sobre diversas lettras. — Explicações sobre as cinco
figuras da dicção, a saber: a Synalepha, a Tmesis, a Antithese, a Prothese
e a Apocope.

Quarta parte.
Prosodia.

Reflexões sobre as syllabas longas ou breves, e especialmente sobre
a tonica.

Distincção das palavras que recebem ou não a inflexão da tonica
— casos em que se deve supprimil-a.

Difficuldade de estabelecer regras para todos os casos — suppre-nas
o uso.

Quinta parte.
Ponctuação.

Para fazer bom uso da ponctuação é necessário, alem da syntaxica,
a analyse logica, afim de bem discriminar as proposições. —
Caracteres intrinsecos das tres especies de proposições — principal —
complementar — incidente, em que se resume toda a theoria da analyse
logica, sendo isto sufficiente para assentar as regras mais importantes
da ponctuação.

Casos em que uma ligação copulativa dispensa a virgula. — Emprego
deste signal. — Erro dos que pretendem dever a locução o que
ser sempre precedida de uma virgula.

Regras sobre o emprego do ponto e virgula, os dous pontos e o
ponto final.

Explicações sobre o emprego dos pontos interrogativoexclamativo
e de reticência, — finalmente sobre a parenthesis e a risca de
separação
.

Conclusão.

Como já dissemos, não ha trecho algum nesta obra que não se
baseie na mais clara e vigorosa argumentação, corroborada por numerosas
citações dos autores clássicos de melhor nota.

Em nossa opinião, não ha grammatica alguma que melhor do que
esta possa proporcionar aos estudantes o conhecimento consciencioso
da lingua portugueza.

Parece-nos pois que a adopção da grammatica do Sñr. Grivet será
de immensa vantagem aos alumnos dos estabelecimentos publicos e
particulares de instrucção secundaria.XIV